Não me interessava mergulhar nos tecidos de Junhui para enfim achá-lo suas hemácias, e não me interessam palavras que a epistemologia revelam serem de origem helênica; ficarei calado, pois, e podeis ler aqui, em silêncio morfético, meus pensamentos (estão tão distante deles. Da Grécia, de Roma, de Portugal, dos mouros, dos africanos, dos guaranis). A verdade, enrolada como uma bola de lã, custa-me desenrolar com afã: o meu dito amado não era doente.
Era anêmico, isto sim, como uma condição de paixão esmaecida, sumida. Tão pálido quanto aquele morto por ócio. Não escorria sangue do organismo dele. Não escorria de si mesmo, não havia mais Ele, apenas este caixão móvel pulsando por meu olhar. Não tinha o que olhar! Apenas essa mancha pelo ar de côdea opaca e semelhante a uma pilhéria mal-contada.
Chamais-me de iníquo, de perverso e egotista. Sim, sou.
Chamais-lhe de desesperado, de insosso e irritantemente parcimonioso. Sim, é.
Capture o seguinte instante que agora me acomete: Junhui me abraça, e tudo que por mim se refere contraí-se em um vergonhoso desdém. Ele chora, chora, chora, chora, dizendo que o que tínhamos perdemos. De fato perdemos. Conquanto, me abraça e derrete em salgado e quero fugir e quero nem dar-lhe adeus, pois não acredito que Deus poderia salvá-lo de sofrimento algum pois merece, pois enojo-me de sua face, de seus braços, e tudo, e tudo, enjoa-me, fico tonto, quero que me solte. Solta-me. Ele me solta. E não o tenho no campo de visão, temo encorajá-lo a aparecer para mim com sua face infantilizada coberta por esperança.
O quadro de Nossa Senhora logo em frente me encara. Tão benevolente é seu olhar que me faz pensar que odeia Junhui e suas mãos tão tenras prometem circundar seu pescoço com a força de uma santa sobre-humana, e confio em tal juramento - afinal de contas, suas pupilas me aconchegam nessa cena. Amoroso é seu conforto e deleito-me em sua violenta égide, como se mãe minha fosse. Mãe minha alguma na vida faria tão bem para mim quanto Nossa Senhora de mãos juntas numa reza à minha paz, muito menos a minha mãe maior: a humanidade.
Uma vez que compartilho com Junhui esta irmão meu é e, como Caim, Minha Senhora me inspira a ser. Abel meu, amo-te naquela cena em qual estávamos a passear por'aí e encontrei-te a observar o porto, a correria urbana, sua expressão caridosa ao extremo parecia confortar qualquer um que passasse por seu semblante angelical. Esta mesma repugna-me neste exato momento em que dirige-se a mim esperando, esperando meu abraço ou meu beijo, meu grito ou meu desnorteio.
Se algo a ti, Junhui-meu, acontecer, Nossa Senhora abençoou-o. Não te preocupe, se minha bênção não bastar-lhe, da Mulher a tem, Maria de Todas. Fissuro a consciência completa em sua cores de ouro e de céu que te obrigo a também olhar-lhe a figura.
Acredito que tamanha a sua esplendescência perante à sua salvadora, dos fundos do âmago de Junhui saltou-lhe um suspiro. O suspiro encheu-lhe o pulmão tão abruptamente que suspeito ser do tamanho dos pecados de todo o ser-humano já na Terra pisante.
Então entendo. Nossa Senhora é sim minha mãe. Entende-me tão bem que lágrimas enfim chegam aos meus olhos correndo e quem chora não é mais Junhui (este não tem ar para abastecer de oxigênio a água). Algo em seu rosto tão singelo o paralisa e o faz engasgar numa velocidade extraordinária que me excita, e deixa as lágrimas chamadas minhas alagarem aos poucos nosso apartamento pequeno. Eu, Junhui e Nossa Senhora. O quadro cai. Junhui junto.
Aos poucos molha-me o joelho e as mãos de Nossa Senhora são as minhas! É engraçado esta sensação: tenho certeza de que fiz o certo, confiei a ela o meu corpo e agora a mim assiste do chão, brilhando como um diamante diante de meu pranto aliviado. Uma tensão alivia-se, enfim, no que unto as palmas num símbolo de reza e meus joelhos beijam o chão e ao ver o corpo de Junhui esvaecido de qualquer sentimento contemplo um fulgor rico que não encontro outra saída além de exclamar-lhe em alto bom som: "Eu te amo, Junhui".
VOCÊ ESTÁ LENDO
INTIMAÇÃO CONTRA A AÇÃO CRIMINOSA DA INTIMIDADE
FanfictionNão havia um contrato assegurando que Junhui fosse aquilo que eu necessitava com tamanha urgência. Se houvesse, aposto uns vinténs: ele teria assinado e assassinado o compasso natural do amor.