15 de abril de 1940 - Inglaterra
A manhã seria agradável.
O sol brilhava e por um momento as nuvens haviam saído para dar espaço à luz de uma linda manhã. O clima estava bom e as gramíneas que cresciam atrevidamente em cantos impróprios pareciam dançar com a leve brisa, como se estivessem aproveitando para relaxar.
Seria. Se ao invés de estar do lado de fora de um pequeno casebre aproveitando o dia, eu não estivesse em uma estação de trem. Ali, diferente do lado de fora tinha um ar pesado, levemente escuro pelas cinzas que a locomotiva ainda soltava ao esperar que os homens entrassem. Era uma despedida dolorosa para as damas, que com seus finos lenços bordados (ou não tão finos assim), choravam frente aos seus amados.
Meu olhar se perdeu em um mar de tristeza, que via soldados recém recrutados para um campo mortal, entrarem esperançosos, orgulhosos e levemente melancólicos nos vagões sem cor. Meu olhar se fixou novamente quando, Vicent suspirou pesado, tão pesado que podia sentir seu olhar sobre mim.
Me virei para ele. A feição triste e o olhar vazio, como se quisesse inutilmente decorar cada mínimo detalhe de seu rosto para nunca me esquecer. A diferença entre as despedidas normais e a nossa? Era que eu não usava lindos vestidos ou carregava um lenço. Eu era apenas Sebastian, ou carinhosamente conhecido como Sebby, um jovem inglês com sua alma condenada ao perceber que gostava de homens.
Em um momento como aquele, meu maior desejo era poder abraçar Vincent, parado em minha frente, assim como o tempo à nossa volta. O fato era que era doloroso demais se despedir de alguém sem saber se algum dia voltará a vê-lo. Mas, tínhamos que ser discretos o suficiente para que centenas de pessoas não olhassem de forma mais desconfiada para nós dois. Dessa vez fui eu quem suspirou pesado e com um choro agarrado na garganta, o abracei fortemente, como nunca havia feito.
Durou apenas alguns segundos, um contato precioso, principalmente quando senti suas mãos retribuírem na mesma intensidade, se apertando em minhas costas, como se agarrasse em algo ou àlgum momento. Nos separamos, uma pressão gigantesca sobre os meus ombros parecia surgir e então o trem chamou pela última vez os passageiros para que entrassem. Um som que, para mim, se tornaria motivo de pesadelos.
Foi andando de costas meio torto, com cuidado para não trombar com alguém e em um ponto, se virou de costas para mim, subindo em um dos vagões do trem. Não precisavam de palavras ou qualquer outra coisa naquele momento. Apenas um olhar, um único olhar dividido por nós, poderia falar tudo que precisávamos.
As portas se fecharam, os fornos estavam funcionando e agora as rodas começavam a girar. E com os braços contornando meu próprio corpo, como um tipo de consolo, assisti calmamente, Vincent partir na locomotiva. Em volta, as damas ainda sofriam. Não se sabe se era pela partida, pela saudade ou pela esperança vã de que um dia iriam voltar.
A verdade é que ali, todos, sem excessão alguma, sabiam que aquele trem nunca voltaria. Sabíamos na verdade que aquele era o último adeus.
- A locomotiva -
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O Último Adeus
Romance"E por ventura sei que merecemos melhores momentos, por esse motivo, desejo-te ao meu lado por todas as vidas." História autoral - plágio é crime -