Eve tinha deixado a porta do apartamento aberta.
O primeiro motivo era que ela sabia que Villanelle entraria de qualquer forma se quisesse, assim como fizera mais cedo, quando deixara o urso com a gravação em cima da cama. O segundo era que ela não queria realmente levantar da cama.
A excitação e a adrenalina iniciais tinham dado lugar aos seus pensamentos racionais durante toda a tarde no trabalho, e Eve sabia que deixar Villanelle entrar seria como tragar um cigarro depois de muito tempo sem fazê-lo. Ela o colocaria na boca com delicadeza, como se nunca tivesse experimentado, então tragaria até sentir a nicotina preenchendo seus pulmões, e acabaria engasgando com a fumaça e tossiria com força para tentar tirá-la do organismo. No fim, tragaria outra vez, cada vez mais familiarizada com o gosto, e terminaria o cigarro sem delongas.
E então viria outro, e um maço, e logo estaria desesperada para sair para comprar mais cigarros, como se precisasse deles para sobreviver (o que não era verdade).
Villanelle era tão instigante quanto aquele cigarro que Eve sonhava em tragar, mas que sabia que lhe traria consequências desastrosas.
A campainha tocou, mas Eve não se levantou da posição sentada com as pernas cruzadas para atender, tampouco a mandou entrar. Parte de si esperava realmente que a loura acabasse desistindo e fosse embora, deixando-a sozinha com seus pensamentos inoportunos. Porém a parte racional dela também sabia que Villanelle não desistia das coisas: ela as superava.
Não parecia ser o caso.
− Eve? – A voz dela veio da cozinha, suave e mansa, buscando território. A morena deixou escapar um suspiro, recostando-se contra a cabeceira da cama. Na mesa ao lado havia um vinho branco pela metade, um livro com marca-página e um canivete aberto, porque ela tinha perdido o abridor e não tivera tempo para comprar outro. Além disso, a lâmina curta lhe dava uma falsa sensação de segurança.
– Você não devia deixar a porta destrancada. Nunca se sabe quando há uma assassina nas redondezas. – Villanelle parou na porta do quarto, uma das mãos segurando um champagne e a outra no bolso. Usava um conjunto simples de ginástica, a calça de moletom e uma blusa vermelha com capuz, e esse era o look mais casual que Eve já a vira usar, de longe. Ainda assim, as roupas pareciam absurdamente caras, e combinavam estranhamente com o batom que ela usava.
De fato, Villanelle era a pessoa mais peculiar que Eve já conhecera na vida.
− Que bom que eu estava preparada. – A morena comentou, fazendo a outra erguer as sobrancelhas em descrença. Ela se aproximou e seu olhar caiu na garrafa de vinho pela metade, e então no canivete. Abriu um sorriso de canto.
− Você devia saber melhor, Eve. – Villanelle balançou a cabeça, depositando o champagne na mesa e girando o canivete entre os dedos. – Eu vim para comemorar o nosso primeiro beijo. E o segundo. Achei que a mensagem gravada seria suficiente, mas obviamente me enganei. –
O sorriso presunçoso estava de volta aos lábios da loura, e Eve sentiu seu estômago se retorcer com duas sensações distintas: ela tanto amava quanto odiava aquele sorriso. Seus dedos apertaram a barriga do bicho de pelúcia, e a voz de Villanelle soou tanto no aparelho quanto pessoalmente.
− Admita, Eve. Você queria que eu estivesse aqui. – A loura estendeu a mão livre e afastou uma mecha cacheada do rosto da morena, fechando a mão em concha ao redor da bochecha dela, gesto que já tinha se tornado quase um mantra entre elas. Eve fechou os olhos, como se temesse que Villanelle fosse acertar-lhe com o canivete de maneira traiçoeira, como a própria Eve tinha feito antes, na cama dela.
Mas o golpe nunca veio.
− E então? Está pronta para admitir? – O sotaque carregado dela soou na semiescuridão como o sussurro de um amante, e Eve virou o rosto de encontro com a mão dela.
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Strange Effect
FanfictionPorque continuamos nos apaixonando por vilões? Eve sabia que deixar Villanelle entrar seria como tragar um cigarro depois de muito tempo sem fazê-lo. Ela o colocaria na boca com delicadeza, como se nunca tivesse experimentado, então tragaria até sen...