Capítulo 5 - João - Parte 4

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João

João reflete por um momento. Ele decide que Dom Eduardo está certo. Lorde Bainard comanda a Terra do Ferro, uma das regiões mais ricas do Império. Sua família sempre foi fiel aos Scliros, especialmente pelo fato de seu castelo, a Agulha, ser tão próximo ao Punho do Imperador. Qualquer desobediência seria respondida imediatamente com um ataque das forças Imperiais.

No entanto, o caminho até lá é muito perigoso. A Agulha fica bem ao lado da foz do Rio Vermelho, e seguir pelas suas margens é o jeito mais fácil de chegar até lá. Além desse caminho ser muito vulnerável, já deve haver centenas de soldados da Terra do Amanhã procurando por João. No entanto, mesmo sendo um plano arriscado, o Príncipe sempre confiou na intuição de seu mentor, e agora não será diferente.

Dom Eduardo passa a mão na testa para secar o suor. João nota que ele está suando bastante, apesar do vento frio da manhã. Embora o sangue nas roupas do Príncipe já tenha secado e tenha adquirido um tom escuro, as roupas de Dom Eduardo continuam manchadas por um forte e vívido vermelho. O sangramento ainda não sarou, João constata.

- Nós temos que curar a sua ferida, Dom Eduardo – o Príncipe sugere.

- Não se preocupe. Eu estou bem.

- Você não parece bem. – João olha em volta, tentando ter uma noção de onde, exatamente, eles estão. Não parece haver nada em volta além de árvores, plantas e lama às margens do Rio Vermelho. – Tenho certeza que há alguma vila por perto. Com certeza vai ter algum curador por lá.

- Não seja tolo – o cavaleiro diz, rispidamente. – Se aparecermos em alguma vila, seremos pegos. Nós temos que seguir o Rio Vermelho. Em alguns dias, estaremos nos domínios de Lorde Bainard.

João pensa em insistir no assunto, mas desiste. Afinal de contas, Dom Eduardo não está errado. Se eles forem vistos em algum dos vilarejos próximos à Cidade da Planície, as chances de serem capturados por soldados da Terra do Amanhã serão grandes. A esta altura, se Lorde Lucas desconfia que João ainda esteja vivo, é possível que ele esteja oferecendo uma recompensa pela cabeça dele e de Dom Eduardo.

- Pelo menos vamos comer algo – João diz. – Eu estou faminto, e você deve estar também.

- Há uma macieira atrás daqueles arbustos.

- Fique aqui. Eu vou pegar algumas maçãs.

Após comerem as maçãs, João e Dom Eduardo prosseguem em sua jornada. Eles continuam a seguir a margem do rio, onde a vegetação é mais densa. Apesar de ser mais difícil de andar, em razão das plantas e do solo macio, a vegetação diminui as chances que eles sejam avistados.

João nota que Dom Eduardo fica mais ofegante e com respiração mais pesada a cada minuto. O Príncipe diminui o seu ritmo, para evitar que se distancie demais do cavaleiro. Ele continua suando bastante, e sua pele está muito pálida, como se todo o sangue tivesse sido drenado de suas veias.

Ainda que João se sinta triste pela morte de seu pai, a verdade é que ele sempre teve em Dom Eduardo a sua principal referência. O Imperador estava sempre ocupado com os seus afazeres e, mesmo quando dava alguma atenção aos seus filhos, era geralmente Fernando, o sucessor do trono, quem recebia mais atenção. João sempre foi relegado a segundo plano, embora isso nunca o tenha incomodado. Ele sentia-se satisfeito em passar a maior parte do seu tempo com Dom Eduardo, praticando suas habilidades com a espada e aprendendo táticas de guerra. Ele nunca quis ser Imperador; sua ambição sempre foi se tornar um cavaleiro e comandar as forças Imperiais.

Agora, tudo mudou. Com a morte de seu pai, João tornou-se o sucessor direto do trono. E se aquilo que sonhou é verdade, e seu irmão Fernando também foi morto, João será declarado Imperador. Mais do que nunca, ele precisa de Dom Eduardo ao seu lado, para ajudá-lo e aconselhá-lo. Ele não confia em nenhum dos Lordes, Barões e Eruditos; todos eles são apenas urubus, que circundam a Torre do Imperador em busca de migalhas de poder.

Os dois caminham por várias horas, até que Dom Eduardo para repentinamente e ajoelha-se no chão.

- Dom Eduardo! – João diz. – O que houve?

- Nada – o cavaleiro responde, ofegante. – É apenas o cansaço. Eu já não sou tão jovem.

Das Cinzas da Era PerdidaOnde histórias criam vida. Descubra agora