Prólogo

33 15 15
                                    

Anne andou para fora do ginásio a passos lentos, abraçando a si mesma  numa tentativa frustrada de resistir ao frio daquela noite. Estava  cansada de esperar por ele lá dentro, apenas observando enquanto todos  se divertem. Já havia se passado duas horas. O que poderia causar  tamanho atraso? Isso não fazia parte do perfil dele. Alguma coisa tinha acontecido.

Havia uma fina camada de neve cobrindo o chão.  Já havia parado de nevar, mas aquele com certeza não tinha sido o  melhor dia para escolher um vestido tomara-que-caia. O ar estava gélido, o vento causava arrepios em sua espinha e seu corpo todo. Pelo menos a  saia longa cobria suas pernas, apesar do salto do sapato machucar seus  pés.

Ela já estava longe do ginásio, das pessoas dançando, dos  casais se agarrando e da música alta. Mas, apesar de tudo isso, aquela  não parecia ser uma noite tão ruim. Fazia anos que ela não via um céu  tão estrelado. E, ao notar isso, apoiou-se contra uma árvore e começou a  brincar de contar as estrelas. Já estava cansada de saber que uma  simples vida humana nunca duraria o tempo necessário para contar todas  as estrelas no céu, mas não se importava. Amava-as o suficiente para  poder apreciar aquele momento, e a lua cheia dava o toque de perfeição  final ao retrato do infinito diante de seus olhos. De que mais  precisaria, agora que estava ali? Já não importava mais se ela estava  sozinha, se tinha sido abandonada na noite do baile. As estrelas podiam  confortá-la mais que qualquer outra coisa no mundo.

De repente,  Anne ouviu o som de passos abafados sobre a neve. Alguém estava se  aproximando, talvez algum colega de turma. E provavelmente ninguém que  valesse o seu tempo. Provavelmente era apenas um casal procurando por  privacidade, então por que desperdiçaria sua atenção com eles, se as  estrelas eram tão deslumbrantes?

Mas por que será que ele a tinha  deixado logo naquela noite? Durante todos os anos de colegial, seu  maior desejo fora sair com ela, embora nunca tivesse conseguido sua  atenção. Pelo menos, não até agora. Até que ela finalmente percebesse a  pessoa maravilhosa que ele era e decidisse dar uma chance. Não é  engraçado como o mundo dá voltas? No final, ela tinha apenas acabado de  descobrir que tudo que sempre quis estava logo ali o tempo todo. Agora,  sim, não precisava mais viver de aparências.

Os passos se  tornaram mais rápidos conforme se aproximaram. E Anne estava ali, bem  diante dos olhos dele, tão distraída ao contemplar as estrelas que  sequer virou para olhar para o que estava se aproximando. Isso era tão,  tão típico dela, não olhar para nada além de si mesma e seus próprios  interesses. O brilho das estrelas se refletia em seus olhos verdes e  fios de seus cabelos negros caíam sobre eles. Ele poderia ficar ali a  admirando para sempre.

Poderia, sim. Mas não faria isso. Aquele  era o momento perfeito e esperar por duas horas tinha valido a pena. Na  verdade, ele esperara por aquilo por anos. E agora, ela mesma se  conduzira para longe do ginásio e da movimentação, como se quisesse  ajudá-lo a fazer aquilo. E esse pensamento colocava um sorriso em seus  lábios. Ninguém a salvaria a tempo.

Também não havia ninguém lá  para ver que ele a segurou pelas costas. Ela agora estava mais arrepiada  do que nunca, mas não era mais o frio. Era o medo. E, independente de  sua boca estar coberta pela mão dele, ela não conseguiria gritar de  qualquer forma. A adrenalina e o terror haviam tomado conta de seu corpo  e a paralisado.

— Adeus, Anne Lewis.

Era ele.  Aquela era a voz dele. Mas era tarde demais, a lâmina já tinha cortado  sua carne. Não houve tempo para nada além do reconhecimento e da  terrível dor física que a consumiu.

O sangue de Anne cobriu seu  vestido branco, escorreu por sua pele alva e respingou para a neve,  pintando-a de vermelho. E só nesse momento um grito conseguiu escapar da  garganta da garota para ecoar pela escuridão da noite, seguido por uma  risada longa, histérica e mais gélida que a neve que cobria o chão, agora manchada pelo sangue de Anne. Algumas gotas também  se  respingaram para o rosto de seu assassino, que não se importou com a  bagunça.

Não houve tempo para reagir. Anne já estava morta e ele permaneceu de pé ao lado do corpo, rindo.

Mas, na verdade, antes do final trágico e insano, essa história começou há muito, muito tempo.

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Aug 12, 2020 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

Eu Matei Anne LewisOnde histórias criam vida. Descubra agora