CAPÍTULO 2 - SOBRE O QUE TODOS ACHAM.

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Eu não tinha nem ideia do que usaria na festa.

Depois de enviar meus dados e me cadastrar no evento, recebi uma mensagem de texto com um código, o local e o horário da festa. Foi a primeira vez que fiquei receoso sobre aquilo e, se alguém tivesse tentado, até seria possível me convencer de fazer o contrário. Mas não havia mais ninguém no quarto, ninguém que pudesse me provar que não estava fazendo a coisa certa, então continuei com o plano.

É claro, eu não tinha nem ideia do que podia acontecer. Por ser gay (e nerd), eu não podia esperar que fossem me juntar logo com alguém que era a minha cara. A graça do Mala Suerte estava, justamente, no sorteio. Eu podia muito bem cair com a patricinha mais famosa do colégio, o homofóbico jogador de basquete, ou alguém tão excluído como eu. Havia todas essas tribos. E eu só estava curioso para saber o que podia acontecer.

Minha cabeça não estava nem pensando em sexo ou em namorar. Tudo estava focado na próxima etapa (a festa) e como eu me comportaria quando o sorteio estivesse pronto. Eu podia contar para Cora e Amelia, podia contar aos meus pais, podia falar que tinha me inscrito naquela coisa (e até mesmo uma curtida na página se encarregaria de dar a mensagem), mas decidi que talvez não precisasse fazer isso. Quero dizer, eu amava minhas amigas, mas elas não precisavam me seguir em tudo ou ficar sabendo de cada coisa da minha vida. Aquele podia ser um segredo.

Depois de ter confirmado o envio dos meus dados, me voltei para meu guarda-roupa e tentei achar alguma coisa que dissesse "me inscrevi por curiosidade". Não havia nada. Como uma leve tendência ao design, eu tinha uma sensibilidade maior para escolher roupas – então sabia que nada ali combinava com minha situação. Talvez algo mais cortês, meio social, mas nada que parecesse de um jantar de gala. Talvez algo mais de baixo orçamento, meio estilo de rua, mas que não parecesse que tinha me vestido no escuro. Franzi o cenho, olhando o monte de roupas em cima da minha cama. Se eu queria fazer aquilo direito, precisava ir às compras antes da festa.

O único problema é que eu não tinha muito dinheiro, mas, supus, esse era o menor dos meus problemas. Provavelmente, meus pais também pensavam que eu precisava sair um pouco mais de casa, então a desculpa "preciso de roupas para uma festa" não seria muito ruim. Foquei que resolveria isso assim que acordasse, no dia seguinte.

Por hora, que ocupei a rearrumar meu guarda-roupa (porque arranquei tudo lá de dentro com muita rapidez, bagunçando tudo) e voltei ao meu computador. Cora e Amelia estavam online no nosso programa de conversa. Consegui distinguir os pontos verdes ao lado de seus avatares e tentei não mandar nenhuma mensagem. Nossa tradição (que soa meio brega) era realizar algumas reuniões por chamadas de vídeo, para discutir assuntos sobre, em sua maioria, o Clube. Aquele era um dos dias que precisávamos fazer isso, mas evitei ser o primeiro a mandar uma mensagem.

— Oi. — Cora enviou.

Estava tudo muito silencioso fora do meu quarto, então coloquei uma música para animar um pouco. Deixei num volume baixo e liguei a webcam.

— Oi. — Respondi, no exato momento em que Amelia entrava na sala de conversa. Segundos depois, um grande círculo verde na tela apareceu para indicar que Cora estava solicitando uma chamada de vídeo. Aceitei.

Das duas telas que apareceram na minha frente, a de Amelia era bem mais convidativa. Ela era a única de nós três que parecia levar aquela coisa de reunião à sério. Seus cenários eram sempre bem iluminados e limpos, quase como se ela se preparasse horas antes para aquilo. Com Cora o assunto era totalmente ao contrário: a imagem dela estava escura, e não precisei olhar muito para ver que ela estava usando um pijama. O pouco de luz que iluminava seu rosto vinha da tela de seu notebook.

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