Agora, eu aqui na calçada, uma irmã que não apareceu e nem ligou, sem um táxi ou uma moto para poder ir para casa, com um bolo na bolsa, uma pizza quase inteira em uma marmita e um escuro que toma conta da rua da pizzaria.
Fiquei até o final da apresentação de senhor Davi, em mil anos nunca imaginaria ele ali, o cara já é rico, por que tocar em uma pizzaria de um bairro simples com o nome de D sax?
Felizmente acho que ele já foi, fiquei morrendo de vergonha quando o garçom chegou com uma pizza grande só para mim.
...Eu vou matar minha irmã.
Acho que vou caminhando até a outra rua, deve haver um táxi a essa hora.
_ Carona, professora?
Era ele, ainda estava por ali.
_Não obrigada, eu vou de táxi, me senti a Angélica naquela hora, só que com uns quilinhos a mais. _ Vou até a próxima rua, acho que há algum me esperando. Falei ruborizada. Eu sabia que ele tinha visto a pizza grande chegar a minha mesa
_ Tudo bem então, boa noite. Disse ele saindo.
...Ah droga! Quem que vai estar me esperando só se for um bêbado, eu vou ficar na rua e ser atacada por um bêbado, Jesus!
_Espera!! Gritei. Ele freou.
_Eu aceito! Falei timidamente.
Ele deu meio sorriso, entrei e saímos.
_ Nunca imaginei que o veria por aqui... e tocando saxofone. Falei tentando desviar qualquer assunto que viesse dele primeiro.
_ É um hobby. Disse ele.
_O senhor toca bem, deveria investir mais nisso. Falei sorrindo.
_Não, na verdade, eu quero lhe pedir para não comentar isso com ninguém. Disse ele rapidamente.
_Tudo bem, não vou comentar. Falei sem graça.
Não entendi a reação dele, porque queria esconder um talento tão bonito.
_Você costuma ir jantar sozinha? Perguntou ele.
Começou. Pensei.
_ Normalmente não. Respondi
...Normalmente sim. Pensei.
_Estava esperando minha irmã e meu cunhado, mas alguma coisa aconteceu, eles não apareceram. Continuei.
Ele ficou em silêncio como se aquilo não o interessasse. Felizmente meu telefone tocou. Era Dália nervosa, disse que Nathany havia ficado febril e não tiveram como ir a pizzaria, mas que iria pedir para Ricardo ir me buscar e me deixar em casa.
_Não precisa, eu já estou indo para casa. Falei.
Ela insistiu e perguntou com quem, fiquei meio sem jeito de falar, por fim disse que era o pai de uma aluna.
Em nenhum momento ele virou-se para mim, enquanto eu falava ao telefone, aquilo tudo realmente não lhe interessava, era só mais uma carona a uma recente conhecida, atrapalhada e para ele, uma não atraente mulher.Despedi-me de minha irmã e dei-lhe um sorriso amarelo, ele retribuiu com outro da mesma cor. Silenciamos e minutos depois eu estava em casa.
_Obrigada mais uma vez, pelo favor. Falei meio sem graça.
_Não há de que professora. Aproveite sua pizza. Sorriu e saiu.
_Bastardo. Falei prendendo os dentes e sorrindo.
***Recomecei minha rotina, entretanto a partir de hoje há uma aluna a mais e eu tinha que me preparar, para voltar para casa um pouco mais tarde.
As crianças sempre estão mais lentas na segunda-feira, assim como eu, mas as aulas fluíram bem. Tudo normal, exceto pelo convite de aniversário de Bianca a minha garota de imaginação fértil, acontecerá no próximo sábado, como não irei ver meus pais, aceitei.Cinco horas, estou a porta do décimo segundo andar, hora de conhecer a senhora Georgina a louca, e Ana a princesa.
_ Olá boa tarde! Eu sou Antoniete a...
_Professora, Já sei. Hoje não é meu dia de ficar com a Ana, ela está lá no treze com o pai, suba, suba e acerte com ele, é ele mesmo quem vai pagar.
Fui recebida e interrompida por uma mulher loira de corpo super sarado vestida em malha tão colada que parecia segunda pele, era Georgina com certeza.Ela praticamente me expulsou do apartamento, estava de saída, trancou a porta, entramos juntas no elevador, ela olhava o relógio e batia o pé com impaciência.
_ Ela fica comigo nas terças, quartas e sextas, os outros dias fica com o pai. Eu tenho uma loja no shopping de roupas de academia, se você se interessar, temos preços ótimos.
Felizmente antes de eu dizer algo, o elevador abriu no treze, me despedi e sai._Olá! Princesa eu sou a ...
_ Professora, papai a professora chegou, gritou a garotinha linda que me abriu a porta, era Ana com certeza, tinha a cor do cabelo da mãe e os olhos do pai.
