Dante conheceu Janice em fevereiro, quando já não fazia mais frio. Eles faziam parte do mesmo grupo, lutavam juntos contra a Ordem há alguns meses, mas nunca haviam se conhecido de verdade. Era mais como um "oi" aqui, uma "boa sorte" ali, um "me passa aquele mapa" lá, mas nunca um "como vai? O que tem feito? Quer tomar um café? Vamos derrubar um monumento histórico que celebra uma grande marca da opressão do nosso reino juntos? ".
E isso se dava por muitos fatores, mas o principal era muito mais simples, eles tinham cada um seu nicho e não saiam muito disso. Janice costumava andar muito mais com as mulheres do grupo, tinham até suas próprias missões voltadas em ajudar outras mulheres a se juntar a causa, enquanto que Dante era muito mais chegado em fazer seu nome — com a aprovação de seus amigos mais próximos —, procurando se destacar em tudo que fazia.
Mas naquele dia, ambos foram colocados para participar de uma mesma missão. Algo simples, só precisavam distrair alguns Agentes para que outros do grupo pudessem passar pela fronteira.
Enquanto arrumavam sua montaria, Dante tentou puxar conversa.
— A senhorita tem alguma arma que irá usar?
— Minha adaga serve ou você prefere continuar achando que eu não faço parte disso há tanto tempo quanto o cavalheiro e sei como me preparar? — Janice foi dura em suas palavras.
— Perdão, não era meu intuito ofender.
— Tudo bem.
Um silêncio constrangedor se instalou no ar. O homem realmente não quis soar rude, perguntou por perguntar, mas agora percebia que era uma pergunta estúpida.
— É que, na verdade — ele voltou a falar, tentando disfarçar. —, é uma pergunta de praxe, para ter certeza de que está tudo nos conformes, qualquer coisa eu poderia lhe emprestar algo.
Mas a outra nem lhe dirigiu mais a palavra. Janice era muito concentrada no início de missões e não gostava de perder tempo com conversas cotidianas que podiam distraí-la, tampouco fazia questão de concordar com essas normas sociais de cordialidade, gostava de conversar com quem queria conversar. A razão maior, entretanto, era que não ia muito com a cara de Dante, sabia que ele tentaria tornar aquela pequena tarefa em mais um de seus momentos de glória e a participação dela acabaria sendo esquecida.
Ela então subiu em seu cavalo e ficou esperando enquanto o homem terminava de pentear seu afro baixo na frente de um pequeno espelho. "E ainda por cima é vaidoso...", a mulher pensou consigo mesma, segurando uma risada.
— Certo — Dante começou a falar, guardando seu espelho e olhando seu relógio de bolso. —, acho que já podemos ir.
— Ótimo. — Sem esperar o parceiro, Janice mandou seu cavalo começar a correr.
O outro surgiu logo depois, quase que não a alcançara. Dante não sabia dizer se ela não gostava dele ou se só estava muito focada, porém como já ouvira todo tipo de coisa sobre ela não se surpreendeu. Rodavam entre alguns colegas as especulações de que ela era uma vampira arrependida — ou apenas planejando para os atacar — e alguns eram ainda mais maldosos em dizer que ela era gorda demais para isso, chamavam-na até de madame gorduchinha; alguns falavam que ela tinha grande ressentimentos do passado como ter sido abandonada no altar pelo noivo ou que fora traída. No meio de todas essas conversas, uma coisa era evidente: poucos homens gostavam de trabalhar ao lado dela. O próprio Dante relutou em aceitar a missão quando soube com quem era, mas fez um esforço porque gostava de manter a boa aparência para quem quer que fosse, sabia que isso lhe concedia coisas melhores na maior parte do tempo — fora que ele realmente não gostava de ter inimizades com gente que lutava ao lado dele, isso era perigoso demais.
VOCÊ ESTÁ LENDO
(RE)CONHECER - um conto sobre Dante e Janice
Short StoryNuma luta perigosa, o sangue do inimigo se torna pretexto para se fazer um amigo. Dante e Janice lutam a mesma batalha, mas ainda não se conhecem.