11. Casa na Árvore

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PRÍNCIPE ELÓI

Bosque das Cobras, Tâmasus, Romênia.

23 de agosto de 1971

Tarde
Sigo Alonzo por um caminho fechado. Ele justificou isso dizendo que, se tomasse sempre o mesmo caminho, uma trilha se formaria, o que seria uma rota mais acessível para seu refúgio. Não queria isso. Claro que desconfiei dessa justificativa e mantive preparada a adaga que sempre carrego comigo em minha bota, transferindo-a com discrição para o lado da minha cintura, segura pelo cinto.

Chegamos no que parecia ser o final do Bosque, perto do limite das barreiras. Há uma grande e frondosa árvore, um salgueiro, com seus quinze metros de altura. Alonzo puxa um dos galhos mais baixos e rapidamente uma comprida escada de pequenas madeiras roliças e cordas desce até nós. Olhando para o alto, forço a visão para tentar entender de onde aquilo havia caído, mas tudo que vejo é a densa e vasta copa do salgueiro.

- É um mecanismo simples de alavanca. Se puxo para baixo, a escada desce. Para cima, sobe, obviamente - diz ele, percebendo meu desentendimento. - O que chamo de refúgio está lá em cima, escondido entre os galhos e folhas.

Alonzo vai me empurrar do alto dessa árvore, tenho certeza.

- Eu faria a gentileza de te deixar ir primeiro, mas você não saberia abrir a entrada - ele começa a subir e gesticula para que eu faça o mesmo. - Vamos! Aposto que vai gostar!
Todos os meus sentidos dizem para aproveitar que ele está distraído subindo e correr, me esconder. Mas quando vejo, já estou logo atrás dele e estamos chegando ao topo.

Passando pela copa densa, posso ver melhor de onde a escada veio: uma casa na árvore, claro! Tem um tamanho considerável e parece diferente de qualquer outra, como se houvesse sido preparada para servir de abrigo ou algo assim. Até então, achava que Alonzo se referia à ela como "refúgio" por ser apenas um lugar tranquilo. Mas não, posso ver claramente isso.

Ele abre a portinhola, entra e me convida para o mesmo. Por dentro, o lugar parece um quarto médio de qualquer casa: o piso é liso, um colchão no chão, um armário pequeno com alimentos de preparo instantâneo, uma única boca de fogão ligada a um mini botijão de gás, tambores d'água, uma arara com algumas mudas de roupas, alguns utensílios culinários e uma prateleira com livros.

- Mas... O que você... Como você construiu isso?

- Tive a ajuda do Tafra por algum tempo, só enquanto construíamos. Quando ficou pronta, ele preferiu esquecer que existia. Disse que eu poderia fazer o que eu quisesse com ela e... Bem, como pode ver, estou quase de mudança para cá.

Me martelada na cabeça o fato de Alonzo ter acabado de me conhecer e já ter mostrado esse lugar e contado tanto sobre ele. O que ele pretende com isso? Talvez ele tenha visto em mim uma oportunidade. Vai me matar. O que estou fazendo aqui se sei que ele vai me matar?

※※※

Sentamos no chão mesmo e passamos horas conversando sobre nossas vidas, sobre como nos sentimos incompletos... Ele percebeu que a vida de príncipe não é toda essa maravilha, embora tenha seus luxos. Já eu percebi que a vida em Scorpion Place pode ser bem mais complicada do que parece.

Alvin Alonzo Pavlo nasceu em 21 de dezembro de 1955 em Scorpion Place, filho de Otto e Juani Pavlo. Juani faleceu no parto de seu filho, o que fez com que Alonzo fosse criado pelo pai, que sempre o culpou pela morte de sua esposa. Otto, junto com Glauco Aranha, irmão de Juani e pai de Tafra, fundaram Scorpion Place e difundiram seus ideais até fazer a nova comunidade ter a grande população de hoje. Com Alonzo não simpatizando com os ideais Escorpiões - que são basicamente transferir o poder da Coroa para eles -, Otto, que via em seu filho um sucessor até então, acabou por direcionar seus ensinamentos para outros jovens Escorpiões que fossem mais interessados. Hoje em dia, a relação de pai e filho entre Otto e Alonzo é praticamente inexistente. Para fugir da reprovação paterna e da pressão da comunidade, Alonzo está quase todo o tempo em sua casa na árvore, já que seu pai não dá por sua falta.
A única pessoa com quem Alonzo tem uma relação mais próxima é Tafra Aranha, filho do braço direito de Otto, Glauco, com Anne Aranha, uma mulher que Alonzo descreveu como prepotente, arrogante e egocêntrica. Queria ser como minha mãe, uma rainha. Tafra simpatiza com os ideais Escorpiões, mas parece compreender bem a divergência do primo.

- A vida naquele núcleo familiar é tóxica. O ar que entra em meus pulmões quando estou em meio a eles parece ácido, corrosivo. Não vejo sinceridade em ninguém ali, nem mesmo em Tafra.

- Acha que Tafra faria algo contra você algum dia por toda essa relação de liderança? - pergunto vagamente, apenas para puxar assunto.

- Tafra tem uma consideração por mim que jamais será recíproca. Algo nele me faz o querer longe, mesmo ele nunca tendo feito nada de mal contra mim.

A máscara de Alonzo está em cima da prateleira com livros e a de meu irmão repousa em meu colo. Perco o olhar e pensamento encarando as capas e imaginando o que há dentro daquelas páginas. Há cerca de cinquenta livros.

- Você leu todos esses? Alguns parecem bem antigos...

- Li sim, cada um deles. São sobre biologia, comportamento humano, geografia, e alguns sobre armas. Arco e flecha são as que mais me atraem. Modéstia à parte, atiro muito bem... Alguns contam histórias também, ficção. Passo muito tempo lendo. Bom... - ele se levanta e vai até o armário de alimentos - Não tenho muito aqui que possa servi-lo, Príncipe Elói... Quer dizer, Alteza, mas há uns biscoitos frescos... Os comprei hoje mesmo.

Noto seu constrangimento e sua tentativa de agrado. Não me importa muito o luxo, mas me admiro com sua atitude.

- Me chame apenas de Elói, por favor - aceito de bom grado os biscoitos e me sirvo de um. - Você realmente vai se mudar para cá? Como vai se sustentar?

- Tentarei algo no centro de Tâmasus. Deve ter algo que precise ser feito por um simples arqueiro amador...

- Como servir a guarda tamasiana...

- O que?

- Volte comigo para ser treinado por verdadeiros arqueiros e se tornar, no futuro, um guarda pessoal... Ou qualquer outra coisa que quiser. Ser aprendiz de alguém da Coroa te daria muitos créditos...

- Não ignore o fato de meu pai querer acabar com você e sua família - diz Alonzo, rapidamente. - Não tem a menor chance de isso dar certo.

- Confiei em você para vir até aqui, como disse. Agora confie em mim, darei um jeito de ficar conosco no Castelo e ainda ser treinado.

- Elói...

- Vamos lá, não seja medroso! E eu já tenho um plano. Preciso ir agora, mas me encontre amanhã no mesmo beco em que estivemos hoje, vou te levar para o Castelo. Mas antes... Estenda o seu braço direito.

Artrópota: Árvore-MármoreOnde histórias criam vida. Descubra agora