Alguns dias depois... 30/04 (qui)
Meus tios conseguiram uma passagem para São Paulo no dia seguinte, como falaram. Eles ficaram aqui por mais ou menos três dias, só não ficaram mais pro conta do restaurante que estava nas mãos dos outros cozinheiros. De coração partido eles voltaram para o Rio, mas durante aqueles três dias Clara já tinha apresentado uma certa evolução no tratamento. Além do mais, Maia e Lu estão cuidando dela quando podem, as duas revezam os horários das faculdades. Exatamente por isso meus tios voltaram para casa mais de boa, pois sabiam que minha prima estava em boas mãos. Sempre que posso também passo na casa dela, que fica mais ou menos uns doze minutos à pé da minha casa. Sim, bem perto. Mas Clara ainda não tem uma renda para poder morar em apartamento, e para falar a verdade ela nem faz tanta questão. Seus pais mandam dinheiro para ela poder sobreviver por aqui enquanto não arruma algum emprego. A casa tem uns três cômodos e o valor de mais ou menos 400,00 reais mensal de aluguel, não sei ao certo.
Já faz uma semana de todo aquele ocorrido. Luciana e eu fomos pedir para os donos dos estabelecimentos próximos puxaram as imagens das câmeras de segurança daquele dia, poucos conseguiram e os que conseguiram não mostravam os rostos dos agressores. Por tanto, sairam impunes dessa. Não me conformei com a ideia de eles estarem por aí à solta, mas mesmo Clara e Luciana, que foram as que sofreram nas mãos deles, me confortaram dizendo estar tudo bem caso não encontrassemos. Mas não sei, o fato de eles poderem fazer o mesmo que fizeram com elas com outras pessoas me deixava bolado.
Romero ainda não falou sobre o que era a ligação daquele dia no hospital, até agora nada de ele me ligar ou vir aqui em casa explicar o que aconteceu. Também não estou tendo muito tempo esses dias, muitos problemas relacionados à contas, trabalho, por isso ainda nem cheguei a falar com ele depois daquele dia.
— Café, vem aqui — Maia corria por toda a casa com uma cenoura na mão afim do mesmo aparecer. — Miguel!
Olho para a cara dela como se não entendesse o sentido do repreendimento dela.
— Sai desse sofá e me ajuda a procurar ele! Ai meu Deus, será que ele pulou da sacada — sua expressão era de espanto.
— Tá doida? Aqui tem vidro e tela.
— Mas ele ainda é pequeno, pode passar por ela.
— Sem chances, doida. Ele só deve estar em baixo de algum móvel.
Seu olhar era de reprovação.
— Ok, vou olhar na sacada se lá em baixo tem algum coelho esmagado — dou risada e ela se mantém toda durona.
Caminho até a varanda e... Meu Deus! A única coisa que consigo analisar na cena é um monte de terra no chão. Estava uma verdadeira bagunça! Os vasos de planta estão todos destruídos e as plantas muito mais. Mas nada ainda do coelho.
— Onde você está, seu pestinha?
Me aproximei dos maiores vasos da varanda e de repente, sem que eu esperasse, duas orelhas aparecem e o coelho começa a dar pulinhos de dentro de um deles, afim de eu brincar com ele.
— Não acredito, seu sacana! Maia, vem aqui rapidinho. Olha o que o seu coelho fez na minha horta.
Maia apareceu na porta de vidro, olhou para a minha cara e se acabou de rir. Eu me mantinha sério olhando tudo aquilo.
— Tadinho, Miguel, ele só queria chamar a atenção da gente para brincar com ele.
— Tá de brincadeira, né? Por favor, arruma isso tudo. Estou com raiva dele por enquanto. Olha os meus tomates — aponto para os mesmos no chão, esmagados.
— Eu recompenso tudo qualquer hora. Primeiro preciso limpar ele antes que ele suje o resto da casa.
— Bom mesmo — reviro os olhos.
Eu não estava com raiva, não conseguia sentir raiva de um serzinho daquele, mas era bom a Maia saber no que ela se meteu e aprender a ter responsabilidade com o Café Cremoso. Na verdade eu estou com um pouco de raiva sim, olha os tomates como estavam bonitos...
