O silêncio nos ganha por longos minutos, deixando apenas o som da chuva que se desfaz do lado de fora presente, enquanto nós continuamos a beber o rum que já está na metade da garrafa. O refrigerante acabou, então só nos restou ingeri-lo puro, e acredito que já estou bêbado ao ponto de engolir a bebida sabor de fogo como se fosse água. Sinto meu corpo ficar cada vez mais alcoolizado e minha mente cada vez mais distante do mundo, além do gosto de nostalgia; fazia muito tempo que eu não me dava ao luxo de beber assim. No máximo uma ou duas taças de vinho ou champagne em um encontro ou evento, mas nada mais que isso.
Gosto dessa liberdade, mesmo sabendo que é uma ideia terrível.
— Ei — Maia diz de repente. — O que acha de fazermos uma brincadeira pra passar o tempo? — ela me encara o perguntar, e seus olhos brilham devido ao nível de álcool no seu corpo. Noto que é uma Maia completamente diferente da que conheci no elevador e lidei por todas essas horas; a Maia bêbada é mais sociável e solta, enquanto a sóbria é reservada e fechada.
Gosto mais da bêbada, sem dúvidas.
— Que brincadeira? — pergunto, achando graça. — Você não me parece uma advogada, está mais pra uma universitária. Não faço essas brincadeiras desde o ensino médio, talvez faculdade... faz muito tempo.
— Me formei há quatro anos. Te garanto que não sou uma universitária, doutor — Maia retruca a provocação, e vira-se para me olhar. Suas pálpebras estão um pouco baixas e a cor da sua pele parece mais viva que antes. — A brincadeira é assim: você fala algo sobre você que eu não sei, e eu faço o mesmo.
— Existem tantas coisas sobre mim que você não sabe — digo, encarando-a de volta e respiro fundo ao dizer: — Hum... Meu prato favorito é X-Bacon.
— Que saudável, doutor — Maia zomba, rindo. — Minha banda favorita é Queen. Sou secretamente apaixonada pelo Fred, é por isso que nunca tive relacionamentos na minha vida.
Não consigo prender a risada. Essa mulher é uma graça.
— Meu primeiro beijo foi em uma rodada de verdade ou desafio no segundo ano do ensino médio. — Confesso, e ambos rimos disso. Não acredito que falei algo do tipo, pois essa é uma informação que ninguém na minha vida sabe (apenas as pessoas presentes no momento, que fazem parte do meu passado), agora Maia tem essa ciência.
— Hum... Meu primeiro beijo foi por causa de uma aposta com minha amiga. — Maia conta com um sorriso nostálgico estampado nos lábios. — Ela duvidou que eu teria coragem de beijar o cara mais popular da escola na frente de todo o colégio, e foi bem constrangedor. Foi ruim e ele passou a me odiar depois disso — ela gargalha alto, e eu me aproximo com rapidez, cobrindo sua boca com a mão para abafar o som.
Sinto meu corpo se aquecer com a aproximação, e seus olhos focam-se contra os meus, preenchidos de milhares de sentimentos. Sinto minha boca secar.
Tiro minha mão de sua e acaricio de leve sua bochecha como resposta ao "desculpe" dela, mas não consigo me importar com isso, não quando a pele dos meus dedos roça os lábios quentes dela. Minha respiração fica mais pesada que antes e preciso me controlar muito para não a beijar.
Álcool foi uma péssima ideia.
— Eu... — pigarreio, mexendo meus ombros com cuidado para não machucar mais o acidentado. — Eu era apaixonado pela minha professora da faculdade. Foi meu primeiro amor da toda a minha vida, algo que não aconteceu nem no colégio.
— Se declarou pra ela? — Maia pergunta, eu nego com a cabeça. Então, ela questiona: — Se beijaram ou transaram?
— Uma vez, na minha noite de formatura — respondo, respirando fundo por ter que falar sobre isso. Não gosto e me deixa desconfortável, por isso digo: — Sua vez.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Código Prateado [COMPLETO]
Historia CortaTheodore Kang é um renomado neurocirurgião do Oswaldo Cruz, o melhor hospital da grande São Paulo, que se encontra em código o prateado. Após fracassar em mais uma cirurgia, Theo vê-se em um apagão no fim de seu turno e no meio disso conhece Maia, a...