CAPÍTULO 6

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Uma semana

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Uma semana. Foi esse o tempo que consegui me esconder de minha mãe. Mas eu tinha ciência de que não duraria muito tempo. Eu não poderia me esconder para sempre dela pelo fato de morarmos na mesma casa. Porém sei que ela não faz a mínima questão de me ver. Mesmo eu tendo aguentado essa sua atitude todos esses anos, não posso mentir dizendo que não me magoa, pois dilacera meu coração.

Eu não conseguia comer, não só pelo fato de não sair mais de meu quarto, mas sinceramente não sentia vontade. Tentei por muitas vezes conversar com Deus, mas também não conseguia. Sempre que parava para orar minha mente me dizia que Deus não estava realmente preocupado comigo, e estou começando a acreditar nisso.

Todos que eu confiava me viraram as costas de maneira impressionante, como se eu nunca tivesse acrescentado nada em suas vidas, como se eu fosse um nada. Acho também que para Deus não está sendo diferente. Ele não se preocupou em impedir que as pessoas me machucassem, e agora me deixou sozinha. Como eu poderia acreditar que Ele em algum momento se importou comigo?

Na verdade, não aguento mais todo esse sofrimento. Por toda minha vida tive que aguentar minha própria mãe me tratando como um lixo sem poder me defender. E onde Deus estava enquanto tudo isso acontecia? Ele estava muito ocupado com pessoas mais importantes. Quem eu penso que sou pra querer a atenção dEle?

Algumas frases que escutei por toda minha infância vêm em minha cabeça, deixando uma forte dor se alastrar por ela.

As vezes sinto vergonha de ser sua mãe.

Você é tão burra.

Por que não seguem o exemplo de sua irmã? Ela é perfeita, já você…

Por que acha que devo te parabenizar? Você tem a obrigação de tirar notas boas e quando consegue essa proeza uma vez na vida quer que eu perca meu tempo te dando os parebesn?

Sua criança tola! deve aprender a controlar a língua ou então a arrancar ela fora!

Está vendo o que fez? por sua culpa seu pai foi embora. Como pode ser tão insuportável? Agora terei que te aguentar sozinha!

Enquanto fui crescendo isso se tornou normal. Eu sempre fazia de conta que não me importava com tudo aquilo, e mesmo assim ela não parava de soltar frases ofensivas e desamorosas.

Mas agora… Agora não é só isso que me magoa. Eu não consigo ao menos pensar no que aconteceu comigo naquela festa. Acho que é porque não quero aceitar. Mas como posso aceitar que alguém me toque contra a minha vontade? como posso aceitar o fato de ter sido violentada, sem nenhuma probabilidade de me defender?

Minha frustração só aumentou quando escutei uma voz que me deu calafrios. Era ele, ele estava em minha casa e eu demorei um tempo para acreditar. Abri minha porta de fininho e pude flagrar Apolo conversando com Clára. Levei alguns minutos para digerir aquela situação. Ela havia o perdoado.

Como ema pôde?

Há tantas perguntas invadindo minha mente que ela chega a estar sobrecarregada.

Eu tive que me isolar do mundo. Tive que me isolar de tudo. Não tive coragem de conversar com ninguém. Até pesquisei na Internet sobre violação sexual. Não me expus, claro que não! entrei em um site como uma pessoa anônima, pedi ajuda e logo me responderam.

Uma moça muito simpática conversou comigo. Ela tentou me fazer acreditar que eu não tinha culpa de nada, que poderia me ajudar. Mas eu senti muito medo… Medo pois não sabia com quem estava conversando. Eu não posso realmente confiar em uma pessoa que conheci na Internet, disso eu tenho total ciência.

A mulher se denominou como Bianca Miller. Pediu para que eu pesquisasse sobre ela na Internet para ficar mais segura pois participava de uma ONG. Ela me disse também sofreu de violência sexual na infância e que a ONG foi muito importante para ajudá-la a superar.

Eu estava quase acreditando nela. Eu enviei meu número de telefone e endereço, iria depositar um pouco da confiança que restara em mim para aceitar a ajuda de uma desconhecida. Mas talvez ela estivesse ali realmente para me ajudar. Talvez ela me ajudasse a sair desse poço de tristeza e depressão. Mas uma distração acabou com minha esperança. Um barulho do lado de fora de meu quarto me chamou a atenção. Eu fiquei bastante curiosa e não aguentei.

Quando abri uma brechinha da porta do meu quarto pude escutar vozes imediatamente. Reconheci a voz de dona Maria e me perguntei o que ela estaria fazendo em minha casa.

— Mas eu acho isso muito estranho. Nunca pensei que Cléo seria capaz de fazer algo assim. Ela pelo menos teve a chance de se explicar? — profere dona Maria.

— Você acha tudo isso estranho pois nunca a conheceu de verdade. Muitas pessoas achavam que eu a tratava de forma diferente, mas eu sempre tentei, Maria. Sempre tentei ter um relacionamento bom com minhas duas filhas, mas com Cléo sempre foi mais difícil. Eu sempre percebia comportamentos e sentimentos reins nela como inveja, raiva, falta de humildade, falta de sensibilidade com os sentimentos das pessoas. Mas o pior de tudo é sua falsidade. Ela é uma pessoa totalmente diferente do que demonstra para todos. Só quem convive com ela vinte e quatro horas sabe sua verdadeira versão. O pior de tudo é que me sinto culpada. Por conta de sua inveja ela se destruiu e ainda conseguiu magoar a irmã. Mas acho que Clára conseguirá perdoar. Ela sempre foi uma menina paciente e bondosa…

eu não consegui ficar mais um minuto escutando o discurso de minha mãe. Entrei em meu quarto e joguei para bem londe o primeiro objeto que avistei. Observei o abajur se chocando contra a parede e fazendo um enorme barulho, mas não me importei por alguém ter escutado. Ninguém ligava.

Agora estou aqui. Minha letra está saindo horrível, mas eu não ligo para isso. Porém, me desculpe se algumas palavras tiveram incompreensíveis, isso provavelmente é porque minhas lágrimas caíram nesse frágil papel. Mas eu não pude controlar.

Então… Acho que não tenho mais nada para dizer… Ou melhor, escrever. Bianca Miller, a moça que conversava comigo pelo site me ligou, mas eu já estava convencida do qua fazer, ela não iria me convencer do contrário.

Eu já separei as três caixas de remédio. Lembro que tive de tomá-lo quando tive febre a algumas semanas atrás. Eu li a bula e dizia de efeitos colaterais caso não fosse ingerido corretamente, porém eu não preciso me preocupar com isso. A quantidade que tomarei não me permitirá acordar nunca mais.

Então é aqui que me despeço.

Eu poderia escrever com amor, mas eu não estaria sendo totalmente sincera. Não que eu não sinta amor, mas a dor é bem maior e mais forte. Tão grande, que meu coração não aguenta mais.

Com muita dor, Cléo.

Com muita dor, Cléo

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Com Muita Dor, CléoOnde histórias criam vida. Descubra agora