Os fios loiros e despenteados se espalharam pelo encosto do banco quando Jimin jogou a cabeça para trás com o intuito de rir, no limite do que a ressaca lhe permitia, da presente situação. Estavam mal e porcamente estacionados no acostamento, metade do corpo de Jungkook se pendurava pela porta do passageiro em direção ao lado de fora do carro, enquanto, da maneira que podia, se equilibrava para jorrar todo resquício de álcool da noite anterior no asfalto e não em suas próprias vestimentas.
— Você é um cuzão por achar graça do seu melhor amigo nesse estado, acabei de vomitar todo meu suco gástrico, esse é claramente meu leito de morte — Jungkook dramatizou, se aconchegando novamente no banco de couro. Seu corpo doía, sua cabeça pesava e a noite passada era apenas um borrão de luzes coloridas, jogatina e um urso polar. — Cara, parece que cagaram dentro da minha boca.
— Às vezes me pergunto como eu fui acabar amarrado com você — Jimin diz, entortando o nariz com a última colocação de Jungkook. Contudo, apesar da comparação demasiadamente nojenta do mais novo, não podia deixar de concordar, o gosto amargo e a saliva espessa ocasionados pelo excesso de álcool estavam lhe deixando ainda mais enjoado.
— Isso é porque você não resiste ao meu charme.
— É. Irresistível. — Jimin aponta para camiseta suja de vômito do amigo, que rola os olhos e lhe manda o dedo do meio, para logo em seguida caírem ambos na risada. — No porta-luvas tem um chiclete pra gente, aproveita e pega o mapa também, precisamos descobrir o caminho de volta pra casa.
Estavam parados no meio da rodovia, seus celulares completamente sem bateria e os carregadores perdidos em algum lugar nas malas na parte traseira do veículo. Tiveram que juntar seus pertences e montá-las em tempo recorde, já que acordaram parcialmente nus e bêbados, com uma batida absurdamente alta na porta de madeira, dez minutos antes do check out do hotel.
Desde que Park Jimin e Jeon Jungkook se conheceram, há 15 anos, quando ambos eram pré adolescentes de treze e onze anos, respectivamente, cultivaram o sonho de um dia, somente os dois e a trilha sonora de AC/DC, viajarem à Las Vegas para viverem tudo aquilo que Medo e Delírio lhes prometera. Sem todas as drogas e armas, é claro.
Quando eram apenas crianças viciadas em um filme de 1998 gravado em fita cassete, não imaginavam que precisariam de tempo, dinheiro e saúde para fazerem uma viagem dessa magnitude. Mais um item para a lista de coisas que o capitalismo fodeu, a simplicidade da infância.
Os dois jovens de São Francisco, Califórnia, demoraram mais de uma década para conseguirem colocar o plano em prática, isso porque foi necessário já estarem formados, já que como universitários não conseguiriam pagar nem a gasolina do percurso. Jimin trabalhando em uma companhia de moda, achou seu primeiro cabelo branco aos 25, Jungkook aproveitando todos os anos estudando design, se tornou um dos maiores tatuadores da escola tradicionalista.
Com tudo isso, depois de muito planejamento e replanejamento, de noites de pesquisa sobre as rotas que percorreriam e os cassinos que visitariam, ainda não tinham data definida, apenas o desejo sempre vivo de ouvirem as vozes de Bon Scott e Brian Johnson estourando nos auto falantes da CRV marrom do Jimin por horas a fio. Até que Jungkook, irritado o suficiente, usou a chave reserva do apartamento de Jimin, que lhe fora dada única e exclusivamente para emergências, arrumou as malas do amigo e lhe esperou sentado no estofado macio em uma sexta-feira à noite.
Park, não orgulhosamente, quase sujou as calças quando chegou em casa, na escuridão das 23h, e o mais novo ligou o abajur da sala. Estava sentado na poltrona, no meio do cômodo, de pernas cruzadas e com a sobrancelha esquerda arqueada. Sempre com uma dramaticidade única.
"Isso são horas, Park Jimin?"
"Isso é invasão de domicílio, Jeon Jungkook?"
"Tanto faz, me processa quando a gente voltar de vegas. É! Isso aí. Uhu! Vegas, baby!"
"Você enlouqueceu de vez?"
"Qual é, Jimin! Até quando vamos ficar planejando? Sempre tem uma merda, nossas agendas que não batem ou a gente tá quebrado ou a gente tá cansado demais. Sempre um empecilho, então vamos assim, sem pensar. Daqui a pouco a gente já tem trintão, cara. Por favor. Faz tanto tempo que não curtimos juntos, só eu e você... Poxa, chaveirinho..."
