Only

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Caminhando por entre os bancos, continuo a reza baixa concentrado em meu terço. Sento-me e encaro a imagem de Cristo no alto da parede. Sorrio comigo mesmo pensando em tudo o que passei para finalmente chegar até ali, no meu lugar. Durante minha vida toda fui levado para o caminho do clero, me diziam que tinha vocação, que era o destino.

Mal sabia eu que ele seria traiçoeiro, discreto até concretizar-se. 

Um barulho na capela indicava que alguém havia chegado, então simplesmente faço a cruz e termino minhas orações. 

- Olá? - pergunto logo ao levantar

Não era um ambiente muito claro, por isso não conseguia ver direito ao escurecer. 

Do outro lado vi aparecer uma moça. Cabelos pretos e longos, usava um vestido escuro de mangas longas, e um colete preto. Tinha também algo na cabeça, mas não consegui identificar de primeira vista.

- Posso ajudá-la? - tento me aproximar, mas ela recua um pouco

- Eu... Não tenho para onde ir. - sua fala saiu baixa

- O que há? Está ferida? - coloco o terço no pescoço e tento novamente me aproximar

Ela recua aos poucos, parecendo fraca, frágil. 

- Calme, está tudo bem. Sente-se aqui, pegarei um copo d'água.

Fui diretamente para a cozinha e retornei rapidamente. Ela já estava sentada em um dos bancos, e me sentei ao seu lado examinando por seu rosto ou corpo se estava machucada. Não avistei nenhum arranhão, somente uma cicatriz perto do ombro exposto. Ela tremia, provavelmente de frio, considerando que do lado de fora estava uma temperatura baixíssima.

- Poderia me dizer seu nome? O que aconteceu com você?

- Me chamo Mailee, Mailee Trevissan. - concordei e pedi silenciosamente para que ela prosseguisse - Eu estou desabrigada fazem dois dias, não sabia mais para onde ir e aqui é o único lugar que pensei estar disponível. - ela finalmente deposita sua atenção em mim - Você parece ser uma boa pessoa padre. Me deixaria ficar aqui, por enquanto?

Ela parecia escolher as palavras com cuidado, e volta e meia tremia ao meu lado. 

- Claro, fique o tempo que precisar. - sorrio para a mesma, buscando lhe passar algum conforto

~*~

Depois das devidas apresentações, deixei que ela se limpasse no banheiro do meu quarto. A capela não era grande, mas havia um espaço para depositar-me as noites. 

Deixei que ela usasse a cama durante todas as noites, enquanto eu dormia no sofá em frente a mesma. Os dias frios abalavam a população de Linewood, de modo que somente as missas aos domingos traziam visitantes. Por isso, minhas únicas companhias nesses dias sorrateiros eram Mailee e um gato de rua que às vezes entrava pelo buraco da porta dos fundos.

Não ousei contar ao padre Ronald que abrigava uma desconhecida, seria expressamente proibido de palestrar e ela seria mandada para qualquer outro lugar longe da cidade. Ela não parecia querer nada de ruim, então abrigá-la seria um ato de caridade e não uma infração da leia ao meu ver.

Passamos a conversar mais depois de alguns dias de silêncio tortuoso. Vez ou outra ela me perguntava sobre coisas de Deus, quais orações eu havia aprendido, versículos importantes que tinha que lembrar, o que viesse á mente.

Perguntei sobre um símbolo que estava em seu pulso direito, representada por uma cruz cuja ponta tinha forma oval, como uma lança. Ela disse que era tradição, saberes passados de geração para geração, e também um jeito fácil de indicar quem era da família, chamada de cruz ansata.

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