Ela me puxou pela mão, como se me conhecesse há tempos, arrastou-me até o sofá, o qual dormi outro dia. Mostrou-me sua boneca preferida e disse.
_Seu nome é Antoniete eu já sei, papai me falou.
_ Sim, me chamo Antoniete seu pai disse bem. Falei sorrindo e tocando seus cabelos.
_Ele disse que você era muito legal e que gosta de pizza. Disse ela.
...Nossa! Que cara chato, não esqueceu isso.
_ Gosto muito de pizza e você gosta? Falei
_ Sim, gosto de mussarela. Disse ela.
_ Então, Ana vamos estudar? Falei.
Ela ficou toda animada, fomos para a mesa de jantar, espalhei meu material e começamos.Aquela garota era tão animada que me deu um novo ânimo no fim do dia. Entretida na leitura não percebi que o pai a observava do corredor.
O olhei rapidamente e ele me olhou, senti algo estranho dentro de mim, fiquei sem jeito, tentei disfarçar segurando o lápis colorido. Ele se aproximou e beijou-lhe a cabeça.
_ Está gostando da aula? Perguntou ele carinhosamente.
_Sim papai, a senhorita Antoniete é muito legal e muito bonita também. Disse ela me fazendo rir ao pensar que crianças não mentem.
_ É sim filha é muito bonita. Disse ele, sem me olhar.
O que? Ele acabou de dizer que sou bonita, aí meu Deus. O que eu faço agora, sorrio? baixo a cabeça? saio correndo?
Admito que não sou familiarizada com elogios.
Ele olhou-me e pegou-me encarando-o. Dessa vez foi ele quem ficou sem jeito.
_Depois da aula a senhorita pode ir ao meu escritório? Falou.
_Sim senhor. Falei prontamente.
Mesmo quando terminamos todas as atividades e lições, Ana continuou comigo, ela tinha muita carência afetiva, anotei em minha agenda, assim como anotava dados dos meus outros alunos, o que facilitava conhecê-los e melhorar a interação professor- aluno._Senhor Davi. Falei ao bater na porta do escritório.
_Entre! Disse ele. A garotinha estava ao meu lado. Sentei-me, ele estava no computador, mal nos olhou. Ana passava o tempo todo falando sobre a filha, sua boneca,e eu entrava na história com ela.
_Filha, papai precisa conversar com sua professora, fica um pouquinho com a Marlene. Disse ele olhando-a.
_ A Marlene já foi embora senhor. Falei.
_ Oh, tudo bem e eu ainda não terminei esse trabalho aqui. Georgina não está em casa. Falou ele em voz baixa meio atrapalhado.
_ Senhor Davi, acho que podemos acertar tudo depois. Falei tentando acalmá-lo
_ A senhorita não ficaria chateada? Perguntou ele.
_ Não se preocupe, já sei onde o senhor mora, posso lhe cobrar depois. Falei tentando fazê-lo sorrir, sem sucesso.Fiquei pensando que quanto mais ricas as pessoas são, menos tempo tem para coisas simples. Ele estava naquele computador a horas, Ana ficava praticamente sozinha, a mãe no shopping exibindo um corpo impecável, e eu aqui servindo de babá, justamente o que eu não queria, mas se eu fosse embora o que seria de Ana?
Fiz um macarrão com molho e queijo e dei-lhe o jantar, foi a comida mais simples, não sou muito boa em cozinhar.
Ela comeu tudo, também comi um pouco e ainda sobrou para o pai. Eram sete horas e meu limite estava no fim, precisava ir pegar o último ônibus.
_Senhor Davi, desculpa mas preciso ir, meu último ônibus passa daqui a pouco. Falei da porta.
_Espere só mais um pouquinho, por favor Professora, eu prometo que termino e vou lhe deixar. Disse ele ainda aflito.
Não resisti aos olhos meigos quase implorando e Fiquei.Meia, uma, duas horas. A essa altura havia banhando Ana e ela me fez deitar com ela na cama do pai. Ainda com a boneca, contei-lhe uma história e dormiu. Vi a oportunidade de sair, mas fiquei pensando o que estava fazendo de minha vida, será que estava certo o que eu fiz, eu era somente a professora, a responsabilidade é dos pais.
Me perdi em pensamentos e acordei pela voz baixinha e um toque leve em minha mão.
Abri os olhos assustada e me deparei com o rosto meio sorridente dele.
_ É hora de mais uma carona professora. Disse.
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Um aMor Fora Do padRão
Roman d'amourAntoniete é uma jovem professora de reforço recém formada, ama seus alunos, embora tenha que suportar pais tão desleixados. Na busca por um emprego fixo e ajudar seus próprios pais, vai descobrir que os moldes que a sociedade impõe são muito present...