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ATENÇÃO!
Esse livro possui temas que podem acionar gatilhos.
Se for sensível a esse tipo de história, tome cuidado, preserve sua saúde emocional.Ayla
O chão de terra vermelha parece estar pegando fogo, os pés, na grande maioria, descalços, levantam poeira que mais parece labaredas de fogo e colore as roupas já puídas dos seus ocupantes, a gritaria em torno do campo é constante, amontoados em volta da quadra há homens e garotos de todas as idades, os olhos fixos nos pés ágeis que correm de um lado para o outro, e no meio de toda essa algazarra estou eu.
A única garota, o ponto vermelho em meio a um mar de preto e azul. Quase ninguém entendo o que faz uma menina em um lugar como esse, sujo, impregnado de suor, poeira e palavrões. Mas não me importo em explicar. Eu sei porque estou aqui.
Ele também, e isso basta.
Meus olhos astutos buscam por seus cabelos negros, agora molhados de suor, colados em volta do rosto sujo, em meio aquela confusão. Ele não é o maior, nem o mais forte, mas é com certeza o mais habilidoso.
Há um machucado em seu joelho, recém adquirido depois de uma dividida com um garoto que tem quase o dobro do seu tamanho. Está inchado, mas ele não se importa, tenho certeza que sequer está sentindo, ele é pequeno para sua idade, mas é corajoso e não se intimida com o tamanho dos seus adversários, na verdade quando está no campo, ele não vê nada a sua volta, nem o céu acima de si, nem a terra castigada abaixo de suas chuteiras velhas e esburacadas, seus olhos castanhos que conheço tão bem quanto os meus, estão fixos na bola que parece ter uma paixão por seus pés maltratados e insiste em voltar para ele sempre que pode.
— Thales, aqui! — Duda grita do outro lado do gol e Thales olha rapidamente para nosso amigo enquanto desvia de um garoto que tenta pará-lo com um carrinho.
Ele corre com a bola a sua frente, Duda mantém os olhos fixos no amigo que lança a bola de forma perfeita para que ele só precise coloca-la no chão e chuta-la para o gol. Esse é o momento que todos esperam, as jogadas de Thales e Duda impressionam até os mais velhos, é como se eles pudessem se comunicar sem que ninguém os ouçam, é belo e mágico e faz com que esse campinho maltratado, escondido no fim do mundo, fique lotado todos os fins de semana.
Todos gritam quando a bola acerta o fundo da rede, os jogadores correm ao encontro de Duda que está vibrando com o gol como se estivesse em uma final de copa do mundo ao invés de uma pelada em um campinho de uma cidadezinha esquecida.
Ele se ajoelha exageradamente no chão e logo é coberto pelos companheiros, enquanto isso, meus olhos desviam para o garoto dos cabelos negros do outro lado do campo, ele está olhando para o céu e sorrindo, discretamente, eu sei o que ele está fazendo, já vi ele fazer isso um milhão de vezes. Ele está agradecendo a Deus.
O jogo termina e o time deles vence por oito a dois, Duda é cercado pelos outros garotos e comemoram cantando uma canção boba enquanto giram suas camisetas suadas no ar, as pessoas aos poucos se dispersam e outros meninos menores começam a chutar a bola de um lado para o outro tentando imita-los.
Thales se afasta, tão discreto que quase ninguém nota a sua falta, ele passa a mão suja de terra nos cabelos embolando-os enquanto caminha em minha direção, gosto quando ele faz isso, faz parecer mais velho e charmoso, e embora não tenha olhado para mim nem uma vez sequer enquanto jogava, sabe exatamente o lugar onde estou.
— Você viu o gol do Duda? — ele diz quando se senta ao meu lado no canto mais alto do morro.
— Vi, você foi incrível ao driblar aquele garoto e aquele passe, Duda só precisou ajeitar e bola na rede.
Thales finge não ouvir os elogios, ele quase nunca dá bola para eles, apenas ergue os ombros enquanto falo e pega um punhado de areia passando no joelho como se fosse um tipo estranho de medicamento, escondendo o sangue que volta a escorrer.
