Está muito escuro, é uma noite sem lua. Não consigo não irritar-me com isso, não contabilizei bem a passagem do tempo conforme a viagem, se tivesse notado que estávamos no fim da minguante eu não teria dito para acamparmos na floresta Sehul.
— Irmane eu to com medo... — disse uma voz fina temerosa atrás de mim.
Olhei para o lado, a pequena mão de meu irmãozinho estava segurando firme junto a minha, nossa mãe havia lhe dado o nome de Ermet, homenagem a um tataravô nosso que possuía cabelos ruivos tão laranjas quanto os dele, o pequeno Ermet já estava se encaminhando para seu oitavo inverno de vida e já havia passado por muitas intempéries, não permitirei que nada mais de mal aconteça a ele.
Mãe. Pai. Não se preocupem, eu irei cuidar dele.
— Eu sei irmãozinho, nós vamos ficar bem, só temos que nos apressar, não solte a minha mão e absolutamente não esqueça, a partir desse ponto não desvie os olhos do caminho, ok? — digo sorrindo tentando espantar meu próprio medo, mesmo de olhos marejados ele segurou o choro acenando afirmativamente com a cabeça, sua coragem me apertava o coração.
Um barulho vindo do lado esquerdo das árvores, no lado oposto a mão que eu segurava a de meu irmão, chamou minha atenção. Esforcei-me para não olhar para lá, dizem que espíritos e demônios enganam os vivos quando desviamos o olhar de nosso caminho, para que possam roubar nossas almas.
Não sei se deveria estar me lembrando das histórias da vovó Ka nesse momento, porém seus conselhos eram muito instrutivos e sua presença acalentadora. Ela era uma senhora que já não possuía mais família e sua casa era também um templo para Fer, uma divindade da sabedoria, vovó Ka era uma sacerdotisa e curandeira que ajudava a todos da vila. Eu vivia fugindo pro templo para pedir por histórias, que ela prontamente me contava, eu diria que ela meio que me adotou e até me ensinou sobre a fé a Fer.
Queria que ela estivesse viva... Queria que todos estivessem...
Algumas lágrimas escaparam de meus olhos antes que eu fosse capaz de segurá-las, elas foram levadas pelo vento como se fossem as lembranças que eu deixava para trás, traumas que estavam marcados em mim, nunca seria capaz de superar toda essa dor, principalmente a de saber que nunca mais eu poderia abraçar nenhum deles.
Voltei a me concentrar no caminho, o conselho da vovó combina perfeitamente com o que havia escrito na placa de alerta, "Por esse caminho, quem olha para a escuridão plena, caminha para ela", por sorte percebi logo que a noite caiu qual era a lua de hoje, sem ela para cuidar de nós estamos entregues a nossa própria sorte, rodeados pela mais completa escuridão.
Não sei que tipo de criatura habita essa floresta, porém estou certo de que ficaremos bem se não desviarmos de nosso objetivo e continuarmos fugindo. Os barulhos vindos dos dois lados da floresta tem ocorrido com frequência, alertei meu irmão veemente para ele focar no caminho a frente, mas preocupo-me.
Começo a ouvir um barulho que parecia vir de alguns metros atrás de nós, algo que parecia um leve barulho ritmado, logo viraram rápidas e pesadas passadas que esmagavam a grama por onde havíamos andado.
— Irmane, tem alguém atrás da gente! — exclamou Ermet amedrontado
— Não importa, não olhe, foque a sua frente — respondi
— Mas quem está atrás da gente? Eu to com medo — insistiu ele
Aperto a mão dele para transmitir confiança e incentivo-o a acelerar o passo.
— Se está com medo, ore para Fer, a divindade lhe trará conforto e irá lhe proteger, podemos não ter a luz da deusa Ki-inda hoje, mas Fer está certamente nos protegendo com seus conselhos.
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Sussurros do Escuro
HorrorTerríveis desesperos acontecem em meio aos sopros da floresta, tristes desesperanças trazem reveladoras descobertas.