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Três horas. Exatamente depois de três horas ininterruptas Lady Blonos me libertou de suas garras mortíferas e grudentas. Meu corpo todo dói por causa das aulas de postura e etiqueta. Mas isso não chega nem perto dos extensivos exercícios mentais nos quais a velha me submeteu. Sinto que a minha cabeça vai explodir se eu parar para pensar por mais um segundo. Lady Blonos quis enfiar todas as regras da corte dentro da minha cabeça nos últimos momentos de aula. Faltou pouco para eu incinerá-la com gosto.

Em três horas eu tive que aprender o que já sei sobre as Grandes Casas: funções na sociedade, hierarquias, cores, poderes e mais. Porém, como uma boa farsante, tenho que fingir o máximo possível, mesmo estando sob a desconfiança de todos do Palacete.

A presença de Lucas é um breve refúgio no meu caminho ao Terraço de Vidro. Para o meu azar, o lugar não fica tão longe da sala de aula da Lady Blonos. É só descer umas escadarias e virar um corredor que chegamos lá rapidinho. Nem tenho alguns minutos para me recompor antes de encarar a rainha Elara e Evangeline, principalmente as outras garotas da Prova Real. Meu amigo não precisa falar nada. Olhar nos seus olhos já basta para saber que ele está me desejando boa sorte.

Respiro fundo depois de abrir a porta. Uma brisa fresca bagunça o meu cabelo, acalmando os meus nervos e esfriando a raiva crescente em mim. Apesar de ser um jardim artificial, ainda é belo. O Terraço de Vidro faz jus ao nome, com o seu famoso dossel colorido feito das cores das Grandes Casas e suas representantes. As mulheres andam aos arredores, uma explosão de sedas importadas e caríssimas. Ao ver isso, não me enxergo como Raven, muito menos uma Calore. É Ravenna que as observa, uma criada que só está a espera de ordens para começar os seus afazeres.

Se eu me esforçar mais um pouco, posso fingir que nada disso aconteceu. Que tudo não passa de um simples pesadelo e que vou acordar amanhã de manhã ainda com o meu poder oculto dos prateados.

Mas a aproximação de duas moças mais do que conhecidas me arrancam de qualquer ilusão criada por mim.

Elas não aparentam ter segundas intenções, mas a maneira como me olham demonstra que jamais serão minhas aliadas. Só o que me resta é aceitar essa pressão. A cores de seus vestidos é o de menos.

— Lady Raven, alteza — ambas me reverenciam ao mesmo tempo. Apesar da elegância fria e muito bem treinada, não há nada de verdadeiro nela. As duas não me respeitam, ainda que demonstrem o contrário para as outras mulheres presentes no Terraço. Vão ficar de olho em mim o máximo que puderem, e isso é um péssimo começo para o nosso jogo sujo.

— Meu nome é Sonya, da Casa Iral — a de cabelo preto e pele bronzeada fala primeiro. Suas cores são o azul-escuro e vermelho, exibindo as suas origens. Sonya é uma silfo, caso não me falhe a memória. Seus movimentos são ágeis, discretos, rápidos e perfeitos, ótimos para combates corpo a corpo. Por isso são tão úteis no front quando a guerra esquenta.

— E eu sou Elane, da Casa Haven — a outra complementa quase num sussurro. Elane é o total oposto de Sonya, com a sua pele pálida e cabelo ruivo. O seu vestido é de um preto básico, fácil de representar as cores de sua Casa. Ela é uma sombria, manipuladora da luz. Não duvido que esteja usando o seu poder agora, pois o seu rosto está mais angelical e imaculado que o normal sob o dossel incomum. — Queremos lhe dar as boas-vindas.

As suas palavras tornam-se encantadoras para uma garota ingênua e deslocada. Mas eu não sou desse tipo. E sei muito bem o que pretendem. Não vou tolerar que duas garotas insignificantes sejam a razão da minha morte. Existem coisas muito piores nesse mundo sádico. Porém, não posso deixar com que as desconfianças de Sonya e Elane acabem com tudo.

— Agradeço a gentileza — curvo a minha cabeça numa reverência limitada para uma princesa de respeito. Aquela que não se dá ao luxo de ser amiga daquelas que só pensam na sua ruína.

A Mais Forte (What If...?/AU) [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora