You know that i can't.

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Os muros que ergui ao meu redor são altos como um castelo e protegem-me do mundo lá fora, apesar de a maldade não habitar apenas o exterior desta casca a qual me escondo dentro, pensando que desse jeito protejo-me. Desejo tanto proteção, que protejo a todos de mim. Eu sou o perigo.

A vida é uma bagunça e, por mais organizado que as sociedades pareçam estar, há sempre o caos habitando o peito de alguém, um caos sorrateiro que consome o peito como doença, jogando-se num lago congelado. A água em pouco volume te afoga do mesmo jeito, respirando a semi petrificação, seu coração está semi acordado, vivendo uma semi vida onde você deseja poder atingir a plenitude de ser completo, de saber quem é e por qual razão tudo o que faz parece errado, quer dizer, por que continua insistindo em fazer algo, se cada tentativa é um erro? Já pensou que algumas pessoas erram não por opção, mas porque não conseguem ser diferentes?

Temo o mundo ao meu redor, pois tudo o que toco ocasionalmente se parte em mil pedaços ou desfaz-se em minha mão, é o pó e vira nada, o que é o nada senão parte de mim?

É disso que tenho medo, de não passar de um nada bem construído que tenta findar um questionamento infindo, correr uma maratona atrás de uma resposta que não foi feita para vir, não para mim. Você, querido “eu”, nasceu para a insuficiência e para não passar de uma besta escondida por trás de bons modos, é uma vontade incrível de fazer bem aos outros, pois nunca te fizeram bem, és o rejeitado que tenta salvar os pobres corações partidos, pois um dia partiram o seu. Mas do que adianta salvar os outros, se você não se salvar?

Porém não conheço esse caminho, meu conhecimento acerca da trilha que leva-me ao autoconhecimento é tão limitado que tenho medo. A verdade é que meu corpo grita em desespero para que eu ache a saída para essa prisão, minha mente é uma tortura e eu estou quebrantado. Constantemente desejando ser suficiente, tento com um desespero inacreditável ser o encaixe de alguém, mas no fim das costas, todo alguém tem o seu alguém e eu não passo de pano de fundo.

Numa provável peça, eu sou quem puxa as cortinas, ninguém me vê nem sabe meu nome, eu faço parte da peça, mas que importância tenho?

Justamente por causa desses complexos e a insuficiência do ser, foi que me escondi. A torre mais alta não abriga a Fiona ou a Rapunzel, e sim um homem cujas mãos grandes e de dedos esguios não conseguem segurar nenhuma parte do mundo, sendo assim, nada lhe pertence. Nada além das flores.

Há um jardim na frente da casa, o qual eu rego e retiro as ervas daninhas toda manhã quando o sol está preguiçosamente esgueirando-se por entre as nuvens, quando ninguém pode ver-me e questionar por que sumi.

A quem estou tentando enganar? Ninguém perguntaria porque eu sumi, pois minha ausência é a dádiva dos céus e a infinita sensação de liberdade, a ausência da feiúra da inibição. Quem seria desinibido próximo de alguém que age como se tivesse medo de encarar seu próprio reflexo no espelho?

Eu sou o Leão covarde da Dorothy, minha configuração cerebral é vazia dos sentimentos de confiança, cada vez que tento ser eu, lembro-me que o eu é insuficiente e desejo ser qualquer um — qualquer um, mesmo —, que não eu. O despedaçado homem que tenta florescer por entre as flores, que tenta regar sua própria vida regando as coloridas flores. Ah, flores.

Elas crescem com a beleza que o universo lhes dá e isso preenche-me de alegria, ver que minha mão é capaz de criar algo tão belo quanto o colorido que na terra espalha-se, é impressionante, apesar de que quando viro minhas costas e volto para a torre de observação, quando olho pelo observatório e consigo ver os transeuntes perambulando por entre a cidade de papel, crianças que roubam frutas na feira, garotos cortejando moças e todo o cheiro saudável de felicidade, sinto falta da leveza.

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⏰ Última atualização: Apr 24, 2020 ⏰

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