Vivendo ou Sobrevivendo?

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Eu caminhava pela praia após tudo ter acontecido. Anoitecia e o céu estava incrivelmente belo como se me fosse um consolo.
Meu irmão afirmava que a única maneira de acabar com a dor é acabando com tudo, sempre lhe dizia que ele nunca estaria sozinho, pois sempre ficaria ao seu lado e então Nathan sempre me falava "espero que esteja falando sério, quero poder entrar no inferno de mãos dadas com você, Shirley".
Acho que perder um irmão é uma das coisas mais dolorosas do mundo. E foi isso que aquele maldito me fez passar, já não bastava minha vida totalmente ferrada por perder minha melhor amiga num acidente de carro, vó e pai além de minha mãe não me aceitar e ele resolve se jogar de uma ponte que fica justamente na minha praia preferida.
Às vezes penso se realmente vale a pena continuar existindo, Nathan me fez pensar que nem sempre viver uma vida sem graça alguma no automático vá fazer alguém no mundo feliz ou no mínimo não tão triste.
Naquele dia, aquela desgraça de dia, ele me falava o quão ferrada era sua vida, eu tentava lhe dizer que tudo ia passar e iria ficar bem, mas no fundo sabíamos que não. Do mesmo jeito que ele já estava acostumado ao meu discurso sobre superação de fases ruins e fingia acreditar pra me fazer bem.
Se tinha alguém no mundo que me amava incondicionalmente era ele. Seu jeito de me proteger e cuidar era confortante num nível inexplicável. E eu tentava, juro que tentava, mas todos sabíamos que sua alma já estava cansada desse mundo, porém nunca havia me passado pela cabeça que ele deixaria de habitá-lo tão cedo.
Enquanto estávamos correndo pela praia e tudo parecia ter se encaixado no termo "feliz" eu, ingênua, achava que isso se perpetuaria. Quando paramos ele me disse que estava cansado, e é claro que não era apenas fisicamente, pude entender o quanto se passava por trás de seu "estou cansado". Acho que nesse momento nós dois pensamos em qual é a graça de continuar tudo? e concluímos que nenhuma. "O que eu mais queria era passar meu último melhor momento com você, e você me proporcionou isso, acredito que saiba tudo que se passa comigo, desde perdas, fracassos, decepções e vícios e você, mais do que ninguém sabe o quanto eu estou cansado de insistir em sobreviver a uma vidinha de merda e te agradeço, do fundo do meu coração por nunca ter me deixado e sempre me apoiar, espero que você tenha a vida que eu não tive e que possa ser feliz por todos que não foram e que acima de tudo ache seu motivo incrível de viver, nunca se esqueça que eu te amo e que te esperarei pacientemente no inferno, Shirley, mas entenda, eu estou exausto". Essas foram as últimas coisas que meu irmão disse após me dar um abraço e caminhar em direção a beira da ponte que dava ao mar e se jogar. Eu não tentei contê-lo, sabia que ele voltaria caso o fizesse, mas não teria sequer um fio de vontade de continuar sua vida, então deixei, enquanto a frase "amar é deixar ir" que vi em qualquer canto do Twitter rondava meus pensamentos.
E então ele pulou.
De forma tão graciosa, como se isso fosse sua salvação, e aparentemente era.
Ver ele indo embora de forma tão leve, caindo na água onde nadamos tantas vezes quando crianças e desaparecendo, sabendo que nunca mais o veria me causou uma sensação, não de perda nem falta, mas sim de vontade de seguir e continuar com ele, afinal, o que eu iria ganhar sozinha nesse mundo?
Parada, bem na beirada da ponte, a um passo do abismo e observando o mar eu pensava "conheci tantas pessoas nessa vida, vim ao mundo sozinha e descobri coisas e aprendi tanto, pra no final morrer sem ter uma pessoa me acompanhando ou um pingo de conhecimento me sendo útil". Eu queria pular e descobrir logo de uma vez se haveria alguma continuação pra isso tudo e logo realizei meu súbito desejo, me jogar de lá foi uma das melhores coisas que já fiz mesmo sabendo que nunca mais poderia voltar.
Acompanharei meu irmão independente de onde esteja, mas só espero que ele pelo menos tenha a decência de não ter ido parar na nona camada do inferno.

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⏰ Última atualização: Apr 09, 2020 ⏰

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