A menina que desenhava sonhos

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            Esta não é uma história comum. Se eu pudesse lhes dizer, na verdade, diria que é uma história totalmente incomum. Uma história que não estamos habituados a ver por aí. A história de uma menina e seus desenhos — desenhos estes que representavam mais que mera imaginação, mas também tudo o que vinha à sua mente enquanto dormia. Seus sonhos, tanto quanto ela conseguia se lembrar.

            Seu nome era Mariana. De cabelos escuros e pele bem branca, e impressionantes oito anos de idade. Vinha de uma família que não era rica, mas pobres não eram. Não era de fazer muitos amigos, preferia o mundo dos desenhos e da pintura. Desenhava com giz de cera, lápis de cor e canetinha. Caneta esferográfica, lápis número 2, e às vezes pegava pedras e marcava o chão com formas.

            Mas isso não era tudo para ela. Tinha vontade por mais, mas não sabia dizer o que era. Só sabia que poderia (e deveria) expandir o conceito de suas pinturas, desenhar em mais planos do que as pessoas poderiam ver. Claro que ela não sabia o que era naquele momento de sua vida, só foi aprender isso depois. Ou melhor, depois ela sentiu isso. Nunca chegou a entender plenamente. Mas estou me adiantando aqui.

            — Por que fez isso? — Sua mãe lhe perguntou certa vez, quando a menina pegara seu perfume e derramara no chão para fazer um desenho. Depois, com a ajuda de um primo, dois anos mais velho, incendiaram o peixe que desenhou e ficaram admirando impressionados. — Me diz por que, Mariana!

            — Só queria ver como ia ficar, mamãe — respondeu ingênua.

            — O que você quer fazer, afinal?

            Não sabia o porquê, mesmo assim respondeu:

            — Quero entrar na cabeça das pessoas e desenhar sonhos lá dentro, mamãe — as palavras saíam livremente de sua boca, aparentemente sem propósito ou efeito.

            Sua mãe também não compreendeu aquelas palavras. Achou que fosse apenas a ilusão infantil de uma menina de oito anos, por isso acabou-a perdoando por ter usado seu perfume caro. Até achou bonito. Coisas de mãe, tenho certeza que entende. Se não entende, se for mulher entenderá um dia. Se for homem, pergunte à sua mãe.

            Enfim...

            Essa é Mariana. Mas sua história não começa em um dia qualquer, mas sim num dia específico de sua vida, quando estava na escola. Mariana sempre foi uma menina quieta e calada, gostava de uma vida de prazeres silenciosos: via televisão sozinha em absoluto silêncio, seus desenhos animados favoritos; desenhava sozinha; gostava de comer em silêncio, degustando cada alimento individualmente; brincava de bonecas, apenas ela e seus brinquedos.

            E ela era assim na escola, uma solitária. Quando sua mãe foi busca-la naquele dia, as crianças brincavam entre si, apenas sua filha estava isolada dos demais. Reparou em um garoto que maltratava outras crianças, estragando seus desenhos e jogando tinta ou cola nelas. Uma criança que tipicamente cresceria para virar um valentão.

            — Por que a Mariana está sozinha? — Sua mãe perguntou para a professora.

            A mulher ajeitou os óculos no rosto.

            — Ela é quem prefere ficar assim. Sempre tento coloca-la perto das outras crianças, para que interajam, mas ela prefere fazer os trabalhos sozinha e ficar sentada em um canto — explicou. — Diz que gosta de desenhar sozinha, pois não quer que as outras crianças interfiram no que ela faz.

            — Mas ela usa essa palavra, “interferir”? — Perguntou preocupada. Sempre teve consciência de que a filha era, de alguma forma, especial, mas temia que fosse demais.

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