Beijada pela primeira vez

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  Ele olhava pra mim. E eu não sabia fazer outra coisa a não ser sorrir...

{...}

 No sétimo ano do ensino fundamental, tudo o que eu sonhava era namorar um garoto do ensino médio. Um garoto mais velho. Na minha turma, todas as garotas já tinham beijado. Todas, menos eu. E eu queria que o meu primeiro beijo fosse com ele, Jefferson Muniz.

 Jefferson era o garoto mais atraente de todo o colégio. Alto, magro, mas com músculos bem definidos, cabelos e olhos castanhos. Estava cursando o terceiro ano do ensino médio, era atacante do time de futebol mais popular da cidade, e melhor amigo do meu irmão.

 Eu o conhecia desde, sei lá, sempre? Por ser amigo do Matheus, meu irmão mais velho, o tínhamos como membro da família, eu nunca o vi de outra forma que não fosse como irmão. Até o dia em que ele se esbarrou em mim na festa de aniversário da Luiza, sua falecida namorada.

 Era sábado à noite, estávamos todos no chalé dos pais da Luiza, nas montanhas. Jefferson e meu irmão estavam no canto mais escuro da sala, bebendo. Quando Jefferson me viu, veio até mim na intenção de me cumprimentar, mas estava tão bêbado, que acabou tropeçando em seus próprios pés e derramando o vinho que estava no seu copo em meu vestido branco. Quase surtei quando o vi naquele estado, meu vestido, claro. Jefferson pediu desculpas, e na tentativa de ajudar a me limpar, acabou encostando sua mão na minha, e sem pensar duas vezes a segurou. Sua respiração era desregular, não consegui identificar se era pelo efeito da bebida, ou pela situação constrangedora. Jefferson olhou nos meus olhos e naquele momento senti um tremor percorrer todo o meu corpo, algo que eu nunca havia sentido antes, Jefferson nunca estivera tão próximo a mim como naquele momento. Ele estava perto demais da minha boca. Suas mãos passaram pelas minhas costas e deslizaram para a minha cintura. Sua boca se aproximou mais da minha. E quando ele estava prestes a me beijar, Luiza chegou e o arrancou dos meus braços o levando para longe. Uma semana depois ela foi encontrada em um matagal próximo ao chalé, com um punhal cravado em seu peito, o padrasto foi preso pelo assassinato. E desde aquele dia, não consigia parar de fantasiar o quase beijo de Jefferson.

{...}

 "Olha a bola", ouço alguém gritar arrancando bruscamente a lembrança de Jefferson e de Luiza da minha cabeça. Pisquei duas vezes ao notar que tinha uma bola de futebol voando em minha direção, logo em seguida senti uma pancada na cabeça, algumas pessoas riram, e logo depois senti alguém segurando a minha mão. Olho pra cima, para além da mão que me segurava. Jefferson, sorria agradavelmente, me fazendo esquecer da dor e da vergonha de ser atingida por uma bolada na cabeça...

  Ao olhar dentro dos seus olhos, voltei ao enterro da Luiza...

{...}

 Ele estava triste, e chorava ruidosamente. Eu o estava abraçando, já era quase meia noite. Todos que estiveram no enterro de Luiza já haviam ido embora. Éramos os únicos que restaram no cemitério silencioso e sombrio. Estava chovendo, mas mesmo assim, ficamos parados em frente ao túmulo de Luiza. Depois ele me levou para casa, e após esse dia, Jefferson e eu ficamos cada dia mais próximos.

{...}

  "Se machucou?" Jefferson perguntou. Não respondi. Apenas balancei a cabeça negativamente. Jefferson sorriu, e antes de pegar a bola e voltar ao jogo. Entregou-me um papel. Ao abri-lo, não pude conter o sorriso.

"TE ESPERO AS NOVE NA MINHA CASA"

 Guardei o bilhete no bolso da calça, e mal podia acreditar que teria um encontro com Jefferson Muniz. "Hoje darei o meu primeiro beijo" Prometi a mim mesma.

 Ao olhar o relógio, já na porta da casa de Jefferson, notei que estava adiantada dez minutos. Respirei fundo, sabia que não devia estar ali, na casa de um garoto quatro anos mais velho que eu. Mas eu não queria concluir a sétima série ainda BV, não quando todas as minhas amigas já tinham beijado. Tomei coragem e toquei a campainha. No primeiro toque Jefferson atendeu e me convidou pra entrar, entrei, sem saber ao certo o que fazer. Minhas mãos estavam suando, eu estava visivelmente nervosa. Sabia que os pais dele estavam viajando, e sua única irmã morava no Canadá, estávamos sozinhos.

