Capítulo Único

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Meus dedos tocavam delicadamente as teclas daquele piano de cauda enquanto praticava aquela escala de oitavas. Eu tentava me concentrar somente no que estava a minha frente. Porém, estava com dificuldades, fazendo assim com que os meus dedos esbarrassem sem querer na teclas pretas, causando um som dissonante e desagradável.

- Mantenha seus pulsos retos. - pediu enquanto analisava meus movimentos.

- Sim. - respondi e respirei fundo, tentando uma segunda vez. Mas, o peso daqueles olhos me tirava totalmente a chance de me manter concentrada. Meu professor de piano continuava observando a minha postura e cada nota que eu tocava. Errei outra vez e ouvi um suspiro que deixava claro o tamanho de sua desistência.

- Rin, acho que chega por hoje, sim? - virei-me para ele e notei sua face quase inexpressiva. Exceto por uma leve curva em seus lábios.

- Tudo bem... - suspirei entregue ao cansaço, massageando meus pulsos depois de meia hora praticando o mesmo exercício. - Às vezes acho que nunca vou conseguir tocar esse instrumento... - meneei a cabeça e sorri timidamente.

- Claro que vai, Rin! Só precisa de um pouco mais de disciplina, sei que não tem praticado em casa como deveria... – seu olhar beirava entre o deboche e a condenação. - Suas mãos ainda estão pesadas e você não está deixando seus dedos relaxados e muito menos os seus pulsos. - se aproximou e dividiu o espaço do banco que eu estava sentada. - Preste atenção neste movimento! – pediu.

Sua postura era tão adorável e invejável ao tocar cada tecla do piano, que eu tinha que me forçar a apenas prestar atenção na aula. Mas, era difícil. Ele mantinha os olhos sob o instrumento e parecia adorar separadamente cada nota que soava do piano, mostrando ali o quanto havia paixão pela sua profissão.

Paixão...

Quando decidi fazer aulas com ele, há dois meses atrás, não imaginava que este amigo, apenas alguns anos mais velho do que eu, ensinaria muito mais do que ler partituras e a tocar um instrumento musical. Com ele eu nunca fui tímida, afinal sempre estivemos juntos por conta da amizade das nossas famílias. No entanto, agora parecia diferente. Tudo era tão intenso e novo para mim.

Me apaixonar por ele não estava nos termos do contrato de aulas, com certeza! Mas, não havia escapatória para isso... Afinal, acho que sempre tive um crush por ele... Desde bem mais nova.

Enquanto eu o observava tocar, mal prestando atenção na técnica e escala que me apresentava como tarefa, eu reparava em cada detalhe seu: Seus cabelos longos e platinados caídos, parte em suas costas e parte a frente de seu tronco; seus olhos dourados que acompanhavam com amor cada tecla, seus lábios que se movimentaram a cada acorde como se cantasse em silêncio, e suas mãos...Ah! As suas mãos... Como desejei naquele momento ter a graça de ser tocada por elas. Invejava o piano por tal experiência. Eu babava por aquele homem, literalmente. Rsrs

- Pratique o ciclo das quintas ascendentes, conforme eu lhe mostrei. - me fitou e fez uma cara cheia de reprovação. - Rin, você prestou atenção?

- Ahm... Sim! Claro, Sesshoumaru! - ri desconcertada.

- É óbvio que não! - riu e se virou para mim, ainda dividindo o banco. - O que você tem, heim? Anda tão desligada... - sorriu, como quase nunca fazia. Bom, acho que ele só se sentia a vontade para mostrar algumas emoções como essa apenas para mim.

- Deixe de besteiras! - franzi os lábios. - Eu estou como sempre estive! - senti o meu coração acelerar. Por que era quase estampada na minha cara a mudança que tive nos meus comportamentos no que se tratava do meu professor de piano e amigo de longa data. O notei revirar seus olhos e levantar-se, deixando de aquecer parte do meu corpo com o seu.

- Não sou idiota, Rin... – suspirou e colocou as mãos na cintura, deixando ainda mais evidente os seu tronco forte e ombros largos. – Fale logo! Não somos mais adolescentes para você ficar de frescura para me contar qualquer coisa... Qual o problema? – sério.

Levantei-me em silêncio e peguei as partituras das escalas que eu havia trazido para a aula, ajeitando-as com uma batidinha em cima da madeira do instrumento e abraçando-as contra meu corpo. Dei um passo na direção dele e pensei se realmente deveria dizer-lhe o que me afligia.

- Problema nenhum... – murmurei e olhei para o chão, evitando o contato direto com seu olhar quase investigativo. – Eu vou para a casa agora! Obrigada pela aula, Sesshy! – chamei pelo apelido dele.

Virei-me para sair e ouvi Sesshoumaru soltar o ar com pesar e sem acreditar no que houve, ele segurou o meu braço e me fez parar de andar. Soltando as folhas ao chão e ficando com minhas mãos livres pelo susto do seu movimento.

- Espere! – paralisei e continuei fitando o chão, onde as páginas repousavam. Ouvi seus passos no assoalho de madeira e logo este ficou na minha frente.

- O-o que foi? – sem olhá-lo, fitava apenas minhas partituras perto dos meus pés, arranjando qualquer outro motivo para não encará-lo.

- Rin, olhe para mim! – com a sua autoridade inegável ali. Obedeci sem chance de fugir daquela situação, pois não havia como.

Quando foquei em seu rosto, ele permanecia sério, mas seus olhos apresentavam a curiosidade do que estava acontecendo comigo. Me culpei no momento que meus olhos responderam a ele o que eu sentia, pois eles observavam o contorno dos seus lábios.

- Sesshoumaru... Eu... – eu tremi na base. Estava ansiosa demais e arfei.

- Ei! – segurou no meu queixo e forçou-me a encará-lo profundamente.

- O-o que foi? – era a segunda fez que eu falava a mesma coisa. Ele sabia me pegar desprevenida. Sempre soube, mas o contato à sós com ele durante as aulas, na realidade revelou o que há muito tempo eu sentia, porém estava muito relutante para admitir.

Ele se aproximou e disse antes de terminar aquele gesto.

- Só deixe... Tudo acontecer no seu ritmo... Está bem? – quase roçando os seus lábios nos meus.

- Sesshoumaru... – murmurei e pensei: - "Ele sempre sentiu isso também? Desde quando?"

Fitando incessantemente meus lábios depois de longos e torturantes segundos, ele me puxou enfim para um beijo. Eu não podia acreditar, mas... Ele provavelmente estava sentindo o mesmo que eu há muito tempo, só que não sabia como se expressar... Igual a mim.

Nós éramos parecidos e também diferentes em vários aspectos, mas acho que aquele sentimento que estava se revelando neste dia, já nos mostrávamos o quanto nosso laço era infinitamente forte. Não sei como ficaria nossa relação depois disso, mas duvido muito que o que se iniciava hoje, implicaria no que vivemos até aqui. Antes amigos e agora... Talvez... Namorados?

Ele soltou meus lábios e sorriu de canto suavemente, se afastando um pouco para me observar.

- Promete que fará o dever de casa? – havia mais de um sentido naquela frase.

- Farei no meu ritmo... – sorri tímida, mas contente pelo que havia acontecido.

- Ok... No seu ritmo! – me puxando para outro maravilhoso e intenso beijo.

Internamente, eu ria, pois depois daquilo, talvez eu realmente me esforçasse um pouco mais nas rotinas de treino... Pois o meu professor, amigo de longa data e meu crush, havia pedido com tamanha persuasão, que seria impossível não lhe obedecer, tão pouco me afastar dele...

<3 Fim

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