CAPÍTULO 8

458 107 21
                                    

*** capítulo sem correção ortográfica ***

Thales

Caminho por horas enquanto as palavras de Milton martelam na minha cabeça, sinto um frio em minha espinha quando penso que talvez poderia ter dado certo, se eu tivesse tido coragem, se eu ao menos tivesse conseguido falar, pelo menos uma parte, talvez ele poderia me ajudar.
Mas não consegui, o medo, a vergonha, o orgulho, me calaram, me fizeram o covarde que Sandro sempre diz que sou, então suas palavras invadem minha mente, gritando comigo, me dizendo que sou um merda que a culpa de tudo é minha. E eu acredito nelas, porque é mais fácil acreditar no que nos diminui.
Não sei quanto tempo fico nessa loucura, mas quando volto para casa já anoiteceu, a casa do outro lado da rua já está cheia de pessoas e as risadas que ecoam até onde estou parecem tapas na minha cara me dizendo que não importa o que eu pense, não sou importante para ninguém, no fundo tudo aquilo foi papo furado, a vida daquelas pessoas é outra e eu sou apenas o moleque problemático que cruzou o caminho deles. Entro sentindo-me exausto, tão cansado que mal tenho fome.
— Ainda bem que você chegou, onde você estava moleque? — Minha mãe que mal fala comigo desde a última briga que tive com Sandro a uma semana atrás, pergunta e me surpreendo em ouvir a sua voz, um misto de raiva e expectativa preenchem meu coração ao ouvir ela falar.
— Oi mãe. — digo baixinho, carente demais para meu gosto e desvio o olhar envergonhado por sentir.
— A Tati está pronta, você não vai tomar banho? — ela olha para mim e faço o mesmo notando a poeira vermelha impregnada em minha pele.
— Não. — respondo enquanto abro a geladeira e pego a garrafa de água porque de repente sinto um nó se formar em minha garganta.
— Como não? É a festa da Ayla.
— Eu não vou. — Encho um copo de água e bebo rapidamente, ainda me sinto apreensivo e incapaz de esquecer o tapa que levei do meu padrasto nessa cozinha, na sua frente. Um buraco se forma em meu estomago enquanto olho para minha mãe, perguntas e mais perguntas se embolam em minha garganta, fracas demais para serem formadas e despejadas sobre ela, a maior de todas é “porque você deixa ele fazer essas coisas comigo”? mas não tenho coragem de perguntar, o medo da resposta é grande demais.
— Claro que vai, a Ayla é sua melhor amiga. — ela continua.
— Não somos mais amigos. — minto, porque apesar de não estar mais ao seu lado, ainda sou seu amigo, ainda a guardo em meu coração, ainda quero contar a ela tudo o que me acontece. Porque isso é amizade, é colocar aquela pessoa acima das outras, se importar, se preocupar, se afastar quando sabe que não pode mais ser algo bom para ela.
Coloco o copo dentro da pia disposto a encerar a conversa e me viro em direção a porta, mas minha mãe não desiste e me puxa pelo braço. Estou começando a crescer, ainda sou magro, mas hoje sou mais alto que minha mãe e quando ela me segura no lugar, eu abaixo os olhos para encarar seus olhos.
— Me solta mãe. — tento ser gentil, mas a mágoa enche minhas palavras de fúria.
— Não senhor, você vai tomar banho e vai levar a sua irmã na festa, eu até comprei um presente para a Ayla.
  Ouço os passos de alguém entrando e por mais que eu não queira admitir, estremeço toda vez que ele se aproxima, é como se, mesmo inconsciente, meu corpo soubesse que ele é capaz de me machucar.
— O que tá acontecendo? — Sandro pergunta entrando na cozinha com Tatiana ao seu lado e fecho meu punho, mesmo sabendo que nunca poderei revidar.
