é claro, eu ainda te amo.

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    a água se esvai de maneira rápida pelo ralo, gélida e transparente como eu um dia fora, mas que, ao mesmo tempo fui gélida e talvez um pouco insensível. tão frágil quanto uma pétala de rosa que esmagada ao chão, sente suas forças sumirem pouco a pouco.

    ao me sentir assim, nem o chão de madeira gasta me dava suporte, nem os poucos bens que conquistei me eram suficientes. esse vazio que preenche meu peito invade a superfície da pia, que agora não possui nem a água e nem sua transparência, apenas a temperatura gélida que a mesma deixa para trás. o silêncio do recinto embala pensamentos desconexos os quais sinceramente, não tenho a mínima vontade de escutar, o clima de inverno dá margem para outro clima, o natalino, que a muito tempo não chegava até a mim.

    sim, eu já fui uma criança que sonhava com o natal, mas hoje inevitavelmente me tornei uma adulta amarga e sem o mínimo espírito pra esse tipo de coisa. ela era diferente de mim. no nosso apartamento, a árvore de natal e seus enfeites brilhantes sempre estavam à postos logos nos primeiros dias de dezembro e eu lembro de me perguntar o porquê daquilo tudo, daquela cerimônia toda se não éramos mais crianças. ela brigava comigo, dizia que tínhamos que manter o clima natalino em nossos corações, que devíamos ter alma de criança.

    em  tempos em que a nossa preocupação era montar uma árvore de natal ou não, a vida era mais leve. você e eu nos dávamos bem, mesmo com as diferenças, mesmo com sua família odiando nosso namoro, mesmo com a tão precoce ida para o seu apartamento. dosávamos amor, afeto e respeito nessa que fora a mistura que mais deu certo em minha vida, mas como tudo nela, acabou-se de maneira trágica.

    uma briga, um ciúme bobo, arrependimento e um término avassalador. me culpo até hoje por ter desconfiado de você, por ter afirmado que você tinha outra, que queria me deixar. eu estava errada, e deixei que esse erro me cegasse. te perdi para meu egoísmo, por pensar demais no que eu sentia e menos no que era real.

    te amei como jamais amei ninguém e essa lacuna que esse amor deixou está vazia até hoje, pena que nunca mais olhará para mim com outros olhos além dos de desprezo. jamais me amaria novamente, jamais seria minha como eu ainda sou tua, jamais faria diferença para você caso essa pessoa inútil a frente do espelho sumisse.

    eu sou o seu passado, que quer voltar e não consegue. sou só parte das lembranças as quais você com certeza quer esquecer, pois você já apagou as boas lembranças, os bons sentimentos, lhe resta apenas os péssimos dias. as memórias que qualquer um gostaria de apagar.

    talvez o fato de não ser amada me assuste tanto quanto as olheiras profundas em minha face, tanto quanto meu cabelo embaraçado e desbotado, tanto quanto meu coração desacreditado e esse destino fadado a loucura e solidão.

    estar aqui, nesse banheiro velho, me vendo no espelho, contando os dias para o meu aniversário me fazia ter mais de cinquenta anos. me fazia parecer aquele tipo de senhora vivida que não se importa mais com a vida, que a vive só por viver esperando que sua saúde lhe traia e lhe sirva de algoz.

    me sinto num filme triste, num lugar isolado cujo nem eu e nem ninguém gostaria de estar. me sinto presa, encarcerada nesse amor que chega a parecer doentio pelo modo que está impregnado em minha vida.

    estou aqui, tentando arrumar um jeito de fazer você ver que ainda não morri, que sim, me arrependi e que mesmo que as desculpas não lhe supram o descontentamento, lhe direi mil vezes que te amo e que meu amor supera mil vezes qualquer barreira ou achismo meu. queria dizer que ainda estou aqui, nesse apartamento velho, querendo você aqui, ao meu lado nesse banheiro, rindo de nós mesmas refletidas no espelho porque é na verdade isso que sempre importou, o teu sorriso descontraído e sem culpa alguma.

  e eu sei que é impossível, mas torno a dizer que esse meu querer não será passageiro, sentirei tua falta minuto por minuto, como um sacrifício interno, como uma chama que arde no peito e jamais se apaga. viverei por ti e nada mais, pois só assim terei a chance de te amais mais e mais.

    te amo, sei que é óbvio, mas torno a dizer. como a lua ama o sol e não pode encontrá-lo, como a chuva ama a terra e insiste em tocá-la. te amo por todos os dias, meses e anos que ficamos juntas e que poderíamos ter ficado caso eu não cometesse aquele erro. te amo no mais simples dos significados, te amo e isso é tão imenso que sufoca outros pensamentos se não os sobre ti.

    e mesmo que esse amor morra não compreendido, continuarei amando.

   eu sempre irei te amar, yoo shiah.

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