Prólogo

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Corro floresta à dentro numa velocidade  espetacular. Evito todos os obstáculos  com precisão.  Meu fôlego  parece ser infinito, não  me sinto nem um pouco  cansada.  Pelo contrário, me sinto mais viva que nunca. O sangue corre em minhas veias, energizando todo meu corpo, me fazendo percorrer uma distância  cada vez maior em menos tempo. Não  sinto mais nenhuma dor, o que é  um grande alívio. 

Finalmente me sinto livre, sensação  que não  me acometia a anos. Me afasto cada vez mais daquela prisão  horrível, onde me mantiveram por mais tempo do que posso contar.

Paro um pouco, olhando para trás.  Não vejo ninguém,  mas ainda escuto algo se movendo. Não  me preocupo. Me sinto forte o bastante para enfrentar qualquer coisa.

Volto a correr, cruzando rodovias e adentrando em matas desconhecidas. Não  sei onde estou, sequer quem sou. Apenas fujo em direção  ao desconhecido, sem nenhum objetivo.

Não sei em qual ano estamos. Vasculho minha mente, procurando qualquer informação  que possa me ser útil.  Apenas um vazio preenche minhas memórias. Só  consigo me lembrar da vida naquela casa.

Não  existiam nomes. Todos eram identificados por números. Fui escolhida  como a N°150. Éramos  submetidos a diversos experimentos, de todas as espécies  possíveis. O silêncio  no laboratório  era diariamente  quebrado por gritos estridentes de dor causada por alguns testes. Tratadas como meros objetos, pessoas eram "descartadas" quando já  não aguentavam mais aquela tortura.

Qualquer que fosse o objetivo daquilo, nos era desconhecido. A desinformação  em primeiro momento foi angustiante. Passei os primeiros meses procurando alguma pista, alguma coisa que pudesse indicar a razão  de tudo aquilo, ou até  mesmo quem estava por trás de algo tão  cruel. Após várias  tentativas frustradas,  apenas desisti e me entreguei a nova realidade.

Os testes vinham sendo aplicados a mim com frequência. Eu já  não  estava aguentando mais. Então,  mudei minha estratégia. Meu foco foi direcionado em descobrir como eu poderia sair daquele inferno antes de perder completamente minhas forças. Nas poucas oportunidades que existiam, eu saía as escondidas  para conferir portas e janelas, de forma discreta. Demorou um tempo até  que eu encontrasse uma pequena passagem de ar que mal cabia o meu corpo, mas levava a uma saída.

Escapei na primeira oportunidade. No último  teste aplicado, me senti diferente. Como um efeito colateral, passei por uma completa transformação, que melhorou todos os meus sentidos. Conseguia ouvir o menor ruído mesmo a grandes distâncias,  conseguia ver qualquer coisa com melhor precisão,  além  de ter ganhado uma força  sobre-humana. Suponho que essa não  tenha sido a intenção  daqueles vermes, mas não  seria eu que iria reclamar.

Rastejando, atravessei a passagem e me entreguei a liberdade. Ao sair, olhei de relance o espaço  em que fui mantida por tanto tempo, em busca de algum nome. Mesmo sabendo que talvez não  adiantasse nada, e que eu não  saberia o que fazer com tal informação,  gravei um nome que não  esquecerei tão  cedo:

SHADOW'S CORPORATION.

Esta é a minha vida após  as sombras.

O Outro Lado da SombraOnde histórias criam vida. Descubra agora