— Você foi muito bem hoje. — completo.
— Não foi nada demais. — ele mente e faço uma careta para a meleca que ele faz na perna.
Ele olha para o campo lá embaixo, Duda parece iluminado pela luz do céu alaranjado que deixa seus cabelos loiros ainda mais claros, quase brancos. Ele está crescendo mais do que Thales e já começa a se parecer mais com um adolescente do que nós, embora tenhamos todos a mesma idade.
Duda aceita muito bem as atenções que recebe, como se estivesse se preparando para o seu futuro, sempre cercado, amado, idolatrado. Ao contrário de Thales que depois que o jogo termina, sempre dá um jeito de escapar das pessoas como se tivesse alergia ao contato humano.
Thales apoia o queixo nos joelhos enquanto observa a cena, faço o mesmo, mas meus olhos se atraem para o menino magricelo, sujo e suado sentado ao meu lado, gosto de observar as sardas que cobrem seu rosto e a forma como seus olhos parecem quase verdes quando o sol bate neles, gosto de ver seu cabelo, embaçado de suor e terra, gosto até mesmo dos seus dentes, um pouco grandes demais, mas que combinam tão bem com sua boca.
— O que você está fazendo Ayla. — ele pergunta sem se mexer e sinto meu rosto esquentar de vergonha.
— Nada. — minto e viro meu rosto para o campo observando Duda finalmente começar a vir até nós.
Ele coloca a mão na frente dos olhos para poder nos ver e seu sorriso se espalha quando ele nos encontra.
— Cara você viu o golaço que fiz? — Duda pergunta com um sorriso enorme nos lábios quando se aproxima e se senta do outro lado me deixando no meio deles.
— Vi sim, vocês foram incríveis. — digo enquanto olho para meus dois melhores amigos. Tão diferentes um do outro, mas que me completam como os três lados de uma pirâmide.
Duda tem um ralado no cotovelo que parece incomoda-lo enquanto ele fala com Thales sobre as jogadas que não deram certo. E permaneço em silencio, degustando a interação deles, admirando a paixão que une esses dois garotos.
Alguns minutos depois voltamos para casa, juntos na pequena estradinha de terra, Thales chuta uma pedrinha por todo o caminho enquanto Duda não para de falar sobre o jogo e que acha que viu um olheiro. Eles sempre foram os opostos, um adora falar demais enquanto o outro é calado, um é alto e o outro baixinho, um tem cabelos da cor de areia e o outro negros como carvão, um se destaca em tudo o que faz enquanto o outro é tão tímido que sequer gosta de chamar atenção, um é meu amigo e o outro, o dono do meu coração.
Durante todo o caminho, Thales permanece ao meu lado, de vez em quando seus olhos se encontram com os meus, mas ele não diz nada. Em minha imaginação, gosto de pensar que ele gosta de mim, que ele anseia para que eu veja seus jogos e que a melhor parte do dia sempre seja o momento em que estamos assim, caminhando lado a lado no mais completo silêncio.
Esse com certeza é o meu melhor momento do dia.*******************************
E assim começamos mais uma aventura aqui no wattpad, essa é minha quarta história postada aqui e estou muito animada por dividir esse casal com você.
Como você puderam ver, no inicio do capítulo tem a primeira edição do nosso jornal esportivo Bola em Campo ele aparecerá eventualmente por aqui, nos trazendo as principais notícias sobre o mundo da bola, os novos craques e suas trajetórias.
Espero que tenham gostado!
Não deixem de dar a sua estrelinha e comentar bastante, a opinião de vocês é muito importante para mim.
Um grande beijo e uma excelente semana ♡
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Um Milhão de Promessas - DEGUSTAÇÃO
Romance*** ATENÇÃO! POSTAGENS INICIADAS NO DIA 21/09/20 *** SINOPSE: As vezes, quando o caos ameaça me enlouquecer, quando minhas pernas ardem pelo esforço exigido por mim, quando a dor já não é mais capaz de silenciar o ódio que pulsa em minhas veias eu...