se você não sabe, os planetas são massas gigantes do esperma que algum dia esteve no saco de um deus que já morreu e hoje está esquecido no outro plano da terra, onde ficam os loucos e os velhos deuses. ah, os velhos deuses.
eles eram o retrato de nossa mocidade, quando todos ainda não sabiam que iríamos explodir em tantos pedaços que não poderíamos mais contar nem se que quiséssemos.
naquela época, as outras estrelas ainda eram grandiosas como o sol e as estradas ainda eram costuradas por mulheres que viam algum prazer nisso ao invés de escravas em algum país onde os impostos são reduzidos para empresas multinacionais.
é preferível falar com nostalgia da época em que fomos uma só como se tivéssemos sido uma só em tempo integral. sabemos que não fomos.
pode ser que os planetas não sejam o esperma saído do escroto de um velho deus, talvez ele seja o próprio escroto. ultimamente se vêem muitos bichos escrotos por aí e isso ao menos justificaria.
gostamos de nos prender à ideia de que naquela épocas fomos felizes, porque se não fomos felizes naquela época, não fomos felizes em época alguma. acreditamos também que naquela época os preços eram aceitáveis, o mar era mais limpo e as pessoas eram mais decentes só porque é simplesmente um absurdo sem cabimento que em tempo algum os preços tenham sido aceitáveis, que o mar nunca tenha sido mais e que as pessoas não tenham sido mais decentes quando éramos indecentes e... jovens. ah, éramos jovens... hoje somos um pouco menos jovens e, assim como naquele tempo, gostamos de crer no que nos convém.
algum dia você vai voltar com tudo e todos verão que essa história não tem lados. essa história não tem nem a porra de três lados que era o que ela precisava para ser um polígono. ela tá mais pra um círculo.
só com a força do meu amor por ti eu poderia voar por todos os quatro cantos da terra.
claro, isso só objetivamente, porque esse amor é coisa mais poderosa que eu possuo (ou possuí?) mas na prática eu não poderia fazer isso, primeiramente porque não posso voar. isso é uma merda porque todas as vezes que eu acordar com saudade eu não posso fazer nada além de assistir o mato crescer em uma daquelas cadeiras dobráveis no meu jardim, com o sol matutino queimando meu couro cabeludo como se fossem três da tarde. eu te amo o suficiente para ter forças para voar, mas eu não consigo voar mesmo assim. o tanto que eu te quero e te amo não é proporcional ao tanto que eu posso fazer por você.
você foi embora. foi embora sem nem deixar um número de telefone novo na minha secretária eletrônica.
e por alguns minutos, eu consegui enganar a mim mesma dizendo que eu não me importava, mas até os pentelhos do saco de um velho deus riram de mim porque eles sabiam que era mentira.
eu não derramei uma lágrima por você, por mais que eu quisesse. eu não fumei um cigarro por você, por mais que eu quisesse.
se você não sabe, a terra é plana e ela se sustenta em cima de pilhas de cachos de uva que apodreceram antes de virar vinho. nós costumamos morar lá. nós costumávamos ser felizes e costumávamos ser uma só. no final, só temos ex-costumes aos montes, abandonados em uma planeta onde um dia vivemos, porque nos últimos sete dias um bilhão de cataclismos aconteceu e o outro plano da terra ficou virado para cima. por uns dias, nem sol tivemos.
e quando eu te procurei, você não estava lá. você tinha ido e deixou para trás seu computador para que você não recebesse e-mails sobre essa merda de lugar.
eu acho que você fugiu 'pra lua com alguém.
se você não sabe, a lua é um bombom de cimento. ele agora 'tá molengo e feio. a textura não me agrada, mas em breve vai piorar e ele vai endurecer. vai ficar tão duro que eu vou pagar por não ter preferido engolir ele quando ainda tava mole. o meu bombom vai se tornar um pedaço do meu dente e o lado direito da minha bochecha vai ser para sempre inutilizado, porque sob a sombra de um baobá, esperamos que as raizes não cresçam para cima e entrem com tudo na nosa bunda.
mas afinal, porque se preocupar? eu já sou uma arrombada mesmo.
se você não sabe, existe um deus por aí que ocupa o altar vazio na minha sala de orações. ele é bem decente e nunca formaria planetas com as próprias bolas — ou o que tem dentro delas. no final das contas, as outras estátuas são mais enfeites porque é a esse deus que eu imploro quando me desespero. eu imploro a Deus, se é que há um Deus, que Ele tenha misericórdia de minha alma, se é que eu tenho uma alma, porque meus atos covardes seriam imperdoáveis para qualquer um que não fosse a minha mãe. por isso eu não te culpo.
no final, éramos uma inteira e uns pedaços meio capengas, que, quem sabe, formariam uma dízima periódica equivalente a um (muito embora eu não estivesse em condição de transformar estes em fração, então continuaram meros pedaços). eu sou os pedaços meio capengas, só pra constar.
se você não sabe, é impossível dividir um número por dois e haver dois inteiros, a não ser que a incógnita seja dois. nesse caso, nunca fomos uma, fomos duas desde sempre.
se você não sabe, o meu horóscopo e o meu tarot deram a mesma coisa. os meus mapas estrelares me levaram à mesma conclusão. meus cálculos complicados de astrofísica me mostraram o mesmo: eu sinto a sua falta.
já se foi uma semana desde o nosso primeiro (des)encontro e cinco anos desde que nos tornamos uma só pela primeira vez. não acho que nossos destinos vão se cruzar novamente, quem sabe em uma outra vida, no máximo. de qualquer maneira, obrigada e desculpa.
se você não sabe, eu te amei, te deixei ir e você foi embora quando pôde. então, eu não tentei te segurar, por mais que eu quisesse, porque eu sabia que minhas ações justificam a sua ida.
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ida.
Poetryse você não sabe, os planetas são massas gigantes do esperma que algum dia esteve no saco de um deus que já morreu e hoje está esquecido no outro plano da terra, onde ficam os loucos e os velhos deuses. ah, os velhos deuses.