Livro 2 - Capítulo VII

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Em algum lugar da costa do Reino Franco — Inverno, Dezembro de 834 d.C.

Brunilde olhou para o horizonte, as ondas eram altas, mas nada comparadas com as da tempestade que enfrentara semanas antes.

Um calafrio percorreu sua coluna ao se recordar.

A enorme onda varrera completamente o convés, se todos não estivessem amarrados por cordas aos bancos teriam sido jogados ao mar. A embarcação adernara perigosamente, mas se estabilizara e a proa cortara as águas subindo por uma enorme vaga, para depois deslizar pelo outro lado em uma velocidade espantosa.

Ela também estava amarrada ao remo de leme na popa, os músculos de seus braços quase explodindo com o esforço, mas estranhamente não sentira medo, nem quando exausta, caíra desacordada após horas enfrentando a tempestade.

Quando acordara o barco estava ancorado em uma pequena baía. Suas irmãs, encarando-a quase com deferência, disseram que ela gargalhara e conversara aos gritos com os deuses durante as tenebrosas horas.

Agora todas se referiam a ela como Brunilde, Rompe Tormentas.

Encontraram uma pequena aldeia, onde, trocando as poucas moedas de ouro que conseguira em Al-Andalus conseguiram material e aldeões suficientes para consertarem o casco da embarcação que estava vazando água e adquirir mantimentos suficientes para terminar a viagem.

Conversando com os pescadores descobriu que estava na costa do Reino Franco. O conserto durara dez dias e durante esse tempo ela caminhou pela região com suas escudeiras.

Era um belo local para uma colônia viking, pensou consigo mesma, a terra era fértil, o clima, embora não fosse quente como o de Al-Andalus era bem melhor do que a gelada Escandinávia.

Finalmente terminaram o concerto e embarcaram novamente seguindo em direção norte. Brunilde tinha boa memória e acompanhara atentamente sua tia Varda anotar as referências em um mapa. Ela não possuía uma "pedra de sol" 5, assim tinha que esperar que o astro aparecesse para poder calcular sua trajetória e nunca se afastava muito da costa, o que fez a viagem levar muito mais tempo.

Mas um dia viram um Drakkar se aproximando com seus dezoito pares de remos, guerreiros de aspecto feroz observavam sua pequena embarcação, com apenas dez pares de remos.

Brunilde ordenou que os remos fossem recolhidos e todos se armassem, não sabia a intenção de seus conterrâneos, mas não entregaria a embarcação que construíra com tanto sacrifício sem luta. Juntamente com suas guerreiras e os árabes que as acompanharam sustentaram seus escudos, espadas e machados.

O drakkar deslizou lentamente se posicionando perto o suficiente para que ganchos fossem lançados, mas ele simplesmente se colocou lado a lado.

— Sou Igmar Igmarson, capitão do Serpente Marinha! Quem é você? – perguntou gritando enquanto as embarcações balançavam ao sabor das ondas.

— Sou Brunilde, Rompe Tormentas, filha de Ingrid Lavardsson, sobrinha de Varda Lavardsson, neta de Rudolff Lavardsson, conhecido como Quebra Escudos – gritou anunciando sua descendência, contando que o capitão conhecesse sua tia e a fama de seu avô.

— Conheço Varda Lavardsson, a Matadora de Maridos – gritou o homem de volta — E quando jovem lutei ao lado de Rudolff, Quebra Escudos! Sua tia contou que você morreu em uma terra distante.

— Ela se enganou! Então você sabe quem eu sou! – gritou mais animada — Estou voltando para casa.

— Você que construiu esse pequeno drakkar?

— Sim, e além de minhas companheiras, também venho com homens corajosos de terras distantes que resolveram nos acompanhar.

— Muito bem, Brunilde Rompe Tormentas – decidiu — Siga-nos.

Dois dias depois, em meio a uma chuva fraca que caía com a chegada da noite precoce do norte, Brunilde manobrou sua pequena embarcação no porto de Kattegat.

O local estava repleto de curiosos; velhos, mulheres, crianças, comerciantes e guerreiros com seus escudos, espadas e machados. Sua chegada fora anunciada, uma vez que, ao se aproximarem, a embarcação do capitão nórdico avançou na frente com a força de seus remos mais numerosos.

Caminhou com orgulho em meio aos guerreiros que a observavam e a seus acompanhantes árabes, até o grande salão do Jarl Ragnar que estava em meio a um banquete com seus companheiros mais íntimos, os filhos, e a esposa.

Todos ficaram em silêncio quando ela entrou.

Brunilde percebeu que Bjorn estava sentado ao lado da esposa na mesa reservada a Ragnar e sua família.

— Por Odin! – gritou Ragnar se levantando e caminhando até ela — Sua tia e Jarl Kristoff disseram que você havia morrido em terras distantes!

— Pois ela se enganou – respondeu rindo e aceitando o abraço e os beijos calorosos nas faces. Ela gostava de Ragnar, ele sempre fora gentil e era um líder destemido e corajoso — E como vai minha tia?

— Muito bem, depois que voltaram com o resultado dos saques nas terras do sul, pararam no reino Franco, mas nós também estávamos voltando para casa e viemos juntos – gargalhou feliz — Ela se casou com Kristoff.

— Fico feliz por ela – respondeu com sinceridade. Gostava do Jarl que sua tia seguira, não os culpava por terem-nos abandonado, era destino, Brunilde, suas companheiras e os guerreiros de Kristoff haviam sido cercados e o porto atacado. Ela faria o mesmo se estivesse no lugar de sua tia.

— Mas, sua tia está viúva novamente – avisou com um sorriso — Kristoff não aguentou muito tempo ficar casado com ela, mas dizem que morreu feliz na cama enquanto se amavam.

Os presentes gargalharam e Brunilde percebeu que Bjorn a encarava fixamente.

— Agora, Brunilde, Rompe Tormentas – continuou Ragnar puxando-a pelo braço até sua mesa e a fazendo se sentar em um lugar de honra — Conte a todos os que aqui estão suas aventuras e quem são esses guerreiros de aspecto estranho que a acompanham. 

A GUERREIRA INDOMÁVELOnde histórias criam vida. Descubra agora