Em uma pequena ilha no meio do mundo vivia um jovem sábio
Era o jovem mais sábio de toda a ilha, pois sabia ler, e por saber o que ninguém sabia havia lido os cinco livros em pergaminho que o sol (o deus criador daquela ilha) havia escrito para que soubessem viver. De todos os moradores, o jovem sábio era o único que os lera e sabia que as chuvas caiam em determinado tempo, e que o verão aparecia em outro determinado tempo e as flores nasciam e morriam em um determinado tempo.
Sabia o tempo de cada pequena coisinha e por isso era amado por todos.
No entanto certa vez uma garotinha o perguntou:ㅡ Por que não conseguimos respirar no mar e os peixes não respiram na terra? ㅡ Aquela pergunta não estava respondida nos livros. Não havia resposta e portanto, era algo inaceitável para o jovem sábio que orgulhoso de sua sabedoria construiu uma casa na montanha mais alta, e sobre ela construiu uma gigante redoma de vidro e se fechou lá dentro para que os não-sábios não o contaminassem com sua ignorância, já que o que não estava nos livros do sol, não eram verdades e muito menos ideias importantes.
Alguém certa vez perguntou o porquê da casa dentro da redoma, e o jovem sábio sorrindo orgulhoso respondeu alisando o vidro:
ㅡ Um dia eu andava pela floresta e me encontrei com o mais velho homem da ilha, notei que ele falava sozinho e sempre se esquecia do caminho de casa. Era desprovido de inteligência. Não quero envelhecer, e é por isso que estou aqui. Para continuar sábio.
Ele não queria estar rodeado pelas pessoas sem inteligência, pois como lera no livro que os carrapatos sugam o sangue inteiro de um cachorro velho até mata-lo, ele seria o cachorro se continuasse rodeado por gente. E esse foi o motivo de ter escolhido a montanha mais alta. Outra pessoa da ilha viu a casa e o chamou com uma voz apiedada:
ㅡJovem sábio, por que não vem para fora? Aí dentro deve ser solitário.
ㅡ Não, percebi que as pessoas tornam erradas as minhas palavras. Dizem que com o tempo novas verdades se formam. Eu creio que não. A verdade é uma só, e como sábio não posso permitir isso. Aqui dentro estou protegido do tempo, da velhice e principalmente dos enganos.
Muitos anos depois apareceu uma linda jovem com um flor de amor perfeito na orelha, bateu no vidro e perguntou:
ㅡ Lindo jovem sábio, não é triste estar sozinho? Deixe-me entrar e fazer-te companhia. O calor de meus braços te dará bons sonhos.
ㅡ Não, prefiro dormir ao frio do que me deixar levar pela ilusão dos sonhos.
ㅡ Não rejeite minha companhia, lindo jovem sábio.
ㅡ As companhias nos tornam tolos. Uma vez vi um casal recém-casado, eles amavam um ao outro e por isso eram tolos, não conseguiam distinguir as palavras, nem agir corretamente, eu os vi brigando por um pedaço de pão e rindo. Quem briga rindo? E é por isso que estou aqui, o amor emburre-se as pessoas.ㅡ E no livro, pensou ele, o sol disse que o amor faz seu coração bater acelerado, é uma emoção tão intensa que a pessoa chega a dar a própria vida por outra pessoa. E isso não podia acontecer, perder a sua sábia existência por uma qualquer, apenas por amor? Isso era impensável, um completo absurdo.
Passado os anos a ilha foi se enchendo de casas, gente e beleza. Enquanto o jovem sábio vivia tranquilamente em sua redoma, relendo seus livros antigos, aceitando sua sabedoria dada pelo sol. Um dia um velho de cabelos brancos e roupas finas bateu no vidro:
ㅡ Jovenzinho, por que está lendo esse velho pergaminho? Ninguém usa isso. Há milhões de livro ali do outro lado do oceano.ㅡ Porque sou um jovem sábio, e preciso guardar minha sabedoria para que ela não seja enganada pela mentira dos homens. O Sol escreveu que não devemos acreditar nas mentiras. E saiba que não há nada além do oceano, como o Sol citou em seu terceiro livro. Só há mais água e nada mais.
ㅡ Então você não é sábio. É sábio aquele que torna os outros sábios, como um professor.ㅡAquela palavra desconhecida assustou o jovem sábio, por que ele não sabia o significado, já que era o único sábio daquele ilha inteira? O ancião continuou: ㅡ E tampouco é verdade sobre não haver cidade e ilha além do oceano. Elas existem e há provas.ㅡ O jovem sábio se levantou de sua varanda. Tocou no vidro e disse desnorteado:
ㅡ Mas você é um velho, os velhos são desprovidos de inteligência. Como pode dizer isso? E livros...como pode haver milhões se apenas eu consigo lê-los?ㅡ Me ensinaram, é por isso que eu sou sábio.
ㅡ Ensinaram... ㅡMurmurrou sentindo cada letra.ㅡ Por que eu não sei de nada disso se sou o único jovem sábio dessa ilha inteira...
ㅡ Você já não é sábio, jovenzinho. Você parou de buscar as verdades no meio do caminho. Tornou-se o desprovido de inteligência enquanto os outros do lado de fora se tornaram sábios.
ㅡ Mas a verdade só é uma... e será para sempre.ㅡ Gritou enfurecido.
ㅡ Não, as verdades são inumeráveis. E é preciso persegui-las, antes de si perder.
ㅡ Eu não entendo.
ㅡ Você quis tanto guardar para si a sua sabedoria, que a perdeu de vista. Já não é sábio, é apenas um arrogante garoto dentro de uma redoma.ㅡ E então o jovem sábio notou, que o sol havia se escondido embora fosse dia. Estava escondido entre prédios e longas construções, e viu naquilo como se o sol o estivesse renegado, como se fosse verdade, ele não era um sábio. Fora um dia, no passado, já não era mais.
Com o coração dolorido e olhos carregados de lágrimas salgadas atirou uma pedra contra sua linda redoma e se desfez com ela para sempre.
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O jovem sábio (conto)
Short StoryVocê fugiu como um covarde se julgando o mais sábio dos homens. Não rirei, direi que foi um tolo. Apenas... Apenas quebre essa redoma bonita, meu jovenzinho.