Os olhos negros e puxados estavam vidrados na parede; seu corpo não se movia já tinha alguns minutos, seus músculos quase duros dentro de seu corpo magro e gelado.
Piscou.
Mexeu a cabeça e estralou o pescoço.
Reclinou seu corpo e apoiou as costas na cadeira dura de madeira.
Era assim agora. Todos os seus movimentos eram contados e narrados dentro de sua cabeça.
Doía.
Mas o que poderia fazer?
Lance, me ajude
Soltou o ar de seus pulmões doloridos e tensos com dificuldade, seus olhos se virando roboticamente para a figura relaxada de seu namorado na cama.
Lance era a única pessoa que seu coração havia aceitado, e aquilo era esquisito. Não odiava Lance, mas também não o amava. Não sentia nada.
Talvez, justamente por não sentir nada, não sentia gastura de ficar perto daquele outro humano.
Estranho.
Sorriu pequeno e levou uma das mãos trêmulas até a boca, roendo o resto de unha que tinha preso na carne.
Conseguia sentir o gosto de sangue que saía de suas cutículas amargurar suas papilas gustativas.
Não conseguia mais se segurar.
Não podia mais se machucar.
Mas quem disse que lhe trancar na casa com seu suposto namorado pararia alguma coisa?
Suas pernas e braços estavam completamente roxos de tantos socos que havia se dado em tempos de crise.
Keith gostava de ver as manchibhas roxas e verdes em sua pele pálida e sem graça. Se sentia um verdadeiro artista quando deixava seu corpo desprezível e nojento coloridinho daquele jeito.
Dando uma risada baixinha, Keith esticou os braços e pegou a chave de casa na cabeceira.
- Onde vai? - Lance perguntou sem tirar os olhos do livro em suas mãos.
Keith já esperava aquilo - afinal, Keith era um peso. Uma decepção.
Ninguém se importava de verdade, nem o suficiente para olhar pra si quando falava.
- Não sei - se inclinou um pouco e deixou um beijo delicado na testa macia do parceiro - Não espere a minha volta.
Em passos rápidos, pegou sua mochila de costas e saiu do apartamento.
Mas, afinal, quem era Keith Kogane?
A polícia não conseguiu contatar nenhum familiar depois de achar seu corpo pendurado em uma árvore grande e seca no bosque da cidade.
Somente uma pessoa compareceu ao seu funeral (um garoto bonito e com a pele cor de chocolate), e tudo o que a tal pessoa fez foi soltar uma risada ao ver o corpo morto dentro do caixão.
Lance foi o único anjo que Keith não conseguiu matar. Era engraçado.
Keith também ria enquanto sua alma queimava nas altas e vermelhas chamas.