Com um suspiro, Jimin diz "chaveirinho teu cu", e é assim, com esse diálogo, que uma semana depois, com a mala devidamente feita, pois a montada por Jungkook tinha apenas cuecas, os dois caíram na estrada, preparados para mais de oito horas de viagem. O caminho de Califórnia para Nevada não era tão difícil, agora, fazendo o trajeto no sentido contrário, Jimin se lembrava que deveria seguir para sempre e mais um pouco na rota 95, mas, no dado momento, não tinha ideia em que parte do caminho estava.
— Você vai me dar o mapa ou vai ficar brigando com a embalagem do chiclete até amanhã, cabeção? — Jimin questiona quando Jungkook tenta, ainda meio grogue, achar as pontas da embalagem. Ele não pode simplesmente rasgar o papel, é cheio de mania esquisita.
— Você sabe que eu odeio esse apelido — Jungkook joga o pedaço de papel que achou no porta-luvas no motorista.
— Você precisa aceitar seu cabeção, aceitação é importante, amor próprio, porra!
Jungkook revira os olhos pela milésima vez no dia e fala bravo, com as bochechas avermelhadas — Quer ver um cabeção de verdade? Posso te mostrar o do meu pau.
— Eu já vi seu pau — Jimin gargalha enquanto abre o papel que Jungkook jogou em seu colo anteriormente — quer dizer, pintinho.
— Eu tinha 13 anos, Jimin-ssi! Estava frio, era inverno! Você não pode continuar usando isso contra mim!
O mais velho tentava manter a pose, mas era impossível não cair na risada quando o moreno enchia os pulmões de ar para iniciar um monólogo sobre o próprio pau. Jimin sabia bem que aquele assunto sempre deixava Jungkook bravo, mas era inevitável irritá-lo. Ele ficava fofo para um caralho assim.
— Pois saiba que, atualmente, o comprimento e diâmetro do meu pênis são completamente satisfatórios.
— Tá bom, senhor penis-satisfatório. Agora me passa o mapa.
— Eu acabei de te passar — Jeon aponta, confuso.
— Isso não é o mapa, é uma certidão de casamento.
Jungkook solta um "ah..." baixinho e logo em seguida se inclina ao porta-luvas novamente, em busca do bendito mapa. Remexia em tudo e não encontrava o tal pedaço de papel que lhes guiaria para casa. Até que algo lhe chamou atenção.
— Hyung? — Questionou, sem ouvir a resposta enquanto ainda atirava de lá para cá os pertences dentro do compartimento — Por que tem uma certidão de casamento dentro do seu carro?
Esperou e nada veio. Estranhou o silêncio de Jimin, e quando olhou achou ainda mais esquisito. A cor tinha sumido do rosto do mais velho, os olhos estavam tão abertos que Jungkook ficou preocupado com a possibilidade de que eles lhe caíssem da cara. Encarava o documento em sua mão de maneira tão fixa e atordoada que Jeon não se surpreenderia se o papel começasse a pegar fogo literalmente do nada. Sabia que tinha algo errado, sabia que não queria saber o que era. Mesmo assim, perguntou.
— Jimin? O que aconteceu?
— E-eu... Você... O que...
O loiro apenas balbuciava palavras desconexas, então, num súbito de coragem Jeon retirou aquela folha amaldiçoada das mãos do amigo. Nada poderia ser tão ruim assim, era só um pedaço de papel! No entanto, tão logo tinha o diabo em sulfite em suas mãos, se arrependeu. Poderia nunca ter visto, poderia apenas ter jogado pela janela e fingido que nunca aconteceu. Poderia, mas não foi o que fez.
Jeon Jungkook sentia que o mundo estava parado enquanto ele estava plantando bananeira e girando em volta do sol. Somente duas palavras ficaram gravadas na cabeça dele, palavras essa que lhe perseguiriam para o resto da vida.
— PARK JUNGKOOK?!
E então, novamente naquele dia, Jungkook vomitou, mas dessa vez não deu tempo de abrir a porta do carro.
VOCÊ ESTÁ LENDO
HIGHWAY TO HELL | pjm + jjk
FanfictionDesde quando eram apenas crianças viciadas em um filme de 1998 gravado em fita cassete, os melhores amigos Park Jimin e Jeon Jungkook cultivaram o sonho de viajar à Las Vegas, acompanhados apenas pela trilha sonora de AC/DC. Lá, iriam viver noites i...