— Nada demais. — minha mãe diz enquanto me solta, sinto a apreensão em sua voz e o sangue começa a esquentar em minhas veias. — Vai tomar banho logo Thales, tem roupa limpa na gaveta, porque você não põe aquela camiseta que o Duda te deu de presente de aniversário ano passado?
Ignoro o que ela diz e passo por ele sem cumprimenta-lo,  não nos falamos e isso já é algo normal, desde a noite em que ele me bateu na frente dela nossa relação que já era ruim se tornou insuportável e para o nosso bem, é melhor que não estejamos próximos. Ao menos não na frente da minha mãe e principalmente de Tatiana.
Passo a mão no rabo de cavalo da minha irmã e ela sorri para mim, é o suficiente para que eu me sinta encorajado a enfrentar uma festa que eu não tinha intenção nenhuma de ir. É por ela afinal que estou aqui ainda, e sempre será por ela.
Tomo o banho mais demorado da minha vida na tentativa de enrolar e fazer a minha mãe me esquecer, mas ela não vai, Tati ama aqueles moleques e sempre que pode ela quer ir a casa da Ayla, desligo o chuveiro só quando Sandro esmurra a porta me acusando de estar fazendo coisas no banho, fico envergonhado porque sei que minha mãe está ouvindo e o ódio que sinto por ele aumenta.
Como imaginei a minha roupa está em cima da cama e para não perder tempo visto o que ela escolheu, não me importo que a tal camiseta já esteja ficando pequena, é a melhor que tenho de qualquer forma. Quando chego na sala Tati está balançando de um lado para o outro, impaciente. Ela está com um vestido novo que minha mãe deve ter comprado especialmente para o dia de hoje, segurando um pacote cor de rosa nas mãos e penso que eu jamais embrulharia algo para Ayla em papel cor de rosa, talvez eu até escolheria algo da Marvel, mas nunca um papel rosa. Ela odeia rosa.
Meu coração bobo se agita ao pensar que sei algo tão simples sobre ela. Mas a verdade é que sei muito mais, sei que ela adora quando eu brinco com seus cachos puxando-os e soltando-os, que nunca usou batom porque tem nojo e que sempre compra suas camisetas na sessão masculina porque elas são mais legais, sei que ela detesta ser excluída de algo e que ouve música quando está lendo, sei que prefere livros de amor, mesmo que não seja nem um pouco romântica como as outras garotas, e sei que ao contrário de mim, Ayla não se sente fraca ao chorar na frente dos outros. Talvez seja porque suas lágrimas nunca estão relacionadas com dor ou vergonha.
— Thales! — Tati pula e vem até mim. — Olha o vestido que o papai comprou para mim?
— Que linda que você tá. — me ajoelho e passo o indicador no seu nariz. Tatiana faz uma gracinha que me arranca um sorriso, amo minha irmã e basta que ela sorria para mim para que eu me sinta capaz de suportar qualquer coisa por ela. — Vamos? — estendo minha mão para minha irmãzinha e ela a segura feliz.
— Não tire os olhos dela está me ouvindo? — minha mãe fala como se estivéssemos indo para o outro lado do mundo e não para o outro lado da rua e eu confirmo.
— Vê se não faz nenhuma merda por ai hein. — o imbecil do marido da minha mãe fala sem tirar os olhos da tevê. — Acabo com você se algo acontecer com a minha filha. — Sandro se vira para olhar para mim, seus olhos encaram os meus como se precisasse reforçar a mensagem, tenho vontade de dizer que o pior que poderia acontecer com ela era ser sua filha, mas me limito a olhar para sua cara de bêbado e não respondo nada.
— Vamos Tati, os gêmeos devem estar ansiosos pra brincar com você. — Abro a porta e sinto o ar fresco me receber quando saio do inferno que chamo de casa.
