Jordana
A Pousada da Serra ficava num elevado –exatamente no ponto mais alto da Rua Undici – tinha uma das vistas mais bonitas de Nuovo Campo.
Era o meu novo endereço.
– Daqui é possível ver toda a cidade – disse a anfitriã, de sotaque italiano forte. – Não é lindo?
De fato, a visão era espetacular.
Não havia muro que circundasse o terreno, o que dava àquele lugar ares europeus. Dois pavimentos, enchidos de quartos, banheiros, salas, cozinhas, subiam do baldrame oculto por um jardinzinho de flores, subiam pelas paredes em enxaimel, de tijolos aparentes extremamente firmes e marrons. O cedro avermelhado desenhava as esquadrias que, timidamente, coadjuvavam o imponente conjunto de águas do telhado germânico avermelhado contadas em uma dúzia já com as mansardas singulares e proporcionais – uma réplica de edificação alemã sem falhar em nenhum detalhe.
O primeiro impacto foi de estranhamento: a cidade era praticamente uma réplica de uma città italiana e aquela edificação se destacava pela arquitetura alemã. Mas fiquei calada.
Os pilotis dispostos em ordem extremosa davam ao alpendre um conforto de passagem. O tubo da chaminé começava na parede do térreo, externamente, rompia o telhado e subia bem, elevando-se alinhadamente até topar com a linha imaginária de igual altura que a cumeeira.
– Há sempre um aparelho de ar-condicionado para estragar qualquer fachada – brincou a dona da pousada. – Aqui nunca faz calor, mas você sabe... cliente exige tudo, até o que não precisa.
– Entendo – respondi, com um sorriso amarelo.
A relva se aquecia, e já não era amanhecer.
Havia geado na noite passada e a piscina estava suja, cheia de gelo derretendo.
O vento frio era de cortar a alma.
– Conheça a Bia – disse a anfitriã, excitada, apontado para uma cadelinha. – Esta é minha cadela. É uma beagle. Sempre espera pelos hóspedes no jardim, ao lado dos morangueiros.
Bia era linda, de raça pura, adorável. De pé, nas quatro patas retesas, torcia-se para aquentar-se no colo da senhora. Fui informada que o animalzinho já andava pelos nove anos de idade. De olhos profundos, ligeiros, preguiçosos, temperamentais, era a atração do lugar.
Me abaixei para brincar com ela. Aquelas orelhas macias, castanhas, eu gostava de olhar, bem como o traço delineado que começava no meio da cabeça, correndo, fininho, pelo meio da face e espalhando-se pelo focinho a dois dedos do nariz, fechando num semicírculo que findava sob o lábio inferior. Abaixo da nuca, entre a cabeça marrom e a garupa preta com alguns fragmentos brancos e dourados, estendia uma listra branca que, na altura do lombo, cabia minha mão espalmada, mas descia-lhe pelo braço, cobria-lhe todo o ventre, virilhas, até os jarretes pela parte dos pés; as coxas eram marrons, a cauda até a metade acastanhada e a ponta branquinha como a neve.
Adentramos o local. Uma sala espaçosa recebia a todos: móveis antigos e lustrados, belos tapetes espalhados com decência. Alguns hóspedes – na maioria, idosos – liam o jornal naquela hora.
Não fosse pela mesa da secretária – uma moça de cabelo muito loiro, de sorriso simpático e infantil, que atendia o telefone, marcava as reservas, anotava os pedidos dos hóspedes, eu podia pensar estar entrando numa casa de família comum, e não em uma pousada.
Subimos uma escadaria bonita, revestida de madeira e coberta com carpete.
Tudo muito limpo e organizado.
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Herdeiro da Máfia
RomanceJordana, quando criança, passou por uma tragédia familiar que lhe deixaria marcas profundas. Agora, adulta, termina o seu noivado e deixa toda sua vida para trás em busca de justiça. Numa pequena cidade, sob o disfarce de professora, ela sustenta o...