6. briga de perdedores

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FELIPE

Ao final da aula de História, minha cabeça já estava borbulhando com tanta informação. Durante o ano, debatemos bastante sobre o que estava acontecendo em nosso país, sobre as manifestações, as motivações delas e, com certeza, sobre como isso afetaria o futuro do Brasil.

Amanda, que estava sentada na minha frente, anotava freneticamente todas as informações do debate. Ela, que se julgava há meses por ter ouvido seus pais e ficado em casa enquanto as manifestações ocorriam. E reclamava de mim, por não ter feito companhia para ela.

Na época, também fui contra ela sair para a rua, e nunca tinha visto uma garota tão puta da cara comigo. Nossas conversas com opiniões contrárias me renderam um final de semana inteiro sem notícias dela. Lembro de ter remoído todas as minhas falas e ter prometido a mim mesmo que jamais voltaria a fazer qualquer coisa que levasse a isso novamente.

Dois meses depois, cá estou eu. Remoendo todas as lembranças que tenho ao lado dessa garota estressada, fechada e muito autêntica.

Eu tinha esquecido do quanto nossa amizade significava para mim, porque depois de um tempo nós acabamos nos acostumando com as pessoas com quem convivemos e, aparentemente, tudo parece comum. Na minha vida, sempre busquei por coisas novas e dei prioridade à novas experiências... nunca imaginei o impacto que as minhas atitudes tinham com Amanda, porque sempre achei que ela fosse estar disponível para mim 24/7.

É claro que esse foi meu maior erro, eu admito. Acreditar que uma pessoa vai passar por cima dos próprios princípios apenas para estar contigo é a coisa mais egoísta que tu pode fazer. Que eu pude fazer, e todo esse meu monólogo interior tem estressado a mim e, com certeza, qualquer pessoa que puder ler meus pensamentos.

Entendo isso agora.

Entendo que meu apego por Ana foi por ela ser uma pessoa com o mesmo estilo de vida que eu, mas com o empecilho de que ela nunca iria me querer. Era o meu desafio pessoal e eu sempre fui competitivo.

Ao soar o sinal do final da aula - ele sempre deixava todos surdos - Amanda foi a primeira da turma a sair da sala, acabando com todos os meus planos de puxar assunto e me deixando parado, olhando para a porta por onde ela havia passado há menos de 1 minuto.

— Festinha amanhã, gato? — A voz feminina, que ainda me causava arrepios, soou poucos centímetros atrás de mim.

— Pode apostar que sim. — Sorri, me virando para encarar o rosto simétrico de Ana Carolina e sentir o seu cheiro de morango.

— Yay! Vou te esperar lá para dançarmos bastante. Podemos dividir a bebida, né? — Seus olhos estavam brilhando de animação, a face tinha uma vermelhidão natural nas bochechas.

Passei meu braço por cima do seu ombro para caminharmos juntos.

— Seria uma honra dividir meus drinks com a senhorita.

Antes de passar pela porta, recebi um tapinha nas costas.

— Bora hoje, né irmão? — Era Charles, o DJ de todas as nossas sociais.

— Com toda a certeza, de noite nos vemos, cara. — Bati em sua mão, soltando Ana por poucos segundos. Ele piscou para ela, que soltou uma gargalhada.

Aparentemente, nossa proximidade levantou suspeitas de toda a turma, e também estranhamento devido a Amanda. José, então, nem olhava na minha cara. E, se olhava, era com desdém e até mesmo rancor. Se Amanda estivesse narrando, diria que em seus olhos ela enxergava o fogo cuspido pela boca dos dragões e línguas de cobra dançavam em suas pupilas ao som de rituais satânicos.

Estrelas que nos guiamOnde histórias criam vida. Descubra agora