Atravesso a rua sem prestar muita atenção no que Tati fala, meu coração ainda bate forte e preciso me conter para não fechar os punhos toda vez que lembro do pai da minha irmã. Assim que chego ao portão vejo balões cor de rosa espalhados por todo lado e sorrio porque imagino que isso tenha sido ideia de Milton e Ayla deve ter ficado uma fera, a ansiedade que sinto muda, sinto meu estômago revirar, não sei o que estou fazendo aqui, não nos falamos a semanas e sei que fui eu quem a afastou, sei que foi o melhor, ao menos para ela, não consigo pensar direito quando estou ao seu lado e sinto que estou apenas antecipando algo que aconteceria naturalmente.
— Que bom que vocês vieram. — Milton me recebe na porta, ele faz uma brincadeirinha com Tati que está tão eufórica que está prestes a se soltar da minha mão. — Vamos entrem.
Meu coração está acelerado no peito quando entro e encontro Ayla rodeada de pessoas, ela está bonita com um vestido laranja e um laço nos cabelos soltos, gosto de ver ela de vestido, é tão incomum que quase se parece com outra pessoa. Assim que me vê ela para de falar e seu rosto muda, os olhos se arregalam como se me ver aqui fosse uma surpresa e  um sorriso tímido surge em seus lábios.
Tati corre até ela e entrega o pacote que não faço ideia do que seja, Ayla a abraça e elogia seu vestido deixando-a contente, mas seus olhos voltam rapidamente para mim.
— Oi Thales. — sua voz sai baixa e ela parece tão nervosa quanto eu.
— Oi... — pigarreio totalmente sem graça e aponto para o pacote em suas mãos. — Eu não faço ideia do que seja, foi minha mãe quem comprou.
— Obrigada. — ela olha para o pacote como se só então se lembrasse dele. — Obrigada por ter vindo.
— De nada.
Ficamos parados um na frente do outro sem dizer nada, Tati corre quando vê os gêmeos e os abraça, imagino que eles serão melhores amigos quando crescerem assim como eu eu Ayla sempre fomos.
— Bonita decoração. — brinco apontando para a mesa cheia de coisas de meninas e Ayla revira os olhos fazendo meu peito estremecer. Ela está tão bonita, seu corpo está... diferente, mais parecido com o de uma mulher do que a magricela que era a minha amiga. Sei que ela está crescendo, assim como eu também estou diferente, isso me deixa ansioso e agitado e preciso me lembrar que ainda somos nós.
Ela começa a abrir o pacote e fico em expectativa para saber o que minha mãe comprou, ela a adora, quando sua mãe morreu, a minha cuidou dela por muito tempo, ela dizia que Ayla era a filha que não tinha, isso foi antes de Sandro chegar nas nossas vidas e agora ela tem a Tati e já não reconheço mais a mãe que cuidou da minha amiga nela.
O rosto de Ayla fica vermelho quando ela vê o que tem no interior na embalagem, estico meu pescoço para bisbilhotar, mas Ayla puxa a sacola para longe.
— Nem pensar Thales. — ela diz e pelo seu embaraço posso imaginar que não seja algo que meninos comprariam para uma garota.
— Eu não sei o que tem ai. — ergo as mãos em minha defesa e ela sorri timidamente.
— Eu já volto, vou guardar isso. — ela se afasta carregando o pacote junto a seu corpo como se temesse que alguém o pegasse e sinto vontade de matar minha mãe por me colocar nessa situação, seja lá o que for que ela comprou é embaraçoso o suficiente para deixar Ayla sem graça.
Vou até o canto da sala, pego um punhado de salgadinhos e começo a comer, algumas meninas que conheço da escola vem conversar comigo, não me sinto muito confortável na presença de meninas, elas falam demais e na maioria das vezes elas me deixam nervoso e odeio me sentir assim.
Passo o olho pela casa em busca dela, mas não a vejo, invento uma desculpa de que preciso olhar minha irmãzinha e saio a procura da minha amiga, preciso falar com ela, pedir desculpas e explicar porque não podemos mais ficar juntos, mas assim que chego a cozinha a encontro conversando com Duda e por algum motivo que não sei dizer, isso me incomoda.
