Capítulo 5 - João - Parte 7

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João

João não tem dúvida de que ambos são camponeses, cidadãos comuns. No entanto, nenhum dos dois tem a expressão apática que os camponeses geralmente têm.

- Quem é você, garoto? – a menina pergunta, apontando uma flecha na direção de João. Ele nem havia notado que ela estava armada. – O que você quer?

- Algum de vocês sabe curar ferimentos? – João pergunta, ofegante.

- Curar? – o rapaz pergunta, levantando-se. Ele coloca uma mão sobre o punho de uma espada pendurada em sua cintura. A julgar pelo punho da espada, ela está velha e enferrujada. – Do que você está falando? Qual é o seu nome?

O Príncipe dá um passo atrás, dando-se conta de que isso talvez não tenha sido uma boa ideia. O rapaz olha para ele como se ele fosse a sua caça do dia. João não se preocuparia com isso, se não fosse pela flecha apontada para o seu peito. Ele pode ser rápido com a espada, mas não é mais rápido que uma flecha.

- Eu... meu pai está ferido.

- Seu pai, é? – o rapaz diz, aproximando-se. Para cada passo à frente dele, João dá um passo atrás. – Onde ele está?

- Perto da margem do rio.

João segura o punho da sua própria espada, e o rapaz para. Ele não dá outro passo adiante.

- Bonita essa sua espada – ele diz. – Aposto que a lâmina deve ser boa.

- Ela é muito boa – João diz. – Ela é tão boa que é capaz de cortar uma pessoa ao meio.

O rapaz dá um sorriso debochado. Ele olha de relance para sua companheira, que ainda está com sua flecha apontada para o peito de João.

- Se você o machucar, eu te mato – ela diz.

- Pode ser que você me mate – o Príncipe responde. – Mas não a tempo de salvar o seu amigo.

- Deixa ele ir embora, Yuri – diz a menina, com uma expressão preocupada. – Vai embora, garoto, e nós prometemos que não vamos te machucar.

- Você está doida? – diz o rapaz, cujo nome aparentemente é Yuri. – Olha para ele. Você não sabe quem ele é? Essas roupas... – ele diz, olhando João de cima a baixo. – As cores... o brasão em seu peito... e, é claro, os olhos. Julia, eu tenho o prazer de te apresentar ao Príncipe João Scliros, o herdeiro do trono.

João sente um calafrio subindo pela sua espinha. Ele sabe que está em apuros. Não era para ele ter sido encontrado, quanto mais identificado. Ele se dá conta de que foi ingênuo. Ele ainda veste as cores de sua família, e tem a serpente bordada em seu peito. Além disso, apenas os membros da Família Scliros têm os olhos dourados. João seria facilmente identificado por qualquer pessoa no Império.

Yuri volta a se aproximar, dando um passo em direção a João. O jovem Príncipe se afasta e empunha a sua espada.

- Fique longe de mim! – ele diz, apontando a ponta de sua espada para Yuri, que observa a lâmina com olhos arregalados.

- Então essa é a famosa Espada do Renascer? – Seus olhos praticamente brilham enquanto ele admira a espada. – Incrível... – Ele empunha a sua própria espada, e João confirma a sua suspeita. A lâmina está cheia de manchas e parece não ser muito afiada. É uma espada velha e má cuidada. – Vamos fazer o seguinte... você vai dar essa espada para nós, e vai vir conosco.

- Para onde? – João pergunta, já sabendo a resposta. A menina, Julia, não parece gostar nem um pouco da situação.

- Para a sua família, ora. Seu tio vai te proteger, meu Príncipe.

- Meu tio é um traidor. E se você me levar até ele, você vai ser um traidor também. Um inimigo do Império.

- Você não é bem informado, né? – Yuri diz, com um sorriso de canto de boca. – Seu tio é o Império nessa região. Além disso, nós sabemos o que aconteceu no Ninho. Estava todo mundo comentando no vilarejo hoje mais cedo. Tenho que confessar, eu estou surpreso de vê-lo vivo.

O coração de João bate acelerado. Não era para isso estar acontecendo. A esta altura, Dom Eduardo já morreu ou está muito próximo de morrer. E ele está aqui, encurralado, com uma espada e uma flecha apontadas para si, prontas para matá-lo. Ou ele ataca, e arrisca ser morto pela flecha, ou se rende e aceita ser entregue ao seu tio, que provavelmente não vai querer mantê-lo vivo.

A não ser que...

- Vamos fazer um acordo – João diz.

- Um acordo, é? – Yuri diz, intrigado. – Que tipo de acordo?

- Eu quero chegar ao Castelo da Agulha, onde Lorde Bainard vai me manter a salvo e me ajudar a voltar para o Punho. Se vocês me ajudarem a chegar lá, eu vou recompensá-los.

Das Cinzas da Era PerdidaOnde histórias criam vida. Descubra agora