Happy Hour

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O barbudo chegou fedendo a um dia inteiro de trabalho. Por isso escolheu o canto do balcão a pelo menos três banquinhos do beberrão mais próximo. Não estava a fim de papo e logo pediu uma cerveja. Depois mais três na sequência, pois o dia foi longo. Só então relaxou um pouco e, ligeiramente tonto, observou o ambiente.

O barman polia uma leva de copos, um bêbado solitário dançava lentamente um country brega em frente ao jukebox, um grupo de senhoras usando maquiagem exagerada conversava em uma mesa e o balcão parecia a passarela do inferno, com meia dúzia de demônios atormentados pelos próprios problemas. Fora isso o bar estava escuro. Não se enxergava a parede do outro lado.

Depois de cinco canecas, já não havia como ignorar. Precisava esvaziar o tanque. Passou pelo jukebox bem na hora que o DJ da noite colocava outra moeda. No banheiro a música soava alta, parecia que o aparelho ficava lá dentro. O jato foi longo. Um recorde mundial talvez. Durou a música inteira. Quando voltou o silêncio era completo e um vento gelado cortava o ar. Notou só o som das próprias botas ao caminhar para seu lugar. Lá reparou que a caneca estava vazia, outra vez. Ergueu a mão e... onde estava o barman?

Girou a cabeça, depois o corpo e finalmente deu uma volta completa sobre o banquinho. Onde estava todo mundo? Confuso, se levantou e tentou entender que espécie de brincadeira era aquela. Andou até a janela, afastou a cortina e do lado de fora avistou apenas a neve fina que caía e a escuridão mais além. Deu três passos para trás e ficou pensando, tentando decifrar o enigma. Mijou por tanto tempo assim? Estava em uma dimensão paralela? Todos haviam desaparecido ou só ele havia desaparecido de todos? Havia morrido?

O ronco de seu estômago provava que ainda vivia. A fome era grande. A sede também. E de repente sorriu com uma idéia. Deu a volta no bar e encheu sua caneca até transbordar. Abriu a vasilha de ovos cozidos e devorou vários. Achou saquinhos de amendoim, castanhas e chips, espalhou tudo sobre o balcão e fez sua festa. Acendeu um cigarro, terminou a cerveja e providenciou um refil. Arreganhou a caixa registradora e colocou um punhado de notas no bolso. Depois pegou as moedas. No jukebox escolheu algo ao seu estilo e dançou. Sentia-se extraordinariamente bem.

Não demorou. Ruídos estranhos vieram dos fundos. Sentiu um cheiro que de alguma forma parecia familiar. Os pêlos da nuca se arrepiaram e suas narinas se alargaram para promover a respiração exagerada. Uma sombra gigantesca se avolumou da passagem para a cozinha e se espalhou pelo salão. O coração do homem parecia querer pular pela boca. O urso negro o encarava com desdém. Estava ali pelos salmões e trutas, mas bem que poderia comer o que estivesse sobrando pelo caminho.

O barbudo resolveu não esperar, em poucos segundos correu pela noite até se juntar à perplexa e indignada freguesia daquele bar.

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