Here

319 30 27
                                    

Solto um grunhido, olhando para o chão.

- Droga. - falo.

Olho de volta pra ele, erguendo a cabeça.

- É agora.

Silêncio sepulcral...

- Agora o que?

Gemo de dor, me encostando na bancada.

- Ai merda! - ele olha para o chão também e se desespera.

- Pega a bolsa que está no quarto, vamos fazer tudo com muita calma. - digo, indo até o quarto para trocar de roupa.

Mas quem disse que ele me ouve?

Tudo que John faz é correr de um lado pro outro, atrapalhado com toda e qualquer coisa que vê em sua frente. Pegou a bolsa, mais a mala da maternidade, mais um monte de doces que jogou em uma sacola, ficou me cerceando como um gavião enquanto eu trocava de roupas e me irritou demais ao querer que eu fosse em uma cadeira de rodas que sei lá de onde ele arrumou.

- Só vamos com calma. - digo, trincando os dentes. - Tá tudo certo, temos tempo.

- E se nascer no carro? - continua ele de forma desesperada. - Eu nunca fiz ou vi um parto na minha vida.

Rolo os olhos e decido deixá-lo pirar.

Disco o número de Polly, mesmo sendo apenas o meio da tarde.

- Sim? - diz ela de forma rude.

- Vai nascer.

Eu a ouço prender o ar.

- Onde?

Respondo com o endereço e desligo, recostando no banco e fechando os olhos.

Uma contração chata aqui e ali fez a viagem se tornar emocionante - para ele - , e bastante infindável também. Quando finalmente chegamos, sou colocada em uma droga de cadeira de rodas e rebocada para o andar da maternidade com ele borboletando ao meu redor. Na ala particular, cada mãe tem seu mini apartamento, digamos assim, onde pode ficar até uma semana depois do parto caso necessário. 

Havia banheiro, sofá, TV e um quarto.

- A dilatação vai demorar muito ainda mãe, que tal se formos caminhar um pouco para estimular, hein? - a obstetra sugere, saindo do meio das minhas pernas com a melhor cara do mundo.

- Tudo bem. - concordo.

- Quer que eu vá com você? - John espia por cima do jornal, quase de pé.

- Papai, agora nós vamos ter muitas conversas femininas, talvez na próxima volta, sim? - diz a médica.

Ri anasalada vendo sua careta de descontentamento.

- Ele é super protetor. - afirma ela, agora já no corredor.

- E não é o pai. - falo, umedecendo os lábios.

Ela solta um sonzinho de compreensão envergonhada.

- Tá tudo bem, nós somos amigos.

Tento amenizar a situação.

- Você tem sorte, nem sempre temos pessoas dispostas a nos apoiar nessas horas. - fala. - O pai do meu filho sumiu da face da Terra e nunca nem quis conhecê-lo, mas foi melhor assim.

- Você acha?

Olho-a, vendo que parece ser uma pessoa muito mais profunda do que aparenta.

- Com certeza, e eu fiz muito bem meu papel sozinha, ele é um garotão agora. - ela pisca pra mim.

Tenho mais uma contração, rolando os olhos de dor.

- Tá quase mamãe, tá quase. - incentiva.

Ouço um outro gemido de dor muito próximo de mim e resolvo bisbilhotar.

Meu queixo caiu ao ver Grace ali, indo em minha direção e fazendo exatamente a mesma coisa que eu. Sofrer.

- Grace?

Ela me encara, surpresa.

- Liesel?

O barrigão dela se diverge com o meu em um abraço extremamente grávido.

- Quem veio com você? - pergunto.

- O Tommy. - Grace coloca as mãos na boca e dá uma risadinha abafada. - É incrível como a gente sempre dá um jeito de se encontrar.

Imito-a, concordando.

Caminhamos juntas até o elevador, prontas para voltar aos quartos, conversando e contanto tudo que aconteceu no último ano.

- Ele sente muito a sua falta.

Eu sabia muito bem de quem ela falava, e sabia por que, por incrível que pareça, eu também sentia um pouco a falta dele.

- Imagino... - minha voz é baixa e pensativa. - Como ele está?

Grace suspira, tocando a barriga.

- Eu não o vejo muito, mas Tommy fala que está quase louco. Ele bebe e te procura por todos os lugares, vê crianças na rua e se fecha, não consegue mais aguentar Sierra e tem ficado cada vez mais distante de tudo e todos ultimamente.

Sierra.

- E Sierra?

Ela torce o nariz em nojo.

- Ela se acha o gás da coca. - Grace tem um tom de deboche na voz. - Tão gostosa e tão incrível, vejam como ela é demais.

Rimos.

- Mas pra falar sério agora, nós tivemos que nos afastar deles.

- Por quê?

- A Interpol está xeretando por todos os cantos desde que você fugiu. - ela me olha. - Tommy acha que é só questão de tempo até descobrirem algo, por isso virou político.

Faço uma careta, realmente ele tem cara de político.

- Imune às investigações? - sugiro.

Grace concorda, massageando as têmporas.

A porta do elevador se abre e uma contração forte me percorre. Eu seguro o apoio no elevador e fecho os olhos, tocando a barriga em uma tentativa falha de aliviar aquilo.

- Liesel.

A voz mais familiar do mundo chama pelo meu nome. Eu me viro de forma doloridamente lenta, encarando aquele rosto tão conhecido e não sei como agir. 

Ali parada e praticamente dando a luz, me pergunto se é tudo pode ser tão coincidência assim ao meu redor.

All For Her ✔️Onde histórias criam vida. Descubra agora