Who's gonna save you now that I'm gone?

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Antes de ser demônio, Mingi tinha uma vida relativamente normal, com pessoas relativamente normais ao seu redor. Exceto por Yunho.

Soubera no momento em que colocou os olhos sobre o rapaz alto, de aparência simpática e fios curiosamente brilhantes apesar do tom escuro. A forma com que a pele dele brilhava sempre que a luz solar a tocava não se parecia com nada que conhecesse. O ouro, tão atrativo e bonito aos seus olhos pelas poucas vezes que tivera contato, parecia pálido para ser comparado com o brilho etéreo e fascinante que emanava de Yunho.

Mais curioso que isso era o fato de que só ele parecia notar. Todas as outras pessoas, os outros moradores da vila, passavam por ele todos os dias, cumprimentavam-lhe quando eram mais gentis, mas nunca davam indícios de que viam algo de anormal acontecer sob a pele do rapaz. Convenceu-se com pouco tempo que deveria ser alguma bênção do universo, conceder-lhe a dádiva de vê-lo verdadeiramente. Só era uma grande ironia que não houvessem lhe presenteado também com um pouco mais de coragem.

Via-o todos os dias e sempre no mesmo horário, quando saía em direção ao poço, os braços cheios de baldes e potes que enchia religiosamente e penosamente carregava de volta para casa. Ele estava sempre lá, sentado no topo do que restara do muro do vilarejo, equilibrado perigosamente entre o lado de dentro e a ponta de terreno que estendia-se até o penhasco - e o penhasco para o mar, as águas frias batendo violentamente contra as rochas, a imensidão azul se estendendo para o infinito. Olhava-o, mas não tinha o mínimo de coragem para se aproximar, o nervosismo que lhe acometia sempre que pensava na possibilidade fazendo-o baixar o rosto e esgueirar-se silenciosamente até seu objetivo, guardando sua curiosidade e seus questionamentos para uma ocasião que sequer sabia se realmente aconteceria.

Do alto dos escombros, da cicatriz aberta da última invasão, Yunho observava-o também, coisa que o Song não fazia a menor ideia. Analisava pacientemente o garoto de aparência simples, como o eram todas as pessoas da pequena vila, a altura desproporcional para a idade que tinha mero um distrator para a timidez e acanhamento que pairavam sobre ele. A figura franzina e vacilante deslizando silenciosamente entre os outros camponeses acabou por chamar sua atenção, em um desses dias monótonos de um clima denso como o mais profundo inverno.

Assistia-o subir a rua, os baldes de madeira atados a um suporte passado pelos ombros compridos, a cabeça baixa e os passos rápidos, os pés descalços o afastando graciosamente dos corpos que passavam ao seu redor, sem que esbarasse em uma única pessoa. O céu estava mais escuro naquele dia, a luz solar mais vaga do que habitualmente, pequenas flechas aparecendo aqui e ali, depois desaparecendo como se nunca houvessem tocado a face da terra. Consequência disso, sua pele brilhava mais fracamente. O calor entretanto parecia aumentar em seu peito a cada passo dado, o contato de seus dedos com o ombro alheio enviando uma corrente elétrica por seu braço.

O toque ainda que suave e gentil fez o garoto pular. Houve um barulho de algo caindo contra a água, mas a mente de Mingi mal pode processar a falha de suas mãos em derrubar o balde, seus olhos se arregalando quando um sorriso simpático surgiu nos lábios do outro. Recuou, instintivamente, as mãos agarrando a borda de pedra do poço, suas costas tocando o suporte da polia. No entanto, não conseguiu aumentar a distância entre os dois corpos.

- Não precisa tentar fugir. Eu garanto que não mordo.

Yunho fez seu melhor em fingir não notar o desespero que se apoderava do rapaz, um cantinho perverso de sua mente revirando-se em deleite quando Mingi estremeceu com sua fala tão próxima.

- E-eu... eu não... - sua frase foi cortada pelo tremor em sua voz. O fato de alguém com uma aparência tão imponente ser tão tímido divertiu-o, de modo que não conseguiu evitar uma pequena risada. O semblante de Mingi alterou-se violentamente, o acanhamento cedendo espaço a uma fagulha de irritação que o consumiu em um segundo. Não soubera reagir com a aproximação do outro, mas contra insultos de pessoas que achavam que poderiam fazer piada de si ele já estava acostumado e sabia bem como lidar.

Devil side - YungiOnde histórias criam vida. Descubra agora