Foz do Rio Guadiana-Outono, Novembro de 833 d.C.
— Sente-se, Juan – ordenou com voz suave apontando para as peles.
O jovem imediatamente obedeceu, enfeitiçado como estava por ela. Jamila retirou um grande manto cinza com capuz, por baixo usava um conjunto de véus coloridos sobrepostos uns aos outros, um deles, branco, cobria sua cabeça, outro, lilás, cobria metade de seu rosto, escondendo atrás de sua transparência seu nariz e lábios. Pulseiras com pequenos címbalos envolviam pulsos e pés, assim como a fina cintura.
Seus cabelos negros estavam soltos debaixo do véu, uma pintura negra realçava seus olhos verdes. Seus lábios, visíveis sob o fino tecido, estavam rubros. A pele de seu rosto possuía algumas tatuagens feitas de hena, assim como suas mãos e pés descalços. Um suave perfume de jasmim emanava de seu corpo, eclipsando o aroma da lenha que ardia.
— Há uma tradição berbere na qual uma mulher se entrega de corpo e alma por toda vida para o homem amado – explicou calmamente.
Juan encarou-a em silenciosa expectativa.
— Nessa tradição, a mulher dança retirando os véus que cobrem seu corpo, ao deixar cair o último véu, ficando nua, a dançarina fica prometida à pessoa para quem estiver dançando por toda eternidade.
Jamila começou a requebrar lentamente o corpo, seguindo uma música imaginária em sua mente.
— Se tiver dúvidas sobre seus sentimentos eu lhe peço, em nome de seu Cristo e em nome de Alá, que me impeça de retirar o último véu – murmurou com voz suave, mas firme, encarando-o fixamente com seus olhos incrivelmente verdes.
— Sou seu escravo por toda minha vida – respondeu com voz rouca.
— Não quero que seja meu escravo, apenas meu homem e que me ame como eu o amo, que me ame pelo que eu sou, com minhas virtudes e defeitos, e não pela minha condição de mulher – respondeu com um sorriso requebrando os quadris enquanto dançava sensualmente — mas a entrega tem que ser mútua, se tiver dúvidas, se for apenas um capricho seu, eu imploro por Alá que me impeça, aqui e agora – concluiu com um olhar tão expressivo que o fez estremecer.
— Que eu arda nas chamas do inferno por toda eternidade se eu estiver sendo falso, eu a amo Jamila, como nunca amei nem amarei ninguém em minha vida – respondeu com voz firme e com toda sua alma.
Jamila sorriu e começou a dançar como nunca dançara em toda sua vida, entregando-se de corpo e alma ao ato. Cada movimento era cheio de significados, seus olhos se mantinham fixos no jovem à sua frente que não desgrudava seu olhar, apreciando cada passo que ela dava.
A dança era antiga, existia antes mesmo do advento de Cristo ou Alá, possuía elementos corporais femininos, cujos movimentos revelavam sensualidade. A forma era considerada um ritual sagrado, ligada aos cultos primitivos da Deusa Mãe, quando os homens eram excluídos do cerimonial.
Antigamente era um ritual ligado à maternidade, por isso a ênfase aos movimentos pélvicos e abdominais, mas com o passar do tempo e a substituição da linha matriarcal pela patriarcal, seu significado passou a ser a entrega total da dançarina ao seu amado.
A cada véu que retirava, Juan arquejava admirado, pois seu corpo se tornava mais visível através dos tecidos finos e transparentes.
O primeiro véu, vermelho, representava a agressividade e a paixão, sentimentos fortes que deviam ser deixados de lado para entrar no reino espiritual, era ligado ao poder da energia sexual, por isso ela entrara com o véu de três metros solto, fazendo movimentos no ar com ele. Em meio a giros de seu corpo, batidas fortes de seus pés no solo, com torções de quadris e ombros e tremidos do corpo, deixou cair o véu aos pés de Juan que parecia hipnotizado.
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A GUERREIRA INDOMÁVEL
Romance"O que acontece quando uma jovem guerreira se vê entre o amor e sua convicção?" Século IX d.C., a península ibérica dominada pelos árabes se vê envolta em fortes tensões sociais. Uma embaixada enviada pelo último rei cristão à Mérida tem o objetivo...