🛫CINCO🍨

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LAURA

Quando vim para Londres, pensei que este seria a cidade ideal para se morar. Tia Edelin havia passado uma grande parte da vida aqui, e só tinha elogios em suas cartas. Ela amava a cafeteria Coffe in love perto de onde morava, e me lembro bem de sair de casa pela manhã nas férias, só para provar do seu doce preferido que vendia ali.

Mas a minha lembrança preferida era subir até o último andar de um prédio aleatório e observar o céu à noite. Essa é uma memória importante, uma forma de me dar forças para lutar pelo sonho que anos depois causaria uma quebra de laços entre mim e meus pais.

Solto uma longa lufada de ar quando enfim ponho meus pés no terraço do prédio, a primeira coisa que vejo é a imensidão do céu. Caminho diretamente ao parapeito, apoiando as mãos ali.

Olhar para o céu, na minha opinião é para pessoas solitárias, ou que no mínimo apreciam a simplicidade. Observar as pequenas bolas brilhantes na imensidão escura do céu trazia reflexões sobre a vida, uma paz para aqueles que vivem perturbados pelos seus sentimentos e perseguidos pelas ações do passado.

- Uau...

Quero dizer que entendo, que sei como é olhar para essa imensidão e se encantar, mas não digo. Não quero dizer como me sinto, não quero que ninguém saiba como me sinto. Sei que sou observada por Serge, mas não movo nem um centímetro do meu corpo. Não quero que ele questione o porquê a cada vez que vejo Ethan e Hannah felizes um com o outro, sinto uma imensa vontade de sumir.

- Como soube que pilotar aviões era o que deveria fazer?

Ele muda de assunto e eu agradeço internamente. Sei que ele tem perguntas sobre o que aconteceu, tem perguntas sobre o meu silêncio durante todo o trajeto e muitas outras relacionadas a minha insistência em fugir quando as coisas parecem bem demais.

- Não é uma história muito interessante.

- Não me importo, quero ouvi-la contar.

Abaixo os olhos para observar seus braços se apoiarem no parapeito. Ele não está me encarando, está olhando para baixo, para as pessoas que entram e saem do prédio, para os carros que passam e estacionam em algum lugar.

- Desde de criança nunca gostei muito da possibilidade de me manter em terra firme, acho que posso começar por aí.

- Não foi bem aí.

- Não. Foi em uma das visitas da minha tia. Eu era nova, então tinha muita curiosidade. Ela me levaria a minha primeira viagem, mas meus pais não permitiram, então ela me levou para conhecer seus amigos, que para a minha surpresa, eram pilotos. Eles me deixaram ver tudo - conto, sorrindo. - Fiz tantas perguntas, e quando tivemos que ir embora, eu disse a minha tia que queria ser piloto.

- E o que ela disse? - pergunta, realmente interessado.

- Disse que eu poderia ser o que quisesse, mas que deveria estar preparada para perder certas coisas.

Respiro dolorosamente fundo, encho meus pulmões de ar até doerem e solto em uma única lufada de ar. Lembrar daqueles dias é difícil.

- Depois pesquisei sobre aviões, as histórias dele e mil outras coisas. Então eu sonhava e dormia pensando nisso, sentava do lado de fora de casa e olhava para as estrelas, me perguntando qual seria a sensação de estar lá em cima.

Permaneço em silêncio, mostrando assim que essas seriam minhas últimas palavras a respeito do meu sonho de infância. Eu não queria falar sobre mim, não queria falar do passado, do que deixei para trás quando decidi me tornar piloto. Não queria dizer do que tive que passar sozinha, de quantas noites subi em terraços de prédios desconhecidos só para me sentir compreendida pelas estrelas. Não quero me lembrar de quantas vezes menti para minha tia, dizendo que estava bem, quando na verdade, estava rachando em pedaços incontáveis.

Nas Alturas •CONCLUÍDA•Onde histórias criam vida. Descubra agora