Haviam transcorrido duas semanas desde o último grande desentendimento com Simão. E, por esse motivo, especialmente hoje, Ângela — ciente do fato e atenta à linguagem corporal de Leila — estava mais para dar conselhos, do que reclamar do relacionamento no seu trabalho, como tinha por hábito. Na verdade, ela estava um pouco preocupada com a amiga. A coisa parecia ter sido mais séria dessa vez.
— Leila, querida, o que aconteceu agora? Você estava bem no almoço — pergunta olhando para o rosto dela, enquanto repousa a xícara no aparador.
— Ai, amiga, eu não sei — voltando-se para encarar Ângela. — Eu estou bem. Mas, as coisas mudam quando a gente cresce, viu? Eu achei que seríamos amigos para sempre, mas daí você vai percebendo umas coisas e acaba se dando conta de que a vida é diferente.
Ambas encaram o vidro meio que à procura do que dizer a seguir. Leila toma um pouco do café e dispara:
— Meu Deus, que café ruim. Eca! — E faz uma careta.
Ângela ameaça um sorriso, limpa a garganta, e diz:
— Olha, sem querer me intrometer, sabe? Mas acho que tem muita coisa envolvida nessa história aí. A gente sempre fala das discussões de vocês e eu, sinceramente, não vejo motivo para elas — apoia-se no parapeito e conclui: — Não sei até onde ele te vê de fato como amiga, sabia? Desculpa a franqueza.
Leila, num giro brusco de corpo, a encara e se exaspera:
— Que isso, sua doida?! Ele é bonito e tal, mas quase um irmão para mim. Crescemos juntos.
— Querida, acorda, né? Todo mundo nesse piso tem uma quedinha por você. Amigo ou não, os caras são assim. Eu, hein? Tá com baixa autoestima agora?
Leila balança a cabeça em sinal de negação e franze as sobrancelhas para o questionamento que ouvira. Mas, o assunto era outro. Ela tinha certeza. Acontecia apenas de Ângela não saber o motivo da briga e por isso tinha esses delírios. Então resolve colocá-la a par das coisas, antes que terminasse o intervalo:
— Vou te contar em detalhes, daí você para de falar baboseiras. — Repousa a xícara no interior da pia.
Ângela, com uma das mãos na cintura, revira os olhos e diz:
— Sei. Vai lá.
— É sério, poxa vida — Leila retruca, enquanto confere o entorno para ver alguém às ouviria. Ninguém à vista no corredor, então ela prossegue: — Lembra quando Simão namorava a Manuela? Aquela que trabalhava no shopping e morria de ciúmes de mim?
Sem dizer nada, Ângela concorda com a cabeça e ela continua:
— Foi depois dela que a coisa ficou assim, o Simão foi ficando cada vez mais chato. Cheio de restrições. Primeiro ele não saía mais com a gente, ficou todo estranho comigo. Quando perguntei depois, me disse apenas que a Manuela não acreditava em amizade entre homem e mulher. Acredita?
— Ai, amiga. Às vezes acho você muito radical, sabia? Desculpa falar assim, viu?! Mas é verdade. Isso é coisa do casal, você não tem que se meter.
— Que exagero, Ângela, eu e o Simão crescemos na mesma rua, não quero que ele vire um babaca entende? É só isso.
— Até entendo, mas deixa o cara. Se ele quer ser um escroto, que seja, ué? Fazer o quê? Tem tanto homem escroto por aí, mais um não vai fazer diferença.
Ambas silenciaram e olharam novamente a paisagem. O sol da tarde já fazia alongar as sombras dos edifícios sobre o bairro vizinho, desenhando a silhueta urbana sobre as casas lá embaixo. E, acima delas, uma revoada de andorinhas ziguezagueava cortando o vento. Pareciam regozijar-se do espaço aberto daquele local e o ar fresco que vinha com o entardecer.
— É por isso que eu gosto de vir aqui — acrescenta Leila, olhando os pássaros. Depois conclui: — Elas fazem isso quase todos os dias. É muito lindo.
— Meu chefe já deve estar subindo, olha as horas?! — comentou Ângela, perguntando em seguida: — Mas antes da gente ir, por que mesmo que vocês discutiram dessa vez?
— Então, foi por causa do Facebook.
— Ah, não acredito, Leila.
Ângela observa o relógio, toma a amiga pelo braço e faz sinal para irem caminhando, enquanto aguarda uma explicação.
— Foi porque ele compartilhou uma postagem idiota lá, de um comediante que falou umas merdas sobre a Vanessa Camargo, sabe? Daí eu fiquei puta com isso.
— Ah, jura que foi por isso? — solta o braço de Leila e vai em direção à própria sala. Antes de fechar a porta, diz: — Fofa. Você está precisando relaxar um pouco. Vamos marcar um drink qualquer dia desses, hein? Bom trabalho, querida. — E arremessa um beijo com a mão direita.
Retornando para a sua mesa, Leila, encara os papéis, confere o relógio, toma um gole de água e começa a examiná-los.
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Olá, leitor(a)!
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Proteja-me do que eu quero
RomanceSimão desperta certo dia pela manhã e sente-se mudado, mas não sabe exatamente o que se passa. Muito menos desconfia que esse é apenas o início de uma série de acontecimentos inexplicáveis. Ainda estavam por vir as repentinas oscilações de humor, a...