O melhor Anjo da Guarda

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O nome dela é Finn.

Eu me preocupo com ela.

Afinal, é para isso que eu existo.

Finn é minha humana. Eu sou seu anjo da guarda. Nós somos entidades de luz designadas para proteger os humanos que mais precisam. E Finn precisa de mim.

Quando ela era pequena, pessoas horríveis fizeram coisas horríveis para ela. Ela nunca superou. A depressão tomou sua mente, e ela não tinha apoio nenhum para lidar com seu trauma.

Assim como eu. Meu nome era Louie. Eu morri a alguns meses. Na verdade, me mataram a alguns meses, e eu não tive nem chance de lutar pela minha vida. Mas de alguma maneira, o destino me deu uma chance de lutar pela de Finn.

Quando eu abri os olhos pela primeira vez, tudo era luz. Eu não tinha mais corpo, mas conseguia ver e sentir tudo. Uma voz me dizia o que fazer. "Acorde", e eu o fiz. "Salve-a". É isso que tento. Mas é tão difícil! Finn chora todo dia. Ela clama por abraços, Por um apoio que eu não posso dar.

Eu escondo suas lâminas. Empresto meu calor a ela quando ela treme de frio, em suas crises de pânico. Tiro da tomada qualquer eletrônico que esteja perto demais de sua banheira. Eu só queria... Poder dizer para ela. O quanto eu a amo. O quanto eu me apaixonei por todos detalhes dela. O quanto o sorriso dela é lindo. O quanto a vida dela vale a pena.

Finn acordou hoje pior do que o normal. Ela havia esquecido de preparar o jantar na noite anterior, e seu pai não estava nada feliz com aquilo. Mas claro, eu dei meu jeito. O homem saiu de casa apressado, atrasado para o trabalho, sem tempo para brigar com ela. Quem diria que ponteiros de relógio fora do lugar pudessem assustar tanto alguém tão grande quanto ele! Finn estaria segura, pelo menos por mais um dia.

Ela se levantou, e eu abracei ela. Ou pelo menos, tentei. Ela se estremeceu, com meu calor percorrendo seu corpo. Sendo energia pura, foi o máximo que consegui fazer. Finn colocou suas roupas, caminhou até a cozinha. A poeira nas prateleiras estava começando a incomodar, mas a garota apenas ignorou, constatando que a única caixa presente no armário estava vazia. Ela precisava sair para comer.

Do lado de fora, estava ensolarado. Algumas poças de água pelo caminho evidenciaram a chuva da noite anterior, o que explicava o frio da manhã. Finn quase tropeçou em uma delas, mas eu consegui impedir.

Eu já sabia para onde ela ia. A loja de conveniências do posto de gasolina, a algumas quadras de distância da casa, era a única que não pedia identidade para a compra de cigarros e álcool. Ela sempre ia lá, mesmo que agora já tivesse idade para essas coisas. Eu tentei tantas vezes impedir Finn de frequentar este lugar. Que os deuses me perdoem, mas até um incêndio eu tentei causar, para que aquela espelunca fechasse. Mas de nada eu consegui. E eu tinha medo, pela saúde de Finn. Se ela continuasse daquela maneira, de nada adiantariam meus esforços. Eu precisava fazer algo, ou Finn morreria, como eu.

"Criança, me ouça", disse a voz. Eu não a escutava faziam meses. Eu tinha medo, do que ela poderia me dizer. "O tempo de Finn está chegando ao fim". Era o que eu temia. A voz estava aqui para me levar para outra pessoa. "Não se preocupe, criança. Não vou te tirar dela. Vou te dar a chance de intervir. Você pode falar com ela. Apenas uma vez, assim como eu falo com você. E então, você poderá encarnar e viver ao lado dela".

Eu nunca estive mais feliz. Finn estava conversando com o caixa, quando a minha deixa chegou. Eu tinha que agir. enquanto ela e o funcionário estavam distraídos, eu olhei as folhas da loteria, deixando a com o prêmio ganhador por cima. Não era de valor alto, mas era o suficiente para ajudar Finn a sobreviver sem a ajuda de seu pai Com o celular do funcionário, mandei uma mensagem a polícia, denunciando o pai dela como o abusador que estava sendo procurado. Afinal, não era mentira.

"Finn, me ouça", eu disse, com esperança. "Eu estou chegando para cuidar de você. Tudo vai ficar bem. Pegue o bilhete, e não precisará preocupar com seu pai. E tenha esperança, pois seremos felizes juntos."

Não sei como ela recebeu minha mensagem, mas seus olhos brilharam. Ela pegou o bilhete certo, e a quantia de dinheiro era o suficiente para ajudá-la. Como um dos meus últimos atos como um ser incorpóreo, eu fiz com que o funcionário "esquecesse" de entregar a sacola com a bebida e o cigarro. Com sorte, Finn superaria isso também. Eu iria ajudá-la.

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Eu não fazia ideia do que aquilo tinha sido. Uma voz, calma, no fundo dos meus pensamentos. "Tenha esperança, pois seremos felizes juntos". A sensação que tive foi igual às ondas de calor que me motivavam a sair da cama de manhã. Eu sabia que tinha algo, alguém me protegendo. Era o que me fazia lutar. As coincidências, como meu isqueiros sempre sumindo quando eu queria fumar, minhas lâminas caindo no ralo quando eu queria me machucar, eu sabia que não eram por acaso.

O policial na porta de casa só me confirmou que a voz não era apenas uma ilusão da minha cabeça. Meu pai havia sido preso. Ele finalmente havia sido preso. Eu não mais iria ter medo de voltar para casa, medo de dormir com a porta destrancada. Um milagre para ajudar na minha recuperação. E o bilhete sorteado, aquilo era dinheiro o suficiente para me sustentar enquanto eu pudesse buscar pela minha educação.

Eu não entendi o porquê de tudo isso acontecer agora. E então, ao entrar na minha casa, eu acho que entendi.

Alguns meses atrás, meu pai cometeu um atropelamento, dirigindo bêbado. Foi em frente a minha casa. Eu me recordo dos gritos de dor, e do silêncio, quando meu pai, buscando evitar a polícia, poupou a pobre alma de seu sofrimento, matando-a. Foi a pior noite de minha vida. Eu tive que ajudar a esconder o corpo, enterrá-lo no meu quintal. Eu me lembro de cada detalhe, os olhos azuis congelados no tempo.

Eu reconheceria aquele gatinho, sentado na minha cama, em qualquer lugar.

"Então é você que vem me protegendo todo esse tempo?" eu disse, ao pegar ele no colo. O calor dele era igual ao que eu sentia todos os dias de manhã, e seu ronronar se transmitia para mim. "Eu também amo você, gatinho. Obrigada por não desistir de mim".

Em seu pescoço, um lindo colar com minhas informações parecia ser feito de ouro. Na plaquinha, escrito: "Louie, meu melhor anjo da guarda".

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⏰ Última atualização: Aug 20, 2020 ⏰

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