Teu corpo

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     Acordo com o barulho feito pelos despertadores, hoje é meu último dia aqui, não quero ir embora, não desejo que essa história acabe, quero beijá-la, abraçá-la, tê-la hoje, amanhã e por toda minha vida.

     Levanto já pensando na despedida, vou para o banheiro, mesmo sendo bem cedo, opto por um banho gelado, a água tocava minha pele em temperatura tão baixa que poderia comparada ao meu coração no momento, frio, corrente, vazio, sabendo que talvez nunca mais a encontre, toque ou beije. Apenas um toque, ou até um olhar dela seria suficiente para pôr novamente em chamas esse coração que nesse momento congelava ao pensar que dela me despediria.

     Saio do banho e me arrumo, visto minha jaqueta azul tão usada nesses dias e escondo-me do frio, organizo minhas coisas, guardo tudo que levei, fecho mais uma vez o zíper daquela mala, dessa vez, cabisbaixa. Decido sair do quarto e tomar um ar, beber água, precisava lidar com isso.

      Me direciono ao bebedouro, a água, gelada como a madrugada e aquela que a pouco tempo caía do chuveiro, fez-me voltar à consciência, por mais que não quisesse, eu teria de me despedir de Luiza.

     A água gelada me fez lembrar que estava sendo servido o café da manhã, me sento à mesa do refeitório onde, após pouco tempo, tenho a companhia de minhas colegas, conversamos normalmente, até que aqueles olhos, como um imã, mais uma vez me encontram, Luiza estava também sentada, do outro lado do refeitório conversando com um grupo de amigas. É incrível a forma como sempre sou atraída por seus olhares, seria distração não compará-los aos imãs com a facilidade que são atraídos, aqueles olhos que por dias ocuparam minha mente, nesse momento, sinto ocupar o coração.

     Voltando para o quarto, vou em sua direção, posso perceber, pelos seu olhar, o quanto também não queria se despedir, sem muito falar, me abraça, diz um amargo “tchau” em meu ouvido, e assim a vejo se distanciar, sinto meu coração com ela, ser levado, quando está a alguns metros, se vira, vejo o sorriso em seu rosto, aquele sorriso... Dessa vez não tão animado ou alegre, mas não deixa de ser o mais perfeito já visto por mim.

     Assim que finalmente me viro de costas, sinto uma solitária lágrima escorres, nesse momento, não apenas de tristeza, mas de gratidão, por estar viva e por ter vivido uma das maiores aventuras de minha vida, senão a maior, por ter tido a oportunidade de conhecer Luiza com seu jeito meigo e misterioso, por ter vivido mesmo que pouco, mas intensamente o tempo que passei ao seu lado.

     Limpo a e sorrio, chego neutra ao quarto, com ajuda de Eduarda, coloco o colchão no ônibus para adiantar, minha mala também foi levada, restava apenas uma bolsa, com coisas que uso com mais freqüência.

     Assim que todos colocam seus pertences no ônibus, vamos pela última vez para aquela quadra, aquela onde vi o sonho da medalha de ouro se construir e desmoronar. Era o jogo final do time masculino, apesar de tudo, me mantive firme na torcida, gritávamos e comemorávamos cada gol, infelizmente, mesmo com todo nosso apoio, não venceram, acabaram levando a medalha de prata o que mesmo não sendo o melhor, era digno de comemoração.

     Assim que a entrega de medalhas se encerra, nos dirigimos a outra quadra, a qual nunca havíamos ido, era o jogo final da equipe de vôlei que também pertence à escola onde estudo, vejo em quadra, algumas amigas, era perceptível o nervosismo, como aconteceu com os meninos, também levariam medalha de prata e algumas lágrimas para casa.

     Acabamos passando um bom tempo acompanhando os jogos, já estava quase na hora do almoço, aquela que seria nossa última refeição em Botero. Assim que chego, olho para todos os lados, mas Luiza não está a alcance do meu olhar, lembro de ter visto alguns ônibus saindo, talvez ela até tenha ido embora, apesar da despedida, queria ter visto-a mais uma vez.

     Assim que esse pensamento passa por minha mente, a vejo de longe, ela olha em minha direção e sorri, é o suficiente para fazer com que permaneça em minha mente pelo resto do dia ou, quem sabe, do mês.

     Sou chamada por uma das “tias” para almoçar, e penso em ir, assim vou procurar por seus olhares por um tempo, eu acho.  Me distraio por um bom tempo, conversando na mesa do refeitório e até dançando após o almoço, enquanto os meninos, que iriam no mesmo ônibus que nós, tomavam banho e se aprontavam para voltarmos.

     Tudo já estava organizado, esse é o momento que entramos no ônibus e voltamos para casa, mas não sem vê-la mais uma vez. Ela passa andando em direção contrária a minha, fito seus olhos é como se o mundo parasse, os planetas e alinhassem e só existisse ela em meu mundo. Olhos, aqueles olhos são capazes de me fazer enxergar toda uma vida, todo um futuro. Sem nem piscar, meu olhos se direcionam ao seu sorriso, singelo, calmo, estava ali, diante de mim, numa distância não tão longa, seus lábios perto dos meus, a vontade de beijá-los mais uma vez, de tê-los colados aos meus pela eternidade. Meus olhos descem mais um pouco. Visualizo todo seu corpo moreno, que orna completamente com todos os detalhes, com o brilho daqueles olhos verdes, com o balançar dos longos fios cacheados de seus cabelos seguindo o vento, com a serenidade do sorriso formado por aqueles lábios macios e avermelhados, a voz que se assemelha à canção mais bela já ouvida e com o toque, o toque que arrepia todo meu corpo, que me conforta e ascende ao mesmo tempo, és a escultura mais bela já vista.

     Sou dessa vez tirada de meus pensamentos, não por alguma voz me chamando, um despertador tocando ou um treino que estava por vir, mas pelos passos que nós mesmas damos, nos afastando, lentamente e convivendo mesmo sem querer com aquela que a partir de agora seria conhecida como a vilã dessa nossa história: a distância.     

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