Se naquele dia Priscila tivesse faltado a aula, as coisas poderiam ser diferentes.
Três minutos, três malditos minutos que, naquela aula de geografia pareciam três horas. Priscila olhava para o relógio imaginando que como num passe de mágica ele pudesse simplesmente pular três malditos números para que aquela aula acabasse.
Mas não, a mágica não aconteceu.
Dois minutos, o professor falava algo sobre latitude e longitude, ela nunca entendera essa matéria mas não estava nem um pouco interessada em aprender.
10, 11, 12 os segundos passavam tão devagar que ela já estava ficando de cabeça cheia, ela desistiu de olhar para o relógio.
Sua mesa estava toda rabiscada, ela odiava fazer conta no caderno, números por todo lado.
30, 31, 32 seu tédio crescia a cada segundo, era impressionante como aquele dia havia acabado com as energias dela.
Um minuto, seria um milagre? Não, milagres não acontecem, não na mente dela.
Ela começou a juntar as coisas assim como alguns poucos alunos, ela olhou para o lado e viu seu amigo, João, totalmente concentrado, era engraçado vê-lo assim, ele nunca gostou muito de estudar, mas agora não perdia uma aula, a quase reprovação havia lhe feito bem.
O bendito sinal.
Ela dá um suspiro totalmente aliviado, aquele dia chegara ao fim, bom, pelo menos parte dele. Ela sabia que quando chegasse em casa teria que lidar com mil e uma tarefas as quais ela deixou para última hora.
João olha para ela e a vê com uma cara de derrota, ele sabia que a velha amiga não perdera o velho hábito de deixar as tarefas para a última hora, e que isso sempre a deixava assim. Ele olha para ela, seus cabelos castanhos enrolados estavam totalmente bagunçados, ela tinha uma expressão de cansaço, suas olheiras estavam enormes e sua roupa estava amassada.
Ela estava linda como sempre, pensou João, é, ele gostava dela, mas não tinha coragem de admitir, até hoje.
Ambos sempre iam juntos para casa depois da escola, mesmo ele morando do outro lado da cidade, ele insistia em acompanhá-la até o centro, e hoje ele demorou um pouco mais para arrumar as coisas na sala.
- Anda João, você quer ficar preso aqui na escola?? - Priscila estava ficando impaciente.
Aquela era a hora certa, o pensamento passou pela cabeça do moreno, ele sorri, a cacheada tinha os olhos semi serrados e a bochecha vermelha de raiva, o moreno deu um longo suspiro e com um movimento rápido, pôs a mão na nuca dela e depositou seus lábios quentes nos dela, em um breve e casto beijo.
A garota entrou em estado de choque, nunca imaginou que ele faria isso, ele, seu melhor amigo, aquele que ela considerava quase um irmão havia acabado de lhe dar um beijo, ou melhor, lhe roubar um, e para ser mais exata aquele era seu primeiro beijo. Como ele ousava? Aqueles pensamentos não saiam da cabeça da pequena garota cacheada.
Eles se separaram e ele sorriu, o pobre garoto achou que seus sentimentos eram correspondidos, mas seu mundo caiu assim que Priscila pegou suas coisas e saiu correndo e chorando pelos corredores da escola que pareciam mais enormes do que o de costume.
Ele ficou lá, parado, olhando enquanto a a figura de uma garota em prantos diminuía na sua vista, ele soube que ele não era correspondido.
✨✨✨
Uma semana depois
Aquela seria a conversa, eles uma hora teriam que se encarar.
- Bom - ela começou serenamente - não sei se te dei esperanças algum dia, não sei o porquê de você ter feito isso, mas, saiba, você não tinha nenhum direito de fazer isso sem meu consentimento, não estamos em um livro, não é assim que as coisas funcionam.
Sua bochecha estava vermelha, nem um tomate maduro ganharia daquela cor, seus olhos queriam fuzila-lo por inteiro, mas ela mantinha sobretudo a calma na voz.
- Vo.. Você deveria saber que eu sempre fui apaixonado por você, estava tão óbvio, eu te amo desde que nos tornamos próximos. Mas agora sinto que tudo isso passou, desde que você simplesmente me deixou plantado sem entender nada eu percebi que você nunca me amou e que eu não merecia sofrer por um amor que nunca vai para frente, e bom, essa conversa não vai nos levar a lugar nenhum. Adeus, não fale comigo nunca mais.
Priscila não sabia o que dizer, ela estava chocada, o que ela queria oferecer era um acordo de paz mas ela fora fuzilada sem dó nem piedade, mas porque? Porque ela era obrigada a saber sobre os sentimentos dele? Ele era um irmão pra ela, não alguém que ela cogitasse se apaixonar.
Ele andava com passos pesados pelo corredor, ela tentava ir atrás mas era como se seus pés estivessem presos ao chão, ela nunca iria sair dali.
Sua primeira reação foi chorar, ela havia acabado de perder aquele que outrora fora seu melhor amigo, seu confidente, aquele que outrora ela confirara sua vida.
Tudo por culpa de um sentimento que ela não podia controlar.
Ela nunca iria se perdoar.
Por algum motivo, o tempo passou e ela não tentou se aproximar mais, ela simplesmente ignorava a existência dele, ela aprendera da maneira mais dolorosa que pessoas que não tem o que quer são capazes de passar por cima dos sentimentos de todos.
Mas ela sentia falta da amizade dele.
Sentia mesmo.
Sempre o via com alguém e pensava.
"Será que ela é a nova melhor amiga dele?" Ou "será que ele a ama?"
Quando ela deu por si, ela havia se afastado por completo dele.
Não frequentavam os mesmos lugares.
Não tinham um ao outro em redes socias.
Um não existia para o outro.
Esse era o fim.
Do que outrora fora uma linda amizade.