17. Refugiada

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LOUISE VALERIE

Território aéreo sobre o Oceano Índico.
29 de maio de 1986

Tarde
- Meu Deus, como o Leonardo ronca! Hahaha!

- Mal posso esperar para pousarmos...

- Ainda vai levar algumas horas, relaxem!

- Shhh! Vocês vai acordar a garota!

Ouço vozes... Vozes turvas, nebulosas, que se dissipam aos meus ouvidos... Estou tonta, enjoada... Ouço um som de turbinas... O que aconteceu?... Eu... Estou sentada? Ainda visto as roupas do convento... O que houve com o ônibus foi um pesadelo?

- Ei, vejam! Ela acordou!

Será que essa voz se refere a mim? Oh! Acordei mesmo! Meu Deus, estou voando! Há uma janela ao meu lado, vejo o céu! Não, eu não morri! Fui raptada!

Começo a gritar, desesperada:

- Onde estou? Me... Me tirem daqui! Quem são vocês?

Tento remover o sinto de segurança, mas é algo diferente do habitual e não consigo. Há 10 pessoas aqui, 6 homens e 4 mulheres. Nunca os vi na vida, mas há algo de estranho neles.

Afetuosa, uma delas, que está na coluna de poltronas ao meu lado, diz:

- Calma! Calma! Está tudo bem, ok? Não vamos te fazer mal algum, apenas te resgatamos...

- Me resgataram? Oh céus! Madre Elizabeth! Onde ela está? Onde estão todas?

- Morreram. - diz um dos homens que estão nos comandos, aparentando ser o copiloto.
Sofro quieta o impacto da morte de Elizabeth e demais meninas. Disse coisas ruins da maioria delas, mas não mereciam morrer assim. E Elizabeth... Ah... Foi tão boa para mim. Espero que esteja num lugar melhor que onde vivíamos.

- Alonzo! Seja mais delicado! - diz a mulher que tentou me acalmar. Ela tem cabelos curtos e ruivos na altura do pescoço. Tem um rosto longo e delicado e um corpo farto. Há um corredor separando as duas colunas de poltronas, o que me chama atenção: não é um avião comum, há poucos lugares. O que é isso, então? Um jatinho?

- Úrsula, por favor, não temos tempo para isso. É melhor que ela já saiba assim do que ficarmos de rodeios. - responde o copiloto. Ele é forte e branco, muito branco. Tem cabelos negros penteados para trás com costeletas brancas.

Há um homem roncando logo atrás de Úrsula. Ao menos alguém consegue se manter tranquilo. Dorme profundamente. É rechonchudo e tem um rosto redondo e avermelhado. Parece alguém legal.

- Qual é o seu nome, garota? - diz outra mulher, que está logo atrás da poltrona onde estou. Parece mais velha... É a única negra do grupo. Ah! Preciso parar com essas observações desnecessárias. O senhor e a senhora Valerie, como se não bastasse tudo ainda eram racistas. Sempre apontavam pessoas negras na rua ou ocupando algum cargo importante. O preconceito não chegou em mim, mas observo sim (com orgulho, diferentemente deles). Gosto do visual dela: tem um cabelo afro bem alto com duas tranças brancas, uma em cada lateral da cabeça e começavam na parte frontal, na linha das sobrancelhas, para se encontrarem presas em sua nuca.

- Louise. Louise Valerie.

- Louise... Bonito nome! - Responde outro homem, que está sentado atrás da mulher das tranças. Este com um maxilar longo e queixo largo. Usa uma barba curta e negra, assim como seu cabelo, que é preso por um rabo de cavalo em sua nuca. Há uma pequena mexa branca em sua franja, como a da mulher anterior, e grossas sobrancelhas. É grande e forte, mas demonstra ser delicado também. - Sou Tuski Di Saulo e esta é minha mãe, Kássia Di Saulo. Muito prazer! Saúde e glória!

Artrópota: Árvore-MármoreOnde histórias criam vida. Descubra agora