— Por acaso o Romero conversou contigo sobre algum problema recente? — Questiono enquanto preparo algo para comer.
— Romero? Não, por quê?
— Sei lá, ele me ligou naquele dia no hospital e depois disso o cara não deu mais sinal de vida. Tô até preocupado.
— Já perguntou para os nossos tios?
— Não, acho que é coisa dele e ele não quer falar com eles.
Passaram-se algumas horas, Maia deu banho no pestinha, arrumou as plantas em seus devidos lugares — cá pra nós que não sobrou quase nada — e eu tomei um banho. Nesse exato momento minha irmã está no quarto fazendo uns trabalhos da faculdade.
— Miguel...
Olho para trás, na direção do quarto de Maia que era de onde vinha a voz. Na porta estava ela segurando...
— Ah, não, pode parar — nego com a cabeça.
Havia alguns tecidos em suas mãos, ela queria me fazer de manequim masculino mais uma vez.
— Vale nota e é pra semana que vem. Por favor, você sabe que eu vou dar essa roupa para você depois.
Ela é manipuladora, eu sei, mas mesmo assim eu cai na armadilha daquela cara de gato do Shrek que ela faz.
— Está bem, está bem — reviro os olhos.
Meu olhar passar pela maleta de maquiagem que trazia consigo.
— O que é isso? — Reviro os olhos.
— Ah, vou aproveitar e experimentar umas makes novas que eu comprei.
— Quem deixou? — Arqueio as sobrancelhas.
— Você mesmo. Vamos lá.
Já é final de tarde, pela varanda dá para ver que está anoitecendo. Nesse tempo todo Maia fez as medidas do meu corpo no tecido e agora está na metade de uma de suas maquiagens que eu sou cobaia. Não ligo para isso, não tenho masculinidade frágil, mas isso acontece todo dia, às vezes dá vontade de trancar a Maia em um quartinho. Sabe aquelas crianças pirralhas que tem energia de sobra? Então, é a minha irmã.
— Agora o batom — sinto ela deslizar o aplicador de batom nos meus lábios. Reviro os olhos outra vez.
— Ok, já dá pra tirar isso do meu rosto?
— Calma, tenho que tirar algumas fotos e guardar de recordação, ficou melhor do que em mim.
— Ah, não, sei que você vai usar isso contra mim mais tarde — tento me levantar do sofá e ela me puxa, me fazendo cair sentado de novo.
— Só uma fotinha — antes de eu pensar em alguma outra fuga eu já vejo um flash forte no meu rosto.
Pois é, divertidamentes, olha o ponto que chegamos. Fiquei algum tempo esperando a Maia tirar os tecidos e os alfinetes do meu corpo e ao tirar o último tecido a campanhia toca, automaticamente eu me levanto e vou atender. Abro a porta sem nem mesmo olhar quem era pelo olho mágico, Romero levanta o olhar que estava triste mas logo...
— Hahahahahahahaha que porra é essa no seu rosto, mano?
Fecho os olhos e respiro fundo.
— O que aconteceu? — Mudo de assunto ao ver ele carregando algumas mochilas nas mãos e nas costas. — Entra.
Maia já tinha arrumado tudo e no sofá só estava ela sentada. Até me assustei com a habilidade dela de esconder tudo de repente e tão rápido.
— E aí, Gatinha — eles fazem um toque de mão.
— De boa, Ro — pisca.
Abro a boca, surpreso com a patifaria na minha frente.
— Vamos conversar lá no quarto — dou um tapa na cabeça dele. Assim que o mesmo entrou no quarto eu voltei alguns passos e fiz sinal de "estou de olho" para Maia, que apenas riu.
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Para Sempre Desde Sempre
RomanceComo muitos jovens de vinte e três anos, Miguel e seus amigos adoram uma resenha. Bombeiro e com estabilidade financeira, ele só quer aproveitar a vida ao lado dos amigos e da namorada. Mas uma grande perda o faz ter que mudar radicalmente seu estil...