Único

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Charlotte estava confusa. Não conseguia entender o que estava acontecendo com seus sentimentos e nem o que se passava na cabeça de seu melhor amigo. Ele havia dado todos os indícios de que não sentia nada por ela após os sonhos, altamente desconcertantes, que tiveram meses atrás. Quando Jack apareceu Henry não havia deslizado em nada durante todo o jantar, a ajudou de uma forma que há tempos Charlotte não via e fez de tudo para compensar a burrada que tinha ajudado a fazer. Então, não havia motivos para acreditar que ele nutria algo mais profundo do que uma amizade por ela, mas mesmo assim, mesmo com tudo o que sua mente rebobinava, apesar de todos os pontos que organizava em lista quase alfabética, Charlotte não conseguia tirar aquela sensação que apertava seu peito de que Henry era um grande ator e nas entrelinhas ele mostrava que realmente gostava dela.

Charlotte inspirou profundamente tentando acalmar seu coração, talvez fosse tudo fruto de sua mente confusa, mas o pior de tudo era não saber se queria realmente ter certeza dos sentimentos de Henry para provar que está certa ou se no fundo ela quer que seja recíproco.

"Recíproco?! Oh, de jeito nenhum tem reciprocidade no meio disso. Não da minha parte."

Pensou consigo mesma, soltando um alto gemido de frustação quando fechou os olhos com força e tombou a cabeça para trás, o sofá da Caverna man pelo menos estava confortável àquela tarde. Já deveria ser quase noite e se deu conta de que havia passado horas em seu monólogo complexo, sorte que nenhum dos outros estava no momento. Olhou ao redor analisando cada parte do espaço, estava tentando gravar ainda mais na memória o que tanto a iria fazer falta. Além de seus pais ninguém mais sabia sobre a carta de aceitação que estava naquele exato instante enquadrada no escritório dos Bolton, seu ingresso premiado para fora de Swellview em direção ao seu curso dos sonhos, o problema era que ela não sabia como iria contar para os outros, não imaginava como seriam suas reações, mas iria ficar destroçada se eles nem ligassem para sua partida.

O ponto é que Charlotte se sentia cada dia mais menosprezada, parecia que cada palavra que saia de sua boca era errada aos olhos dos outros, tinha conhecimento de que eles a amavam assim como ela à eles, porém, estava deslocada e não tinha como negar. Seu tempo como ajudante de super-herói estava praticamente no fim e Charlotte não sabia se iria conseguir aguentar ver seus amigos arriscando suas vidas todos os dias, não sabia se iria aguentar caso algo acontecesse com ele.

Balançando a cabeça para se livrar de pensamentos frustrantes, Charlotte se levantou e começou a caminhar em direção ao elevador, mas o som de chegada a fez parar. As portas se abriram e de lá saiu um garoto alto de sorriso doce que a encarou de forma preocupada.

- O que está acontecendo?

A garota piscou atônita tentando esconder o fato de que algo grande estava realmente acontecendo, e pela forma que ele a encarava, Henry tinha total conhecimento disso.

- Por que algo deveria estar acontecendo? - tentou despistar mantendo sua cara inexpressiva, ficou boa em manter as aparências ao longo dos anos.

- Você não sabe mentir. - acusou, a fazendo abrir a boca indignada.

- E-eu sei muito bem mentir, muito obrigada. - a gagueira do início a desestabilizou, e o sorriso convencido que seu amigo abriu a irritou. - Você é que não sabe mentir, nem se fosse pra salvar sua própria vida.

- Com licença, mas quem é o super-herói que já salva a vida de todos nessa cidade há anos e que nunca foi descoberto?

- E quem é a pessoa por trás dele que já salvou esse convencido milhares de vezes dele mesmo?!

- Isso é irrelevante!

Charlotte o encarou completamente irritada e Henry se aproximou cuidadosamente, mas soltando risadas de como ela estava, no caso, prestes a ataca-lo.

- Seu idiota. - disse em uma voz baixa antes de começar a dar tapas nele que ria enquanto tentava se proteger.

- Ok, ok. Acho que já deu. - falou, ainda rindo, quando a segurou pelos pulsos a fazendo parar de estapea-lo e o encarar ainda de cara fechada. - Você sabe muito bem que sem você, eu e o Ray já teríamos ferrado com tudo há um bom tempo.

- É claro que sei, todo mundo sabe. - afirmou convencida, empinando o queixo em direção à ele que não conteve uma gargalhada.

- Você realmente não existe.

Soltando os pulsos dela, Henry naturalmente passou os braços ao redor da cintura de Charlotte que havia cruzado os seus próprios.

- Não tenho culpa se você demora a entender as coisas, mas sério, Hen, você tem que aprender a se cuidar. - não vou estar aqui por muito tempo, completou em sua mente lutando contra o aperto em seu peito.

- Eu tenho você, não preciso me preocupar.

Ela realmente não esperava por isso, o aperto em seu peito foi intensificado em mil e antes que pudesse pensar no que fazer seu corpo agiu por contra própria. Contornou o pescoço do amigo o puxando para um abraço apertado e tendo retribuição por parte dele, escondeu o rosto na curva do seu pescoço. O cheiro de amaciante, canela e gel de cabelo acalmaram seus batimentos a ajudando a controlar suas emoções. Ela não queria dizer nada agora e sabia que Henry tivera a confirmação de que algo estava errado assim que sentiu uma das poucas lágrimas teimosas que escorriam de seu rosto e paravam no pescoço dele.

Henry a apertou mais forte afudando o rosto em seus cachos e Charlotte se permitiu deixar sua mente em branco e se perder naquele abraço-casa sentido pelos dois. Ainda não era hora de despedidas, ainda não era hora de pôr pontos finais, ainda não era hora de pensar nas implicações de tudo, era hora de somente aproveitar a companhia daquele que a fazia enlouquecer na mesma medida em que a acalmava, era somente a hora de se guardar memórias e sensações. O resto ela deixaria para mais tarde, somente mais tarde.

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