Capítulo 1

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Lyra 

Minha cela era fria, úmida e parecia coberta de lodo. Eu vivia naquele lugar há quanto tempo? Eu já não tinha mais ideia de quantos anos eu estava ali, não fazia ideia de quantos aniversários passara ali. Mas, eu conseguia me lembrar... eu tinha gravado em minha memória exatamente o dia em que cheguei nesse maldito lugar. Lembro-me de minha mãe e eu trabalhando juntas na cozinha de casa, quando as sentinelas quebraram a porta e janelas. Nós gritamos diante do barulho ensurdecedor. Eles continuaram a invadir nossa casa, morávamos somente nós duas, somente eu e ela há muito tempo, desde quando ela me recebeu em sua casa e me adotou e criou. Nosso desespero parecia combustível para a loucura e ódio que sentiam. Eles destruíram nossa pequena casa. 

Como se não fosse o bastante eu fui obrigada a assistir um deles tirar a vida de minha mãe. Dois me prendiam com força, enquanto outros dois destruíram a casa e somente um deles, o mais forte, tirava a vida de minha mãe diante de mim. Só quando seu corpo caiu em meio ao seu sangue no chão, foi quando parei de me debater. Aquela força que havia em mim se extinguiu e eu então parecia um peso envolto por desespero e tristeza e ódio. Eu chorava e gritava. Enquanto as sentinelas gargalhavam diante do meu desespero. 

Eu os encarei e gravei cada rosto. 

Passaria mil anos e eu lembraria de cada um deles. 

Foi então que eles me agarraram, colocaram um saco em minha cabeça e me levaram embora. Deixando para trás uma casa destruída e o corpo da mulher que me deu todo o seu amor. Não lembro do que aconteceu depois. Quando acordei, eu já estava em uma cela escura, iluminada somente por algumas tochas. De repente notei uma figura observando por uma pequena janela na madeira da porta. Eu reconheci aquele rosto. Reconheci aquela voz. O Grão-Senhor da Corte Outonal.

Lembro de seus olhos me encarando.

Aquele olhar gélido. 

Lembro de sua voz severa e cheia de ódio quando dizia:

Seu lugar é aqui, em meio a ruínas...apenas agradeça por ter lhe poupado a vida.

Eu berrava, berrava para sair e implorava para saber o porquê. 

Por que me levaram para aquele lugar? 

Nunca obtive resposta.

Acompanhava o alvorecer e o anoitecer pela pequena janela no canto mais alto das paredes. Eu saia da cela somente para tomar banho, onde as sentinelas me escoltavam e esperavam do lado de fora até que eu acabasse. Alguns eu reconhecia só a voz..., mas daqueles que entravam em minha cela com os alimentos, eu conseguia me lembrar de cada traço. 

Desgraçados. 

Desgraçado também aquele que ordenou que me prendessem aqui. 

Um som soou do outro lado da porta. 

Ele me causou náuseas. 

Meu corpo ficou tenso... eu sabia o que era e sabia quem era. 

- Coma isto! – Ordenou o vigia da cela depois de colocar a bandeja com comida no chão em minha frente. 

- Como depois – rebati depressa. 

Minha resposta despertou a ira do macho. Ele agarrou meu braço com muita força. Gemi de dor diante a brutalidade. Ele me arrancou da cama a força e me jogou no chão diante ao prato. 

- MANDEI COMER AGORA – urrou. 

Eu fuzilei ele com os olhos. 

Meu estômago reclamou na hora. 

Eu estava prestes a vomitar o que ainda nem tinha em meu estômago. Então eu o encarei de novo e tomei a decisão que talvez poderia colocar um fim a minha vida. 

Cuspi aos seus pés. 

Ele então retribuiu com um sorriso maldoso. Agarrou meus cabelos e os puxou para cima. A força era tamanha que fez com que eu me levantasse. Quando ainda me equilibrava ele prensou aquele corpo pesado em mim. Eu estava presa entre aquele corpo horrível e a parede. 

- Acordou de mau-humor hoje?

Eu me debati. 

- Me solta – ordenei. 

Quanto mais me debatia...mas o seu corpo me apertava diante a parede. 

- Se não quer comer...- suas mãos seguravam meus punhos com força – então, podemos conversar sobre outras coisas...

Eles não me tocavam, não dessa forma. Eles eram proibidos de tal coisa.

O toque da pele áspera e fria dele contra a minha, foi o suficiente para liberar todo o ódio existente em meu corpo. Eu respirei fundo e falei com a voz mais fria que consegui. 

- Eu prefiro que rasgue a minha pele e me deixe sangrar até a morte. 

Então me debati com tanta força que o macho perdeu o equilíbrio, eu aproveitei o empurrei para longe de mim com tanta força que fiz com que caísse no chão. 

Antes de se levantar ele me encarou com ódio e eu consegui pensar em várias formas de punição. Quando já estava de pé ele apenas sorriu e limpou as roupas. 

- Estou sem paciência para seus joguinhos hoje.

E saiu.

Não sem antes pisar em meu prato de comida. 

Me joguei na cama e abracei meus joelhos. 

E chorei. 

Chorei de raiva e de medo. Chorei de tristeza. Chorei de saudade da minha antiga vida. Eu não era essa pessoa sem brilho e sem vida...eu era amável, era feliz, doce e divertida. Eu sonhava e desejava. Eu amava...

- Há algo melhor para você lá fora, Lyra... – falei a mim mesma - há algo melhor...eu sei...eu acredito...acredito.

Dormi com a saudade do que eu era no passado e sonhei com o dia em que voltaria a ser essa mesma pessoa. 

Parte de mim tinha perdido as esperanças. 

Mas a outra ainda acreditava que eu um dia poderia voltar a ser tudo o que amava ser.

E foi a essa parte que eu escolhi me agarrar. 




Escrito por Julia.

Espero que tenham gostado...

Até a próxima, beijos ❤ 

Corte de Sombras e EstrelasOnde histórias criam vida. Descubra agora