Capítulo 1 - Noite estranha

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Estou em um mundo estranho, não é como o nosso - onde tem árvores, com suas copas esverdeadas balançando a qualquer sinal de brisa, flores em campos, colorindo, deixando tudo mais vivo e polinizado ou pessoas rindo, brincando, e por um momento esquecendo que existe boletos para pagar e trabalho pra entregar, reclamando, xingando e se apaixonando. Nada do que vejo parece real, isso... isso parece um mundo pós-apocalíptico de filme, porém muito pior - estou com um canivete na mão, sinto o punhal emplasticado, minha pele esquebtando aquele punhal e eu o apertando com força, apreensiva. Sinto o gelo de uma coisa desconhecida de metal tocando o meu cóccix - eu digo que desconheço, mas na verdade eu conheço, é como se eu sempre estivesse com uma arma - minha respiração está instável, o ar parece que se juntou com alguma coisa química e começa a queimar meus pulmões a cada tentativa de puxar o ar e recuperar o fôlego. O cenário a minha frente é amedrontador, humanoides, não sei o que são mas possuem forma humana, alguns não, mas o medo que percorre em minhas veias são mais do que o suficiente pra saber que aquelas coisas, seja lá o que forem, são perigosos, o céu noturno se mistura com a vermelhidão das casas a minha frente, queimando e estalando com um fogo descontrolado enquanto a sua fumaça escura sobre para os céus da noite estrelada, levando junto para cima, algumas brasas que chegando a um momento retornam para baixo querendo queimar mais do que podiam e apagando-se assim que começavam a descer.
De onde estou sinto uma pontada de raiva ao ver as pessoas correndo de um lado para o outro, sendo seguidas por aqueles humanoides e gritando enquanto aquelas coisas praticamente caçam elas como se fossem animais. As matando, sem dó, nem piedade, se é que um dia já tiveram.

Acordo.

O suor que escorre em meu rosto, fazendo fios do meu cabelo grudarem de forma nojenta a mim, já havia passado para o meu travesseiro e a minha fronha não estava molhada somente com suor mas com minha baba também, a minha respiração pesada toma forma na vida real também, meus olhos marejados de águas de uma perda que não sei qual é, uma lágrima percorre o meu rosto, caindo em meu travesseiro molhando-o mais ainda e um sentimento de dor e tristeza toma conta do meu peito até minha mãe abrir a porta me surpreendendo.

A porta de madeira - que era de correr - poderia certamente ser quebrado com a velocidade e força em que foi puxada, o desespero de minha mãe mostra claramente que eu não estava só sonhado e virando de um lado a outro, mas eu estava gritando também. As lágrimas que eu estava a todo custo segurar desabam ao vê-la, o alívio toma conta de meu peito, ela me abraça com um instinto protetor que quase me sufoca, eu olho para o meu celular ao lado da cama brilhando no meio da escuridão mostrando com orgulho a notificação que recebi, olho para a hora, meia noite e meia, tinha dormido apenas 45 minutos.

Minha mãe me solta e seu perfume que antes invadia minhas narinas, me confortando, se esvaiu assim que ela saiu de meus braços, seus olhos de uns castanho meio esverdeados me fitam de uma forma que me deixa calma, mas ao mesmo tempo com medo

- foi só um pesadelo filha, tá tudo bem, não se preocupe - ela fala com uma voz aconchegante e calma, quase como se fosse por um bebe pra dormir, e assim eu me acalmo, ela olha para meu travesseiro e o vira acaricia meu cabelo e com o calor que sinto me levanto da cama, e procuro alguma outra roupa para poder usar depois do banho.

- vou pro banho mãe.

- você tá melhor filha, não quer tomar uma água ou coisa assim? - volto-me para ela, seu olhos carinhosos tomam conta de seu rosto, minha vontade era de abraçar ela e a segurar com forma, era estranho como que aqueles sentimentos me fizeram sentir falta dela de uma maneira descomunal.

- eu só vou tomar um banho, to toda suada - falei me levantando da cama. Voltei-me para ela num silencioso pedido de me deixar sozinha para me arrumar (não gostava que me vissem pelada, nem minha própria mãe) ela entendeu na hora e com um sorriso sem vontade ela se levantou de minha cama a qual fez um barulho de mola rangendo e saiu pela porta de madeira.

Após meu banho eu saio do box enrolada em uma toalha branca e me olho no espelho, minha imagem sem maquiagem mostra meus cravos e espinha que eu tenho, presente especial da puberdade onde hoje eu estou menstruada, graças a Deus é o ultimo dia, porém do nada noto algo estranho em meu rosto, pequeno demais para se ver de longe, mas notável para quem conhece a própria face, minha sobrancelha estava sangrando, não era muito, mas eu senti que ardeu quando fui lavar esse local na hora do banho, pego um papel higiênico e limpo o local a ardência mínima não é o suficiente para eu contorcer meu rosto, volto para o espelho e dessa vez me aproximo, um corte pequeno bem na área onde minha sobrancelha falha, no momento imaginei que eu tivesse me cortado no sonho, afinal, tenho unhas capazes disso e que precisava de uma repaginada. Ignorei o corte que apareceu do nada e fui para o meu quarto. O espelho do banheiro pega apenas meu rosto mas o do meu armário no meu quarto pega meu corpo todo e foi ai que eu vi, marcas de roxo na minha coxa direita e do lado, pequenos hematomas em meu estômago e uma marca bem estranha em minhas costas e em meus braços, pareciam marcas de chicotadas. O pior? Doíam. Parecia que eu estava recebendo elas no momento, minhas costas estavam machucadas, mas não sangravam.

Tudo aquilo era demais, o sonho, que mais parecia um pesadelo de outro mundo e todas aquelas marcas e hematomas em meu corpo, eram simplesmente demais para lidar, me davam ânsia, no mesmo momento eu me arrumei ignorei a minha imagem para não vomitar e fui dormir, quem saiba o dia seria melhor amanhã? Afinal era sexta-feira.

O dia pode melhorar...

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