Capítulo Único

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Sendo bem sincero, em um dos raros momentos em que permitiria tal honestidade – se é que esses momentos existiam –, Oikawa não teria escolha a não ser admitir que toda aquela rivalidade não fazia sentido. Mas não era como se ele pudesse evitar.

Não era também como se ela fosse o maior de seus problemas, ele apenas não conseguia ignorar. Se colocassem o primo e seu melhor amigo ao lado dela, seus instintos se focariam nas duas figuras masculinas, não na garota, mas, na ausência de alguém pior, toda sua energia hostil seria concentrada em Katsumi.

Talvez fosse o nome da família que ele aprendera a fazer cara de desgosto por causa do primo, talvez fosse o nome da escola que ela frequentara que sempre fora o obstáculo final entre seus objetivos que ele nunca foi capaz de superar. Talvez fosse algo puramente mesquinho por jogarem na mesma posição. Talvez fosse uma combinação infeliz de todos os elementos. Ou apenas algo essencial na garota que o impedia de ser um ser civilizado.

Gênios o tiravam do sério.

Pessoas naturalmente talentosas, que apenas precisavam de um mínimo esforço para realizar algo com perfeição, enquanto outros, como o próprio Oikawa, precisavam tornar do treino um hábito, uma segunda natureza, para alcançar alguma coisa. Gênios o tiravam do sério, principalmente aqueles que diziam não ser. Principalmente Katsumi, por ela passar a maior parte de seu dia no ginásio, como se precisasse daquilo.

Na maior parte do tempo, parecia injusto. Se Oikawa chegava mais cedo para treinar algo sozinho, esbarrava com Katsumi no caminho para os ginásios do campus, ela tendo planejado também adiantar seus treinos. Se ele ficava depois do horário, caminhavam juntos até o ponto de ônibus, já que ela também encerrara o dia por volta do mesmo horário que ele. Se a questionasse – o que Oikawa nunca faria, já que iria requerer um nível absurdo de sinceridade e ele definitivamente não teria como lidar com o sorriso debochado que Katsumi provavelmente esboçaria –, ela diria que não podia se dar ao luxo de relaxar a rotina de treino. Muitas pessoas aguardavam ansiosamente o momento que ela cometa um deslize, a postos para tomar o lugar que ela lutava tanto para manter.

- É um banquete de monstros – disse ela com um sorriso fácil, um brilho diferente no olhar de quem disse o segredo do universo e sabe que não vai ser entendido com facilidade. Logo ela explicou que aquela fala não era sua, que o capitão de outro time tinha dito algo naquele estilo em um dos muitos campeonatos que participara – Melhor continuarmos sendo os que devoram, não os que são servidos, não acha?

Aquela conversa não fora com ele, nunca poderia ter sido. Oikawa não se recordava de fato, talvez ela estivesse conversando com as veteranas de seu time, ou com seu amigo de infância nas muitas vezes que os times feminino e masculino realizavam treinos juntos. Ele não participara daquela conversa, mas de alguma forma ela chegara aos seus ouvidos, e sua mente repetia aquelas palavras todas as vezes que ele se perdia na presença da garota e esquecia que não pertenciam ao mesmo tipo de pessoa.

Embora treinassem com a mesma frequência de tempo, com a mesma intensidade, tivessem rotinas e hábitos ridiculamente parecidos, Oikawa sempre fora quem era servido. Sua postura podia ser de monstro à mesa, mas ele nunca conseguira um lugar designado a si, por mais que lutasse com unhas e dentes. Seu lugar à mesa sempre fora na sala dos simples mortais, ali ele apresentava algum perigo. Talvez se portando como monstro, sendo erroneamente identificado como um por pessoas comuns, ele se tornaria um.

Só que as coisas não funcionavam daquele jeito.

- Kageyama, está de brincadeira? – resmungou o professor de literatura, assim que o ruído alto do celular da garota vibrando sobre a carteira atraiu sua atenção mais uma vez. No susto, Katsumi apenas desligara o aparelho, abaixando a cabeça enquanto fazia seu pedido de desculpas.

The ArcherOnde histórias criam vida. Descubra agora