 "Vamos para o meu quarto, lá estaremos mais a vontade" Disse, e eu o segui, sem saber ao certo se era isso mesmo que eu queria fazer, pensando seriamente na possibilidade de voltar dali mesmo e ir pra casa.

 Já tinha estado na casa de Jefferson várias vezes com meu irmão e minha mãe, que era amiga da mãe dele. Mas nunca estive no quarto dele. Ao entrar notei que ele tinha vários posters de seriais killers de filmes que víamos na tv e de revolveres e facas. Um frio se espalhou pela minha espinha. Aquela imagem era assustadora. Nunca gostei de filmes violentos, mas muitas vezes me obrigava a assistir com eles só pra não ter que ficar sozinha. Bom, uma coisa era assistir filmes violentos na tv, outra bem diferente era dar que cara com os caras mais sangue frio da ficção, estampados em grandes papeis espalhados por todo o quarto do garoto.

 Jefferson disse que ia buscar algo pra gente beber na cozinha, então resolvi vasculhar o quarto dele a procura de algo que tirasse todas aquelas armas e caras maus do meu campo de visão. Porém ao abrir uma gaveta da cômoda que ficava ao lado da cama, dei de cara com um punhal idêntico ao que foi encontrado cravado no peito da Luiza, e que havia desaparecido misteriosamente logo após ser retirado do corpo sem vida dela. Eu sabia disso porque havia visto as fotos tiradas por curiosos após encontrarem o corpo dela. O punhal estava sujo de sangue seco e embaixo dele tinha uma foto da Luiza com uma marca vermelha feita por caneta permanente em seu peito. Bem no lugar onde o punhal estivera. Foi quando me dei conta de que aquele punhal não era idêntico ao que foi encontrado na Luiza, era o mesmo, e o sangue dela ainda estava ali. Mais chocante do que estar com a arma de um crime na mão, era saber que o criminoso era praticamente um membro da família, era o cara com quem eu queria dividir o meu primeiro beijo, era o garoto a quem eu tinha ido encontrar na sua casa, e o mesmo garoto que chegaria ali a qualquer momento. Motivada pelo misto de choque e medo, joguei o punhal no chão e dei um passo para traz, e ao me virar dei de cara com ele, parado na porta com os braços cruzados e expressão tranquila, não consegui me mover. Ele se aproximou devagar, tentei passar por ele para chegar até a porta, mas ele me segurou antes que eu pudesse passar. Jefferson me jogou na parede com tanta força que fiquei imóvel. Eu queria sair dali, mas ele segurou meus braços, e me puxou para mais perto de si. Seus lábios encostaram-se nos meus, sua língua penetrou invadiu a minha boca, e vasculhou cada centímetro dela. Me fazendo esquecer das provas de que ele era um assassino, me fazendo esquecer de onde eu estava, e até mesmo quem eu era. Nada mais me importava, a não ser o sabor doce da sua boca da minha, eu tinha esperado quatorze anos por aquilo, e agora, nada ia me tirar desse paraíso.

 Sua língua era gentil e apressada e transitava pela minha boca com uma intensidade cada vez maior. Eu não queria que ele parasse, nunca. Mas de repente senti algo penetrar meu peito esquerdo, algo afiado, gélido. Afastei-me do seu corpo arfando, senti-me tonta, desnorteada, mal conseguia respirar, minha visão ficava cada vez mais turva, cambaleei e me apoiei na cômoda que estava do meu lado, senti um impulso de tocar na lamina afiada que invadira meu corpo, mas só conseguir tocar em um cabo de madeira, senti o cheiro de sangue invadir minhas narinas, então me dei conta do que estava acontecendo. Olhei nos olhos dele, seus olhos brilhavam em um tom de azul celeste, sua boca se retorcia em um sorriso cínico, vitorioso. Não consegui me segurar, me vi caindo de encontro ao chão, tudo ao meu redor girava, senti o impacto da minha cabeça sobre o piso de madeira, senti meu mundo se acabando, me atrevi a olha-lo mais uma vez, ele estava de braços cruzados, vi seus lábios se moverem, e uma voz que parecia estar distante invadiu os meus ouvidos.

 - Adeus Gabriella- Então tudo escureceu.

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⏰ Última atualização: May 12, 2020 ⏰

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