"-Eu nunca disse disse que era um santo."

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O ensaio havia começado, Itachi amarrava suas sapatilhas em volta do tornozelo, ajeitava sua meia calça e o ajustava o seu collant preto ao corpo, se sentia pronto. Fechou os olhos, puxando forte a respiração e soltando levemente pela boca e com um aceno de cabeça, deu o sinal. O pianista iniciou a melodia, as notas, por enquanto, eram lentas e pausadas, tinha costume de chamar aquela parte de "rio lento". Itachi começou com passos simples, andava vagarosamente pelo palco com a ponta dos pés, seus braços se movimentavam graciosamente dando leveza para a coreografia, a luz dos holofotes o seguiam a cada passo, o marcando, o destacando. Aquele ensaio seria um dos últimos até a grande apresentação solo do rapaz, olheiros estariam lá para vê-lo e seria a sua primeira aparição solo no palco. Estava nervoso, é lógico, mas como um bom perfeccionista, não se deixaria abalar por isso.

Agora as notas estavam mais rápidas, essa parte era as "corredeiras", pois ainda continuavam arrastadas. Tinha o costume de comparar suas apresentações a algo, e dessa vez usava um rio, já que os passos eram leves, como se seu corpo tão tivesse as articulações. Seguia o som, sempre sorrindo para a plateia, ou expressando a emoção que aquele passo ou aquela parte da melodia pedir, tudo tinha que sair perfeito, Shisui, o pianista do teatro onde Itachi ensaiava, era um dos melhores e mais requisitados da cidade, já havia tocado para vários bailarinos amadores ali, que tempos depois viraram famosos. Era conhecido, mas seu verdadeiro gosto era apreciar a graciosa combinação da arte delicada que é o ballet, com as notas fortes e tocantes que o piano conseguia mostrar. Achava que esta junção era a mais formosa que o mundo da arte poderia proporcionar.

Itachi agora mexia seu corpo com mais velocidade, mas nunca perdendo sua graça, seus passos eram leves, por mais que consistissem em pulos e rodopios, fazia com que parecesse com uma pena, sempre com graça e beleza. "A cachoeira". O toque do piano agora estava mais rápido, Shisui deslizava os dedos pelas teclas com mais pudor, sentindo a ansiedade percorrer pelo seu peito, intercalando os olhos entre o instrumento musical e o palco. Para Itachi, isso significava que estava chegando a hora de seu passo mais difícil, que havia demorado para aprender e, talvez, ainda não chego a perfeição. O "jeté", esse movimento consiste em um salto perfeito e com um pouso finalizado com um "rond de jambe", a combinação dos dois faziam as pernas do Uchiha bambearam, e esse era "A queda". Tomou fôlego, sentia as notas chegarem cada vez mais perto de seu grande momento, começou a correr e saltou, porém sua finalização foi indevida, combinada com um erro nas notas do piano.

— Aí! – Itachi reclamou enquanto deitava no chão desapontado consigo mesmo, suas mãos emolduraram seu rosto, em um misto de decepção e raiva. Respirou fundo novamente, mordendo o seu lábio inferior, tomando nota de onde havia errado para que pudesse refazer com perfeição da próxima vez.

— Tinha que ser... — Shisui se manifestou em um tom de voz baixo, mas que não passou despercebido, acompanhado com uma risada debochada, e os olhos semicerrados para o garoto sobre o palco.

— Disse algo?-Os olhos do Uchiha focaram as íris escuras do pianista, como se faiscassem, e tudo explodiu quando o maior sorriu debochado. — Desculpe, acho que perdi a hora da piada pra você estar rindo dessa maneira. — Sentou sobre o palco, com uma das pernas reta e a outra dobrada, já que levou a destra ao tornozelo desta e começou uma massagem no local que havia dado uma leve torção. Seus olhos foram de encontro com os do musicista, e mais uma vez todos ali no recinto notaram a forte tensão que havia entre os dois.

— Não me surpreendo com seu descaso com a dança. Sempre erra na mesma nota, já é quase rotineiro. — Bateu palmas e as luzes foram acesas desligando os holofotes que focavam o menor. Se levantou do instrumento, e estralou seus dedos.

— Perdão? Foi você que errou a nota. — Seus lábios se contraíram em uma feição desgostosa, franzindo o cenho e cruzando os braços. Claro que o "perfeito Shisui" não erraria, não é? Sem noção.

On the piano (shiita) - revisado. Onde histórias criam vida. Descubra agora