Perder-se em seus olhos

Perdendo-se em você

~a história se passa antes dos acontecimentos do canon, ou seja, xy ainda não apareceu.~

---

Song Lan e Xiao XingChen havia recém voltado de uma cansativa caçada noturna. Eles estavam em alguma cidade do interior fazendo pequenos trabalhos a comerciantes e, como já havia anoitecido, resolveram que o mais indicado era descansar e passar a noite em uma das poucas pousadas do lugar.

A pousada em que estavam era a mais distante do centro da cidade, nos arredores do local já dava para se ver o que seria a saída da pequena cidade. O quarto que escolheram era bem de frente a floresta densamente sombria que se alastrava até se perder de vista.

A noite estava agradável com uma brisa suave rumorejando entre as árvores e o som dos grilos cantando lá fora era tudo o que eles podiam ouvir.

Após pagarem a estadia e comerem da refeição da casa, XingChen havia insistido em chamar seu companheiro até a varanda do lado de fora do quarto para observar o céu noturno com ele. E apesar do evidente cansaço físico que sentia, ele ainda o acompanhou resolutamente sem nem precisar pedir por mais de duas vezes.

Song Lan inalou o ar fresco da noite e sentiu seu corpo instantaneamente relaxar. Eles não tinham muito tempo que pudessem gastar despreocupadamente e agora, ele ao menos podia apreciar o clima agradável que havia se instalado sem preocupações.

Seus olhos caíram no rosto em paz do homem ao seu lado.

Song Lan sentiu sua respiração falhar e um suspiro surpreso escapar de seus lábios. Ele sempre esteve consciente que XingChen era um cultivador altamente habilidoso e de rosto bonito, um talento raro e gracioso que chamaria atenção das pessoas aonde quer que estivesse.

Mas ali, não havia ninguém quem pudesse apreciá-lo tanto como ele. Seus cabelos pretos estavam soltos emoldurando seu rosto e caíam em cascata banhados em uma tonalidade levemente prateada da luz da lua acima deles, a expressão em seu rosto estava serena, desprovida de qualquer máscara, suas sobrancelhas estavam relaxadas e a pele branca leitosa de seu rosto acetinado traria inveja a pedra de jade mais bonita. Sua respiração provocava um ruído tranquilo parecendo absolutamente imperturbável. Seus olhos negros gentis estavam brilhando e encaravam os pontos luminosos que cobriam o céu escuro, eles pareciam ter vindo diretamente de alguma constelação solitária e reluziam em um tom que mais se assemelhava a estrela líquida. Suas roupas brancas de dormir eram levadas pelo vento frio e espalhavam o cheiro suave de sândalo. Sua postura etérea se assemelhando a um ser divino que abandonara o céu em algum lugar entre aqueles astros e os abençoou com sua graça e gentileza.

Gentileza essa que fez com que Song Lan fosse capaz de segui-lo por aí e largasse o templo BaiXue, aonde havia passado toda a sua vida, para fazer parte de sua seita que só possuía um membro.

Seu ideal era puro, quase ingênuo. Mas a determinação em sua voz era indubitavelmente digna de arrastá-lo até ali, enquanto ele explicava que o melhor para as seitas era serem formadas a partir de suas afinidades e ideias ao invés de laços sanguíneos.

Ele não sabe exatamente quando a aura gentil de XingChen tocou seu coração como um sopro, ou encheu seus ouvidos com suas risadas doces, ou fez sua pele formigar a cada toque suave de suas mãos -ignorando o fato de que odiava ser tocado ou tocar outras pessoas-, ou seu coração se aquecer a cada vez que sentia ser o único capaz de se perder em seus olhos e segredar em seu ouvido o quanto isso era seu privilégio.

E mesmo distante, em uma cidade qualquer, cercado pela floresta de uma noite estrelada, quando ele observava a figura ao seu lado em volta da névoa noturna, tudo o que ele conseguia pensar era que XingChen era o mais próximo de casa que ele tinha.

E apesar de quase nunca expressar isso em palavras ou demonstrar claramente em seu rosto, ele estava feliz por compartilhar momentos como esse ao lado da pessoa que amava.

Enquanto se emaranhava em seus próprios pensamentos, a voz calma e sussurrada de XingChen ecoou no silêncio. "É bonito, não é?"

Song Lan virou a cabeça lentamente em sua direção e focou seu olhar em seus olhos agraciados pela luz da lua. Ele sentia que necessitava gravar em sua mente cada centímetro de seu rosto.

Seus lábios se separaram e murmuraram uma confirmação em resposta. "Sim"

O sorriso sutil nos lábios cor-de-cereja de XingChen se tornou uma risadinha quase provocativa quando lhe disse: "Zichen, acho que não estamos falando da mesma coisa."

Song Lan sentiu a ponta de suas orelhas assumirem um tom avermelhado e desviou os olhos, temendo que o outro fosse capaz de ler sua alma.

Os dedos finos e macios de XingChen roçaram delicadamente as costas da mão fria de Song Lan em um toque gentil e sem pressa. Seus dedos iam e viam pela extensão de sua pele em uma carícia suave. Um contato físico natural que combinava com a atmosfera silenciosa do lugar, um toque físico para os unir apenas porque suas almas já estavam tão misturadas que seria difícil até distingui-las.

Song Lan entrelaçou seus dedos cuidadosamente. Eles se encaixavam como se estivessem sempre ali, como se seu comprimento houvesse sido feito para se unir aos um pouco menores de XingChen. Como a lua brilhante e a brisa gentil e a neve distante e o frio congelante. Como o som e o silêncio, como a escuridão e a luz, como o frio e o calor, a indiferença e a gentileza, compartilhando entre eles seu próprio equilíbrio e amor.

Song Lan encarou seu olhar e lhe deu um sorriso mínimo. "Vamos voltar, está ficando frio."

Amanhã eles teriam mais um dia cansativo em alguma caçada noturna, e a noite viria e eles teriam outra chance de observar a imensidão do céu distante acima deles outra vez, sem arrependimentos. E Song Lan esperava sempre ser capaz de poder se perder dentro daqueles olhos. Porque ele sabia que eles sempre arrumariam um jeito de se encontrarem de novo.

--