"Em tortuosos montes, existe uma cidade pacata da qual nada se sabe, nem mesmo seu nome. Seus arbustos sobem seus montes como enxames de abelhas atacando sua vítima em uma manhã comum que mal se sabe que dia da semana se sucede.
Nosso herói busca seu cavalo em um dos montes que não tem muitas árvores, enquanto aguarda seu presságio de que uma guerra se alastrará pelos seus montes calmos e silenciosos. Se passa vários anos sem que nada de novo aconteça. Se forma no céu nuvens carregadas e negras levando a crer que seus dias de calmaria terão fim.
Um homem se aproxima em seu cavalo:
-Alto lá homem! - grita com sua voz de cansaço - Venho trazer-lhe uma mensagem!
-Do que se trata essa mensagem? - nosso herói pergunta com rispidez.
-Há um exército se aproximando, em cerca de dois dias chegarão com suas tropas para invadir essa cidade!
-Já avisou os demais?
-Sim, mas temo de que não teremos forças o bastante para contê-los.
-Veremos então!
Nosso herói parte em seu cavalo com uma fúria incessante de que conseguirá conter todo o..."
-Ah, já chega disso! Não poderia ser mais clichê. - Alan se revira em sua cama. - Acho que tenho que me limitar aos meus quadros mesmo.
Ele se levanta e procura algo para se sentar, largando os cadernos na cama.
-Já faz dias que tento escrever algo sobre períodos medievais e não consigo. O que será que tá faltando?
Chovia enquanto Alan olhava pela janela, seus olhos pareciam distantes e vazios, não poderia saber no quê ele estava pensando. Ou poderia?
Há dois meses Alan estava pintando em um galpão o qual seu primo o arranjara. Até conseguia dinheiro com suas pinturas, o bastante para pagar metade de suas contas, o resto ele arrumava descarregando caminhões para supermercados e lojas. Não tinha muito, mas o que tinha era o bastante para morar sozinho em um bairro distante do centro da cidade. Não tinha esposa ou qualquer pessoa que poderia chamar de namorada... seus romances por celular sempre acabavam em menos de um mês e ele se punha a ficar deprimido, ou a beber em lugares de quinta categoria enquanto busca por um novo "amor".
Tudo isso seria menos deprimente se ele tivesse autocontrole, mas a realidade tende a ser decepcionante. Alan era muito cético com as pessoas, isso afastava todo mundo e trazia desconforto para quem conversasse com ele por mais de dez minutos. Ele sempre varava suas redes sociais procurando por algo que nem ele sabia o que era, mas tudo isso poderia mudar, ou não.
Nessa manhã, ele desiste de escrever, procura na cozinha algo para beber, e é claro, só encontra água.
-É melhor que nada. - pensa com ele mesmo.
"Os conflitos se sucedem quando vários cidadãos protestam contra os sistema cinzento em que convivem, depois de vazar informações de que..."
Alan desliga a TV, não suporta mais os noticiários de quem alguém chamado Alberto gerou um tipo de revolução em sua região. Se põe para fora de casa no instante seguinte. As pessoas parecem só falar sobre isso, sem muitas opções, ele segue até o ponto para pegar o ônibus até seu galpão, que fica há uns dois quilômetros de onde ele reside.
Ao chegar lá, lembra de seu quadro que será entregue à uma moça de descendência rica pela tarde. Desiste de pintar e se coloca a esperar pela tal jovem. Enquanto isso, inutilmente procura por alguém em suas redes sociais, seus chats de mensagem continuam vazios. Nisso ele respira fundo e desiste da ideia.
Um carro preto chega em frente a porta do galpão, ele ouve e vai atender. Ao sair, ele mal consegue disfarçar o quanto ficou impressionado com a beleza da jovem, seus olhos parecem brilhar com um brilho intenso. Os cabelos negros da jovem contrastam com seu tom de pele claro, seus olhos tem um certa gravidade em torno deles, às quais confundem os sentimentos dos homens.
-Veio buscar seu quadro não é? - ele pergunta mal conseguindo falar normalmente.
-Sim, sim. Eu gostei bastante do seus estilo em retratar acontecimentos atuais de uma forma tão clássica e profunda em seus quadros.
-Não sabia que via de uma forma tão submersa assim. - ele exprime uma certa alegria ao dizer.
-Claro! Eu tenho um certo gosto para coisas desse tipo. - ela responde.
-Fico feliz em ouvir isso, venha comprar comigo de novo!
-Nem precisa falar duas vezes.
Ele olha o carro curvar e sumir pelas avenidas, e com a realidade dele revirada, espera ver a jovem novamente.
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Mar de Tinta
Short StoryUm pintor descobre que em meio a sua rotina inalterável, existe algo que pode ser a própria salvação para o sentido de sua vida. É valido lembrar que o nome do personagem principal é uma breve referência a Cândido Portinari, pintor brasileiro, sem n...