Único.

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- Seu Afonso! Olá!


O português se virou e viu Clotilde, a irmã que mais conhecia de Dona Lola, acenando para ele do outro lado da rua. Tinha ido a Itapetininga levar provisões para os que estavam no front, naquela guerra que parecia não ter fim assim como o desassossego de todos ao redor. Sorriu e acenou para ela, que atravessou sorridente para cumprimentá-lo mais de perto.


O sofrimento dos últimos meses tinha abatido a moça e ele percebia o quanto ela se parecia com a irmã mais velha naquele momento. Mas quando sorria, os ares de menina retornavam. Será que com dona Lola aconteceria o mesmo? A mulher não tinha uma alegria verdadeira há muito tempo.


- É sempre um prazer vê-la, Clotilde.


- Digo o mesmo, seu Afonso. Está com pressa? Mamãe vai gostar muito de ver o senhor.


- Também me alegraria muito cumprimentar a dona Maria, mas-


- E Lola também está lá em casa. Mas isso o senhor certamente já sabe, não é? – Clotilde esboçou um sorriso cúmplice que deixou Afonso ainda mais ruborizado que o normal. Se tinha uma coisa que tirava ele do sério era a simples menção daquele nome: Lola.


- Sim, sei, m-m-mas talvez seja exatamente o problema, C-Clotilde...


- Problema? Desde quando ver minha irmã é um problema para o senhor? Não eram até sócios?


Estavam perto de um banco e ela fez sinal com a cabeça para que ele sentasse. Precisava ouvir o que ele tinha a falar, pois já sabia um pouco da história pelo que Lola havia contado.


- A d-dona Lola... Eu não sei o que aconteceu. Está distante, quase não falou comigo antes de vir. E eu a a- Ele cortou, olhando alarmado para a moça ao seu lado. – eu a ad-admiro muito, tanto como vizinha como sócia e como amiga. Me corta o coração não saber o que aconteceu.


- Não discutiram por nada?


- Claro que não, pelo nome de Jesus Cristo! Jamais sequer levantaria o tom para dona Lola!


- Faltou ao respeito com ela de alguma forma?


- Pois muito menos! – O sotaque de Afonso aparecia bem carregado quando ele ficava nervoso, era até divertido. – Nunca fiz nada além do que ela me permitisse!


- Então ela já permitiu alguma coisa, hã? – Clotilde sorriu largo, encarando com seus enormes olhos o homem que quase sofria um ataque cardíaco pelas insinuações. Confiava nele e sempre percebeu os olhares e cuidados dele para com a irmã, e sentiu que precisava atalhar a solução do problema. Só de ver a aflição no rosto do português, os olhos marejados, sabia que a versão contada por Lola sobre os fatos não era a verdade. - Bom, seu Afonso, se o senhor quiser pode jantar conosco e é bom que conversa com minha irmã. Ela vai gostar de vê-lo, está tão sentida com Alfredo na guerra... Mas me diga, tudo bem com a Inês? Teve notícias de Shirley?

Uma noite e para sempreWhere stories live. Discover now