Duda, eu e Ayla nos conhecemos desde muito pequenos, somos amigos desde sempre já que Ayla nunca gostou de brincar de bonecas com as meninas e nós éramos os únicos meninos que não nos importávamos de ter uma garota conosco, ele sempre foi o mais falante de nós três e eu nunca liguei quando ela parecia se entender mais com Duda do que comigo, não até hoje.
Duda assim como nós, está crescendo, já vi meninas falando dele, do quanto elas o acham bonito e sei que ele é. Já vi Ayla olhando para ele quando está sem camisa, pode ser bobagem, afinal somos amigos, mas não gosto quando Ayla olha para ele. Assim como ela está fazendo agora.
Duda está bem arrumado, calça jeans e uma camisa polo cheia de frescura, olho para a camiseta que estou usando e detesto o fato de estar usando algo que ele me deu e de que ela é a única que tenho em bom estado. Tenho vontade de voltar em casa e trocar de roupa, não gosto de me sentir inseguro e começo a ficar com raiva dos sentimentos confusos que fazem meu peito se comprimir.
Começo a sair da cozinha pensando que esse é o motivo para eu ter me afastado de Ayla, não gosto de como me sinto na sua presença, ela me deixa ansioso para ser melhor e não posso ser mais do que sou. Decido que a partir de hoje vou me manter ainda mais longe.
— Ei Thales. — Duda me chama, sua voz sempre tão alegre me incomoda e preciso me lembrar de que ele é meu amigo para não acabar fazendo mais uma merda.
— E ai. — estico o punho em cumprimento para ele.
Paro ao seu lado e não consigo evitar a comparação, Duda está uns cinco centímetros maior do que eu e mesmo que seja alguns meses mais novo que nós ele parece mais velho. Mais bonito. Mais feliz. Inteiro. Limpo. Normal...
Ele diz alguma coisa, vejo seus lábios se movendo, sinto os olhos de Ayla sobre mim, mas não ouço nada, há um zumbido em meus ouvidos e tudo o que vejo é Ayla e Duda juntos, felizes, longe de mim.
Droga!
— Droga, meu pai está me chamando, já volto. — Ayla sai correndo pelo corredor e fico sozinho com meu amigo, observo seu rosto e me irrito quando noto que ele está olhando para ela.
— A Ayla tá diferente. — ele diz e imagens do meu punho socando a sua boca começam a invadir minha mente.
— Diferente como? — pergunto e começo a sentir minha pulsação aumentar enquanto espero por sua resposta. Preciso dar o fora daqui antes que eu faça uma merda.
— Não sei, ela está...diferente.
Olho para o mesmo lugar que ele, Ayla está abraçando algum parente que chegou, seu vestido se ergue um pouco e o topo da sua coxa aparece, meu coração acelera no peito e desvio o olhar sentindo meu rosto arder, olho para Duda e ele está olhando para ela também, há um sorriso em seus lábios e em minha mente meu punho soca repetidas vezes o seu sorriso idiota.
Não respondo seu comentário, ao invés disso começo a encher a minha boca de comida porque algo esquisito está acontecendo comigo e eu não faço a menor ideia do que seja.
Eles são meus amigos, tudo o que tenho nessa vida além da Tati e minha mãe e seja lá o que for, não quero estragar mais nada. Não posso estragar mais nada.

********************************

Boa tarde!
Saiu capítulo novo e hoje conhecemos um pedacinho muito especial do Cora do Thales, sua irmãzinha Tatiana.
Thales e Ayla estão ainda naquele limbo esquisito da amizade e embora ainda não saibam, os seus corações já batem em outro ritmo na presença um do outro e a gente fica aqui com o nosso coração cheio de muito amor por esse casal.
Então é isso, espero que curtam, um excelente feriado e até sexta.
Ou até o cap extra dos 4 mil, será que conseguimos?

Um Milhão de Promessas - DEGUSTAÇÃO Onde histórias criam vida. Descubra agora